Jogo do Povo
Caldas. Uma fidelidade à Mata para lá do tal golo ao Benfica
2023-08-17 16:00:00
Entrevista a Gonçalo Barreiras, jogador do Caldas da Liga 3

A disponibilidade e a generosidade com que se vive o futebol são o melhor combustível das divisões mais baixas e são, ao mesmo tempo, a sua essência. Porque dia após dia, semana após semana, se repete sem cessar por muitos relvados do país. E por muito que o futebol fique órfão de outras vivências, cada vez mais puxado pelo peso do dinheiro, ainda existem retratos de fidelidade que prendem a paixão pela bola ao clube da terra. É conexão social, cultural e pessoal.

Aparantemente, aparecem cada vez menos casos desses e parecem cada vez mais 'descosidas' da realidade estas ligações de sempre à mesma camisola. Mas existem e nas Caldas existem vários como Thomas Militão, André Simões e Gonçalo Barreiras. O Jogo do Povo foi ao mítico Campo da Mata conhecer este último, ainda um menino com muitos sonhos, que não é muito bom a decorar nomes mas que todas as semanas na Liga 3 lembra que ainda existem amores raros no futebol moderno.

A magia Mata como na Quinta da Boneca

Gonçalo Barreiras, carinhosamente tratado por Gonças, veste as cores do Caldas Sport Clube desde os sete anos e, aos 21 de vida, continua a sonhar o futebol com as cores do clube que o formou, muito para lá do tal golo que marcou na Taça de Portugal ao Benfica, de Roger Schmidt.

A magia continua a ser a mesma no Campo da Mata como era nos tempos da Quinta da Boneca. E por mais comparações que existam na entrega que tem à camisola do Caldas, como outros nomes grandes do futebol tiveram a clubes mediáticos, Barreiras diz que só luta todos os dias para ser "cada vez melhor" mas sente-se "especial", tal como outros nomes do balneário do Caldas.

"Claro que me sinto especial em fazer parte dos jogadores que só tiveram um clube na sua carreira mas penso que neste momento ainda não me posso considerar um Totti ou um Ryan Giggs, penso que os jogadores mais parecidos com eles são o Thomas Militão e André Simões", contou Barreiras, em entrevista o Bancada.

A disputar a Liga 3 com o clube de sempre, Gonçalo Barreiras falou também das dificuldades que um jovem sente para se integrar numa prova "bastante competitiva e com muita qualidade", dado que, há não muito tempo, Barreiras fazia golos nos distritais de Leiria pela equipa B do Caldas.

Mas com esforço e entrega "tudo se consegue". E Barreiras mantém a certeza de que a velha máxima do Campo da Mata está bem real e "é tão fácil ser dos 'grandes', mas é tão mais bonito ser do Caldas", sobretudo na emblemática 'Mata Encantada'.

"Não sei como é que as equipas dos escalões superiores nos encaram mas acho que posso dizer que todas as equipas da Liga 3 vão ser 'um osso duro de roer'. Todas as equipas têm muita qualidade e podem causar muitas surpresas na Taça de Portugal".

Fica o aviso, desde já, do homem que há sensivelmente um ano fez tremer os benfiquistas António Silva e Brooks no Campo da Mata, apontando um golo que deixou incerta uma eliminatória da Prova Rainha contra a turma de Roger Schmidt.

No final, o Benfica acabaria por vencer, mas o mediatismo nas horas seguintes foram todos para o Gonças, um menino das Caldas que já enfrentou dificuldades para triunfar no mundo da bola, sobretudo quando a faculdade tinha exigências que um jogador nem sempre conseguia cumprir.

"Felizmente não tive nenhuma dificuldade dita 'pesada', só as mais ouvidas como abdicar de muitas coisas em prol do futebol e muito foco no que queria, que neste caso era o futebol", explicou Gonçalo Barreiras, em declarações ao Bancada, vincando que nem sempre as coisas correm como esperado.

"O ano mais difícil para mim foi o ano que surpreendentemente me fez passar da equipa B para a equipa A, com a faculdade era muito difícil conciliar o futebol mas com um 'bocadinho' de esforço consegui e hoje aqui estou eu".

O Caldas da Mata encantada 

O Caldas é um dos clubes mais conhecidos do leque de equipas que alinham na Liga 3, tudo porque a formação tem feito boas campanhas mas também pela localização peculiar do estádio, que fica inserido numa mata.

Gonçalo Barreiras diz que não tem nenhum jogador em particular que gostaria de convidar para conhecer o Campo da Mata, mas entende que todos os futebolistas e fãs de futebol deveriam visitar o espaço desportivo no município das Caldas da Rainha.

"Acho que conhecer a Mata devia fazer parte de qualquer pessoa, porque é um sítio especial e só quem passa por cá é que sente isso", palavra do jogador que sempre que sai de casa tenta não se esquecer da "bolsa de higiene e das chaves de casa".

As vivências que não se apagam no balneário

O pêndulo do relógio não perdoa e o tempo vai passando. Da formação do Caldas à equipa principal o jogo avança e Gonçalo Barreiras sabe que, embora um jovem, o futebol vai pedir-lhe cada vez mais foco, trabalho e esforço. Porque quando se é da formação ainda se joga à bola como no pátio da escola, por entre manchas de sol no chão. Mas quando se chega ao principal patamar do futebol, as coisas são diferentes.

Ao longo da carreira, Barreiras tem encontrado pela frente muitos adversários e tem tido muitos companheiros. Uns mais "chatos" que outros, sobretudo porque o "mais chato" até será, porventura, Barreiras, como o próprio admite, entre sorrisos.

"Já apanhei muitos jogadores 'chatos', mas eu sou péssimo com nomes e gosto de pensar que eu é que sou 'chato' e que eles é que não me querem apanhar", contou Barreiras, nesta entrevista ao Jogo do Povo, no Bancada, onde não quis entrar por caminhos 'apertados' para fazer revelações, ficando-se apenas por uma referência para André Perre.

"Os momentos que passamos no balneário e em equipa são sempre muito bons e tenho várias histórias muito boas, mas vou optar por dizer o jogador que está em quase todas, o Perre, é um jogador que todos os balneários deviam ter", disse Barreiras.

E assim segue a vida em mais uma temporada na Mata das Caldas da Rainha, faça sol ou chuva que se dissolve pela terra enquanto as árvores, perto do estádio, não cessam de agitar apontando sempre para renovações.

Quando a Gonçalo Barreiras, continua ligado ao clube do coração. O futuro logo virá, até porque dele ninguém sabe. O escritor Gabriel García Márquez dizia, no entanto, que "o que você vive, ninguém apaga".