Prolongamento
"Rui Costa não estava lá? Faltou àquela reunião?"
2021-10-07 09:05:00
"Eleições não são para escolher um ídolo nem um símbolo. Já temos a águia, um emblema, a bandeira, o hino e Eusébio"

O candidato à presidência do Benfica Francisco Benitez defende que Rui Costa representa a “continuidade” da presidência de Luís Filipe Vieira e que o antigo jogador deve esclarecer a ligação aos casos judiciais que envolvem o ex-presidente ‘encarnado’.

Em entrevista à Lusa, o empresário, de 57 anos, alerta que aquilo que está em causa nas eleições para os órgãos sociais do clube “é escolher uma equipa de gestão que possa oferecer ao Benfica novas soluções” e reforça que Rui Costa sempre foi referenciado como “sucessor” pelo antigo presidente, que deixou a liderança do clube em julho deste ano, na sequência da detenção no processo ‘Cartão Vermelho’, em que estão em causa crimes de abuso de confiança, burla qualificada, fraude fiscal, falsificação e branqueamento de capitais.

“Rui Costa vai ter de responder aos benfiquistas se foi cúmplice, conivente ou distraído. Vai ter de esclarecer qual destas três coisas foi, porque ninguém pode estar 13 anos a ser formado por alguém que agora, alegadamente, roubou o clube e não saber de nada, não se pode estar 13 anos a ser administrador de uma SAD e não saber o que se passava lá, e não se pode estar 13 anos a assinar documentos e depois dizer que afinal não sabia o que estava a assinar”, nota.

Para Francisco Benitez, o episódio da OPA [oferta pública de aquisição] parcial sobre o capital da SAD - lançada em novembro de 2019 e chumbada pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, em março de 2020, após encontrar irregularidades - é um exemplo da necessidade do outro candidato à presidência do clube da Luz prestar esclarecimentos aos sócios.

“A ata diz que foi aprovada por unanimidade. Então Rui Costa não estava lá? Faltou àquela reunião? Unanimidade é unanimidade, não é maioria que diz lá”, sublinha, sem deixar de apelar aos sócios para dissociarem o ato eleitoral do momento da equipa de futebol: “Já no ano passado fizemos a mesma coisa… a bola estava a entrar [na baliza] e nós passámos um cheque em branco a alguém que depois acabámos por ver que não merecia”.

Em relação à SAD, o líder da lista B reitera que o controlo da maioria do capital por parte do clube “é um ponto de honra” pessoal e que o “Benfica é e será sempre” dos sócios. “Se algum dia - por um absurdo - isso acontecesse, eu demitir-me-ia no dia seguinte”, garante, afastando a prerrogativa de preferência sobre as ações de Vieira e abordando ainda a questão do acordo de aquisição de 25% das ações ‘encarnadas’ pelo investidor norte-americano John Textor.

“Eu conversaria sempre com toda a gente. Não percebi porque é que Rui Costa não quis falar, porque seria importante para explicar aos benfiquistas quais eram as ideias que o senhor Textor tem, mas, se calhar, Rui Costa já sabe quais são e não precisou de ouvir”, refere, continuando: “Não percebo porque é que alguém vai meter tanto dinheiro numa SAD onde não vai ter capacidade de gestão nem vai ter dividendos tão cedo”.

Confrontado com a diferença de mediatismo no universo benfiquista face à candidatura encabeçada por Rui Costa, o sócio n.º 3.082 do Benfica – que era o escolhido para a presidência da Mesa da Assembleia Geral na candidatura de João Noronha Lopes às eleições de 2020 – deixa um ‘recado’ ao antigo jogador dos ‘encarnados’.

“Estas eleições não são para escolher um ídolo nem um símbolo. Nós já temos a águia, um emblema, a bandeira, o hino e o Eusébio… Temos muitos símbolos, não vamos escolher um símbolo nem uma figura decorativa; é um gestor e um líder de que estamos à procura. Não é alguém que num momento da história foi importante ao Benfica, é alguém que tem de liderar o Benfica e uma equipa para os próximos desafios que aí vêm”, defende.

O líder da lista B às eleições do Benfica, Francisco Benitez, assegura também que, em caso de vitória, Jorge Jesus vai cumprir o contrato até ao final, mas vincula o futuro do treinador à existência de “compromisso” com o projeto.

“Comigo, Jorge Jesus vai terminar o seu contrato, dar-lhe-ei todas as condições que ele precise para terminar o seu contrato e fazer um excelente resultado. A partir daí, vai ser-lhe apresentado o projeto que nós temos e este plano estratégico de 10 anos e, a partir daí, tem de haver um compromisso da parte de Jorge Jesus para connosco ou não”, afirma, em entrevista à Lusa, o empresário e sócio n.º 3.082 do clube da Luz.

Segundo o programa eleitoral, a estrutura do futebol ‘encarnado’ sofre mudanças, ao passar a estar assente em administradores para o futebol, diretor desportivo, ‘team manager’, diretor de ‘scouting’ e responsável pelo futebol de formação. Confrontado com a ausência da figura do treinador no organograma e uma consequente perda de influência na política de transferências, Benitez contrapõe a necessidade de sintonia entre todos os elementos.

“É óbvio que o treinador tem uma voz ativa e uma palavra a dizer, mas dentro de uma equipa, porque o treinador depois vai embora e os jogadores ficam”, observa, sublinhando: “Tem de ser uma escolha de equipa, respeitando o plano, porque o próprio treinador também tem de estar comprometido com o projeto. Portanto, tem de haver uma visão única. É fácil quando ocorre uma visão única haver um acordo entre as várias estruturas e equipa técnica”.

Por outro lado, Francisco Benitez reconhece algumas pontes entre o perfil traçado por si e pela sua equipa e Jorge Jesus, ao reforçar que “o Benfica deve voltar a ter um sistema de jogo que seja bastante versátil, ofensivo, com posse e grande pressão” sobre o adversário.

“Acho que o Jorge Jesus tem este tipo de jogo. Agora, pode ter outras características que podem não caber dentro do projeto, mas isso é uma questão que temos de avaliar”, explica.

O empresário, de 57 anos, assume que terá “a última palavra” no tema do futebol, mas remeteu a responsabilidade para a futura administração da SAD, deixando em aberto o nome de quem se vai sentar na presidência depois da anunciada alteração dos estatutos do clube. A revisão estatutária é uma das primeiras medidas anunciadas pela Lista B em caso de vitória e Francisco Benitez admite que ficará à frente da SAD enquanto não houver essa alteração.

Já sobre o cargo de diretor atualmente ocupado por Rui Pedro Braz, repete o discurso feito com Jorge Jesus. “O plano estratégico será apresentado a toda a estrutura e toda a gente que se encaixe dentro deste plano e que assuma o compromisso de vitória, terá lugar; se não se encaixar e se não assumir esse compromisso, não terá lugar”.

Com críticas a uma cultura de dirigismo “unipessoal”, Francisco Benitez adiantou ainda que as relações institucionais com FC Porto e Sporting estão condicionadas ao respeito pelos pilares definidos para o clube: transparência, democracia e ambição.

“Todos os clubes que saibam respeitar democracia e transparência terão as portas abertas, todos os clubes que não saibam respeitar isto, democracia e transparência, terão as portas fechadas”, frisa.

No que toca à construção do plantel, o líder da lista B reitera a diminuição de influência dos empresários e defende não ver “necessidade de ter intermediários a vender jogadores”, além da pretensão de querer manter os melhores jogadores de futebol da equipa principal do Benfica por um período de tempo mais duradouro.

“Achamos que os intermediários não têm razão nenhuma. Não somos ingénuos para achar que os jogadores não vão continuar a ter agentes, mas isso é normal e é da parte do próprio jogador. Agora o Benfica não tem de ter emissários para andar a vender os jogadores de porta em porta com uma ‘malinha e um catálogo’”, salienta, recusando para o futuro qualquer exclusividade de empresários na Luz.

Francisco Benítez concorre às eleições para os órgãos sociais do Benfica para o quadriénio 2021-2025, no sábado, frente ao atual presidente Rui Costa, que manifestou indisponibilidade de agenda para marcar uma entrevista. Ambos concorrem à sucessão a Luís Filipe Vieira, que ocupou o cargo durante quase 18 anos, desde 2003.