Prolongamento
“Benfica, em Portugal, é uma instituição mais poderosa do que qualquer governo”
2020-04-29 12:35:00
Artigo no Calciomercato aborda a reportagem do New York Times sobre o Benfica. E recorda os tempos do Apito Dourado...

Uma semana depois de publicada uma reportagem no jornal norte-americano New York Times sobre o Benfica, onde o clube da Luz é apontado como “um estado soberano”, o tema é recuperado hoje no Calciomercato, que publica um artigo de opinião que reforça a mesma ideia, traçando um quadro negro do futebol português.

“Para que um problema se torne evidente, é necessário denunciá-lo num órgão de comunicação internacional reputado. Foi o que o New York Times fez, com uma reportagem assinada pelo seu principal jornalista desportivo, Tariq Panja. O texto é acompanhado por um título eloquente: “’O clube de futebol como estado soberano’”, começa por escrever o autor do artigo, publicado hoje.

O Calciomercato segue a mesma linha de raciocínio do New York Times e refere que “o Benfica, em Portugal, é uma instituição mais poderosa do que qualquer governo”, detentor de “uma força que os rivais descrevem como intocável”.

O episódio que envolveu o juiz Paulo Registo é classificado como “anedota”. O magistrado, recorde-se, iria julgar Rui Pinto, mas decidiu pedir escusa, depois de ver colocada em causa a sua imparcialidade, por ser adepto do clube da Luz. "O juiz ultra sorteado duas vezes", ironiza o jornalista, no título do texto.

“O juiz é um assumido adepto do Benfica, o que se percebe facilmente pelas fotos que publica nas redes sociais. É fotografado nas bancadas do Estádio da Luz, na rua, a exibir o cachecol do Benfica, ou com uma camisola das águias vestida. E não é tudo. (...) Em alguns posts [nas redes sociais], o juiz comenta incidências do campeonato português. Considerações de um adepto, como aquelas feitas à margem de um FC Porto-Benfica, que os encarnados perderam, contestando a arbitragem. Nesses posts, o juiz fala sobre um regresso aos tempos do Apito Dourado e de ’fruta’”, refere o artigo do Calciomercato.

O autor do texto faz questão de explicar ao leitor detalhes do processo Apito Dourado, “um dos mais graves casos de alegada corrupção na história do futebol português, pelo qual o FC Porto foi condenado pela justiça desportiva, assim como o Boavista, sentenças posteriormente anuladas”.

E explica até que “fruta”, era “um código detetado em escutas telefónicas que indicaria as prostitutas, oferecidas aos árbitros”. Além da atualidade judicial do futebol luso, é a própria história que se recorda.

Ainda sobre o comportamento de Paulo Registo, “o que desperta perplexidade” é o facto de o juiz ser “associado a um post em que se fala sobre Rui Pinto”, denunciante apelidado de “pirata”, nessa publicação.

“O facto de Paulo Registo gostar desse comentário é inapropriado não apenas por ser juiz, mas também, e principalmente, por ser o juiz chamado a julgar Rui Pinto”, acrescenta o Calciomercato, que detalha todo o processo do Football Leaks, bem como as suspeitas que envolvem o Benfica.

Num texto que em nada abona a favor do futebol português, no passado e no presente, o autor assinala o “peso político que o Benfica exerce em Portugal”.

“Uma situação que foi batizada por rivais como ‘Benfiquistão’. E essa classificação está em perfeita harmonia com o que foi escrito no artigo do New York Times”, prossegue o autor.

“E para se perceber isso, basta ver que autoridades se encontram nas partidas disputadas no Estádio da Luz: magistrados, banqueiros, deputados, advogados e até polícias”, pode ler-se.

O texto passa por Jorge Mendes, que tem “um pacto” com o Benfica, e pelos “dois políticos mais poderosos" em Portugal, "que não hesitam em ser fotografados" no reino da águia: "o primeiro-ministro António Costa e o ministro das Finanças, Mário Centeno”, que acumula o cargo de presidente do Eurogrupo.

“O Benfica está a recolher benefícios de ter a elite portuguesa no seu exército de adeptos, ou são as próprias elites portuguesas que fazem do Benfica o clube perfeito para criar ligações?”, questiona o autor.

É feita a pergunta e dada a resposta: “A verdade, provavelmente, está no meio. Mas, além do que possa ser a resposta para este dilema, permanece o facto de que o clube encarnado é, realmente, algo muito semelhante a um Estado-nação. O que é dececionante é ver esse estatuto nas colunas de um dos jornais mais influentes do mundo”, conclui a peça, assinalando que Paulo Registo será o juiz do processo e-toupeira, que terá no banco dos réus Paulo Gonçalves, ex-consultor jurídico do Benfica.

Esta é a primeira parte do artigo. O Calciomercato divide a peça em dois e apresenta o motivo: “O escândalo [do e-toupeira] exige uma história à parte. Por enquanto, basta dizer que Gonçalves assumiu toda a culpa e por isso passará por um processo do qual o Benfica foi excluído”.