Prolongamento
“Sociedade convive bem com uma manada a ser transportada para os estádios”
2020-02-20 15:45:00
Pacheco Pereira defende que o futebol “é um reservatório de violência” e critica "surtos de indignação"

Numa análise ao episódio que envolveu Marega, no programa da TVI24 ‘Circulatura do Quadrado’ desta quarta-feira, Pacheco Pereira abordou não apenas o fenómeno do racismo, mas a violência no desporto-rei, que, ao contrário do racismo, é “pacificamente” aceite.

O professor e investigador concorda que existe racismo em Portugal, mas não está certo de que “a questão do racismo seja a dominante”. “Dominante será a questão da violência que existe em certos setores da sociedade, nas redes sociais e no futebol”, acrescenta.

“O principal problema é o próprio futebol. É nós admitirmos, pacificamente, que há reservatórios de violência nas sociedades. Em Portugal, o futebol é um dos mais importantes. Experimentem responsabilizar os clubes, de forma séria, sobre o comportamento dos seus adeptos”, aponta.

Para reforçar a sua teoria de que a violência no desporto-rei é bem aceite, dá como exemplo o modo como as claques são transportadas para os estádios – em caixas de segurança, a cargo das autoridades. Em vez de se combater de frente o problema, criam-se condições para que o mesmo persista. 

“Repare que a sociedade portuguesa convive bem com a ideia de uma manada de tipos, energúmenos, aos berros, a ser transportada para dentro dos estádios protegida por um verdadeiro regimento policial. Depois não venham dizer que não há uma cultura de violência no futebol. Claro que há. E as pessoas fecham os olhos. E quando há um incidente mais grave, surge um surto de indignação. Mas continua tudo essencialmente na mesma”, lamenta.

Pacheco Pereira discorda da ideia de que o caso Marega vai permitir um combate mais eficaz ao racismo, sustentando que “os surtos de indignação nunca deram resultado”.  

“Não muda nada. Passado o surto, muito hipócrita, vai acontecer o que acontece com os surtos políticos e mediáticos: haverá indignação, leis, os primeiros ‘desgraçados’ vão apanhar com penas pesadas e não muda nada”, diz, sugerindo que estes problemas caem no esquecimento.

O comentador entende que existe legislação suficiente, mas que não é aplicada. “Quantas pessoas foram impedidas de entrar num estádio de futebol? Quantos clubes desceram de divisão devido a problemas com as claques?”, questiona, retomando o episódio racista que envolveu alguns adeptos do Vitória de Guimarães.

“Isto está a ser discutido como um problema de racismo, mas não é. Isto é um problema do futebol, porque o futebol é uma espécie de reservatório da violência. É tribal… E o tribalismo – que é das coisas mais perigosas da Democracia – vai dissolver este incidente num conflito entre clubes. Vai impedir e bloquear qualquer espécie de alteração de fundo”, acrescenta, naquele programa emitido nesta quarta-feira.

O professor e investigador concorda com a visão de Lobo Xavier (apresentada no mesmo programa), criticando as reações ao caso que envolveu Marega.

“Foi um festival de hipocrisia… Quando este surto perder valor mediático, haverá um próximo”, criticou.