Prolongamento
Flávio e Marco Paixão: do Irão à Polónia, uma verdadeira história de vida
2017-07-10 20:50:00
Gémeos têm um anseio especial: "Somos loucos pelo Sporting e ainda sonhamos vestir a camisola do nosso clube"

Marco é mais velho do que Flávio por... cinco minutos. Os gémeos de Sesimbra nasceram com o bichinho do futebol. Têm Paixão no nome e foi esse sentimento relativamente ao desporto-rei que os levou a correr mundo. Da Escócia à Polónia, passando pelo Chipre, República Checa e pelo Irão, onde chegaram a temer pela vida, os dois irmãos começaram no FC Porto B, pese embora o facto de o clube do coração ser outro: o rival que veste de verde e branco. “Somos loucos pelo Sporting”, diz ao Bancada Flávio Paixão. Já lá iremos…

Em Junho de 2005, Flávio e Marco Paixão chegavam à cidade invicta cheios de sonhos. Fizeram sensivelmente uma dezena de jogos ao serviço da equipa B dos dragões, com Aloísio como treinador, mas o encerramento das equipas secundárias acabou por dar um novo rumo (marcante) às suas carreiras. Andaram, então, pelos escalões secundários de Espanha até chegaram ao Hamilton, da Escócia, a primeira experiência fora de portas.

“Fomos apanhados de surpresa com o encerramento das equipas B e decidimos ir em busca do nosso futuro no estrangeiro”, lembra Flávio Paixão. O primeiro choque, depois da passagem por Espanha, teve lugar na Escócia. “Encontrámos uma cultura mais fechada. Muito frio, chegámos a ter 16 graus negativos, muita chuva e pessoas muitas negativas, sem abertura”, diz Flávio.

“Uma lição de vida”

O pior ainda estava para vir. “O Irão foi a grande lição da nossa vida. Nunca perdemos nada na vida, aprendemos sempre”, refere Flávio, sustentado por Marco. “Passámos por situações muito difíceis e até para sair do país foi difícil. Não queriam deixar-nos sair de lá. Muitas vezes as pessoas não dão valor ao que é viver na Europa, mas nós por experiência própria dizemos: ‘desfrutem disso’. Aqui somos livres. O dinheiro não é tudo.”

Neste contexto, os gémeos deixam um conselho aos jovens: “Não se deixem iludir. Algumas vezes quando somos jovens e inexperientes, embarcamos em experiências que não passam de uma ilusão.” “O dinheiro não é tudo”, volta a sublinhar Flávio.

Flávio e Marco chegaram a temer pela vida. Para além do que passaram no quotidiano numa cultura bastante diversa, depararam-se ainda com um… terramoto naquele país da Ásia Ocidental. “Quase que ficámos todos lá debaixo”, recorda Flávio, acrescentando: “Estávamos com o João Vilela e o Anselmo e tememos o pior com um tremor de terra de 6.3 na escala de Richter.”

“Aprendemos e crescemos muito com tudo o que passámos no Irão a nível mental e de atitude”, diz Marco. “A partir dos 26/27 anos a nossa carreira entrou no rumo certo e começaram a aparecer coisas boas, das quais nos orgulhamos.”

Tudo somado levou a que a experiência na Polónia tenha sido encarada como uma espécie de “bênção.” Os gémeos reencontraram a felicidade e têm sido reconhecidos com diversos prémios, entre os quais o título de melhor marcador, ostentando por Marco (ver foto em baixo).

“Depois de tudo o que passámos, é uma bênção estarmos a viver este momento e estarmos juntos. A nossa vida tem sido uma luta constante, sem ajuda de ninguém no futebol”, sustenta Marco. “Somos duas referências da Liga polaca, conquistámos o nosso espaço e é muito bom recebermos constantes mensagens de parabéns pelo que temos feito por Portugal e por Sesimbra”, refere, sem falsas modéstias.

Na época passada, apesar dos 29 golos apontados pelos dois irmãos (19 de Marco, ponta-de-lança, mais 11 de Flávio, extremo) o Lechia Gdansk acabou por perder o título de campeão na última jornada.

O objetivo da época que se inicia já na próxima sexta-feira não podia, neste cenário, deixar de passar pela conquista do campeonato. “É essa a nossa ambição e é por isso que trabalhamos”, frisa Marco, o melhor artilheiro da época passada, que fez história no Gdansk ao efetuar dois “hat-tricks”. Não é por acaso que os gémeos são um sucesso de marketing do clube situado na foz do Vístula.

Apesar do sucesso que estão a viver na Polónia, Marco e Flávio, que têm Cristiano Ronaldo como ídolo – “É sobrenatural e uma referência para nós” -, não receberam qualquer proposta de Portugal. “Não recebemos nada, mas como o futebol vive hoje em dia dos grandes empresários…”

Um sonho chamado Sporting

Os gémeos de Sesimbra sentem-se bem na Polónia, mas não escondem que têm um velho sonho que gostariam de concretizar pese embora os 32 anos: jogar de leão ao peito. “Somos loucos, somos fanáticos pelo Sporting”, diz Flávio, acrescentando: “O nosso pai é do Sporting e jogar lá sempre foi o nosso grande sonho. Ainda espero um dia concretizar esse sonho.”

Marco é mais contido neste particular, mas como o sonho comanda a vida… “É muito difícil, mas nunca se sabe. É o sonho das nossas vidas vestir de verde e branco.”

De Frank e Ronald de Boer a Michael e Brian Laudrup

Apesar de não ser a situação mais comum, há diversos irmãos com muito ou relativo sucesso na história do futebol mundial. Sejam contemporâneos ou não, ou sejam gémeos. A nível internacional há duas duplas que nos vêm de imediato à memória. São elas: Frank e Ronald de Boer, bem como Michael e Brian Laudrup.

Os primeiros evidenciaram-se no clube de sempre (o Ajax), tendo jogado juntos, com sucesso, no Barcelona, e, posteriormente, no Glasgow Rangers. Isto, claro, além de uma série infindável de jogos pela seleção holandesa.

Também ao serviço do Ajax e Barcelona, mas igualmente do Real Madrid, Juventus e Lazio, brilhou Michael Laudrup, cinco anos mais velho do que Brian, estrela no Ajax, Milan, Fiorentina, Bayern e Glasgow Rangers.

Gary e Philipp Neville foi outra dupla de irmãos que deu nas vistas no futebol europeu, mais concretamente ao serviço do Manchester United e da seleção inglesa. Gary ficou eternizado nos “red devils”, onde completou mais de 600 (!) jogos, enquanto Philip repartiu a carreira também pelo Everton FC.

Rumamos agora a Itália, onde encontramos os irmãos Inzaghi: Filippo e Simone. O primeiro, embora também tenha brilhado na Juventus, é um dos históricos do Milan, com um sentido de oportunidade fora do comum; o segundo, três anos mais novo, foi estrela na Lazio.

Depois de Itália, um grande salto até ao Brasil para falarmos de Sócrates e Raí, dois colossos em épocas muito diferentes, dois artistas do futebol. Onze anos mais velho, um dos astros da célebre seleção brasileira de 1982, que caiu aos pés de Itália, no Mundial, brilhou intensamente no Corinthians. Já Raí foi figura de proa do São Paulo. Na Europa, encantou ao serviço do Paris Saint-Germain.

Ainda na América do Sul, em concreto na Argentina, temos os irmãos Milito. Diego deu nas vistas no Racing, após o que rumou à Europa, onde teve mais sucesso no Real Saragoça e no Inter, na altura dirigido por José Mourinho. Foi, aliás, a grande figura do título europeu conquistado pelo treinador português ao serviço do clube de Milão. Já Gabriel, tal como o irmão, brilhou no Real Saragoça e não tanto ao serviço do Barcelona.

Estas são duplas mais mediáticas, mas outras existem como os noruegueses Tore Andre Flo e Jostein Flo, os russos Vasilie e Aleksei Berezustskiy, os marfinenses Koulo e Ibrahim Touré, os argentinos Maximiliano e Maurício Pellegrino, os alemães Lars e Sven Bender, Hamit e Halil Haltintop, os croatas Robert e Niko Kovac, e os australianos Tony e Aurélio Vidmar.

De Carlos e Pedro Xavier a Luisão e Alex Silva

Em Portugal, ou com ligações (parciais) ao nosso país, temos duplas como Carlos e Pedro Xavier ou Luisão e Alex Silva.

Carlos Xavier jogou anos a fio no Sporting, onde chegou a capitanear os leões, tendo sido colega do irmão Pedro na Académica na época 1986/87 ano em que, de forma surpreendente, foi emprestado aos estudantes. Além do conjunto de Coimbra, o ponta-de-lança repartiu a carreira também por Estoril e Estrela da Amadora. Ambos foram internacionais portugueses.

Luisão, como se sabe, é um dos baluartes do Benfica dos últimos anos, enquanto o irmão Alex Silva joga na Bolívia, defendendo as cores do Jorge Wilstermann. Na Europa, a única experiência de vulto foi no Hamburgo, clube que representou entre 2008 e 2011.

Mas outras duplas existem em solo nacional como o sportinguista Alan e Federico Ruiz, que rumou a Portugal com o irmão, mas acabou emprestado pelos leões ao Sintrense. Também no Sporting jogou Luís Vidigal, irmão de Jorge e Lito Vidigal, que treinou na última época em Israel.

João Mário e o irmão, Wilson Eduardo, jogaram igualmente de leão ao peito mas em épocas diferentes. Um está agora ao serviço do Inter, outro alinha pelo SC Braga. Ainda no Sporting alinhou Roberto Assis, irmão de Ronaldinho Gaúcho, estrela planetária e ídolo de clubes como Barcelona, Milan e Paris Saint-Germain.

Portugueses no estrangeiro, temos José Fonte, internacional que defende as cores do West Ham, depois de anos a representar o Crystal Palace e o Southampton. O defesa-central campeão europeu pela Seleção Nacional é irmão de Rui Fonte, atualmente no SC Braga, depois de não se ter afirmado no Benfica.