Prolongamento
Roncatto entre histórias com “peidos”, minas e garrafas atiradas por Jesus
2018-10-04 23:00:00
‘Oh Cândido, a mina está aquiiiii cara***!!!”.

Lembra-se de Evandro Roncatto? Era um craque no Championship Manager, campeão do Mundo sub-17, o “novo Careca” e um dos “meninos bonitos” de Jorge Jesus, no Belenenses. Agora, joga no Casa Pia, do Campeonato de Portugal, treinado pelo amigo Rúben Amorim. Fomos falar com este rapaz simpático, afável, divertido e já com uns toques de português de Portugal, qual Pepe, no meio do descontraído português do Brasil. O que faz sentido, dado que Evandro já leva muitos anos de Portugal, casou com uma portuguesa e teve filhos por cá.

Foram cerca de 15 minutos muito bem passados. O problema é, agora, saber por onde começar este texto. Vejamos: temos um rapaz que não queria ir para o Arsenal, que recusou a ajuda de Jorge Mendes, que tem histórias com “peidos” - não leve a mal a linguagem, é apenas gíria -, com pedidos de desculpa, com uma mina e com garrafas de água atiradas por Jorge Jesus. E quis dar, em conversa com o Bancada, uma ajudinha a Luisão e Rúben Amorim. Confessamos a nossa ignorância: ao vermos Evandro Roncatto há tantos anos, pensámos que o brasileiro já tinha uma idade bastante avançada. 35 anos, talvez. Errado. Tem 32, pasme-se, e não quer parar por aqui. Já lá vamos.

Antes, vamos já aguçar o apetite e soltar a primeira historinha. Claro que, com um jogador treinado por Jorge Jesus, tinha de vir JJ ao barulho.

“Um dia, fomos treinar em Sintra com o JJ e tínhamos na equipa um brasileiro. Antes de começar o treino, ele solta um peido. Mas não é um peido simples. É um peido alto. O JJ ouviu e ficou cego, mas aquilo passou. Na quinta-feira, tínhamos reunião de equipa e, depois do vídeo, o JJ pediu para o tal brasileiro chegar lá à frente e pedir desculpa ao grupo pelo peido. Ele levanta-se e diz ‘queria pedir desculpa pelo peido que dei’. Claro que um jogador no meio do grupo a pedir desculpa pelo peido pôs toda a gente a rir. Até o JJ”.

“Quem? Jorge Mendes? Não quero…”

Os mais antigos e fãs de Champioship Manager lembrar-se-ão, certamente, de comprar o craque Roncatto ao Guarani, do Brasil. Olhem… lembram-se melhor do que o próprio Roncatto, que nem sabia que aquilo existia.

“Eu não tinha noção nenhuma. Só quando cheguei a Portugal é que soube. Falava-se muito disso e eu desconhecia completamente”, assume o jogador campinense, ao Bancada.

O certo é que ele era um craque tremendo e havia razões para isso. Campeão do Mundo sub-17, com o Brasil, em 2003, e segundo melhor jogador do Mundo dessa idade. Mas faltou o ‘click’. “A equipa em que eu jogava, o Guarani, estava num momento difícil financeiramente. Como aconteceu com o Belenenses, por exemplo. Aquilo começou a decair e eu era visto como o salvador da pátria, porque tinha 17 anos, era o segundo melhor do Mundo, já ia aos sub20, estive em Toulon, etc. Tinham espectativa de que eu seria o novo Careca, que também passou pelo Guarani. Era tudo em cima dos meus ombros”.

Antes de vir para Portugal, em 2007, o craque nascido no sudeste brasileiro já tinha estado em testes no Arsenal. E, caro leitor, ele nem queria ir! “Estive três meses no Arsenal, só que acabaram por não acordar a contratação”, recorda, antes de contar: “Naquela época, não havia tantas informações. Até para ir ao Arsenal foi uma briga, porque eu não queria ir, queria ficar no Brasil. Quando chegamos ao sítio e vemos outro Mundo é que temos noção das coisas”.

E foi nesta fase da carreira, após o Mundial sub-17, que Evandro assume ter cometido um dos principais erros: descartar Jorge Mendes. “Eu tive algumas propostas, em 2004, através do Jorge Mendes, que eu na altura não conhecia. Ainda não tinha ouvido falar e não conhecia muito bem. Conhecia melhor o Juan Figer e tomei decisão errada”.

Pergunta de um milhão de euros: acredita que, com Jorge Mendes, a carreira teria sido diferente? “Com certeza. Com o Jorge com certeza teria tido uma carreira muito diferente. Infelizmente, foi uma opção errada”.

"Vou dar moral aqui ao meu mister Rúben Amorim"

Evandro Roncatto conta-nos que, em 2006, Jorge Jesus foi vê-lo a jogar, no Brasil, e veio parar ao Belenenses. E por falar em Jesus, esta é uma boa altura para uma pausa lúdica. Perguntas diretas, para respostas simples, com um nome apenas. Houve muita batota à mistura, sobretudo a partir da quarta pergunta. Evandro rima com malandro. Não é, amigo Roncatto?

- Melhor momento da carreira: “Foi no Chipre, em 2010/11 e 2011/12”.
- Pior fase da carreira: “Foi no Guarani, no início”.
- Melhor treinador que teve: “Jota Jota. Para mim, foi o melhor em termos de conhecimento do futebol. Aprendi muito com o Jesus. Achamos sempre que já sabemos alguma coisa de futebol, mas aprendi muito com ele. Ainda hoje trago comigo o que ele falou há 10 anos”.
- Defesa mais difícil de ultrapassar: “Eh pá tem vários [pausa de vários segundos]. Ui, são tantos. Até cheguei a jogar contra o Real Madrid, que tinha Cannavaro e Pepe. Mas olha, vou deixar só por Portugal e vou pôr o meu amigo Luisão que, apesar de não ser o melhor, vou pôr como o melhor [risos]”.
- Melhor jogador com quem jogou: “Eh pá, tem de ser só um? Deixa-me dizer mais! Olha, um craque foi o Zé Pedro e outro foi o Silas. Ah, e o Wender! E ainda vou dar moral aqui ao meu mister Rúben Amorim [risos]”.

Caramba, Evandro… era só um!

Vamos voltar à bola. Pelo Belenenses, com Jorge Jesus, Roncatto não jogou só com o Real Madrid – o célebre jogo depois do qual Jesus disse que o Real de Schuster jogava “muito poucochinho” –, mas também com o Bayern Munique, nas eliminatórias da Liga Europa. “Foi uma sensação muito boa jogar na Liga Europa, contra jogadores que eu só via na televisão. A nossa equipa era muito boa. Infelizmente, não nos apurámos, mas deixámos uma boa imagem”.

Toca a fazer um fast forward pela carreira, para fugir aos clássicos perfis cronológicos. Nós queremos é palavras e historinhas. Roncatto passou pelo Paços, pelo Chipre, pela Bulgária, pela Grécia, pelo Oriental – bela temporada, na Segunda Liga – pelo Cazaquistão, por Inglaterra e pela Noruega. Ufa, que o homem não parou…

Já depois de um regresso ao Brasil, voltou a Portugal. “Quis voltar mais pela família. A minha esposa é portuguesa e tenho um filho com seis anos e uma com seis. A minha filha não pode mais acompanhar-me e, então, preferi estar aqui em Portugal, com a família. Estou a trabalhar com o Rúben Amorim, a ajudá-lo no Casa Pia”. “Já sei que para onde for nunca vou ganhar muito dinheiro”, assume.

Lembra-se da idade de Evandro? 32 aninhos. Perfeitamente a tempo de continuar a jogar, mas já de olho no futuro. “Eu acho que, se o corpo permitir e não tiver lesões graves, vou tentar jogar mais dois ou três anos. Depois, fazer como vários jogadores daquela equipa do Belenenses: o Wender, o Silas, o Zé Pedro, o Amorim… todos são treinadores”.

“Oh Cândido, a mina está aquiiiii cara***!!!”

A terminar, mais uma historinha made in Jorge Jesus. E esta é mais complexa, porque envolve muita gente.

“Temos uma história boa no Belenenses. Ainda hoje o Rúben Amorim fala dela. Tivemos um jogo com o Vitória de Setúbal, que tinha um defesa esquerdo que estava a voltar de lesão. O Jorge Jesus viu que ele estava assim mais cheiinho e fora de forma. O Jesus começou a gritar para o Cândido Costa: ‘Cândido, a mina está aqui [o tal lateral cheiinho]’. Mas o Cândido nunca ia jogar pelo lado desse defesa. Eis que o Jorge Jesus, que tinha uma garrafa na mão, atira a garrafa ao Cândido, para ver se ele atacava por aquele lado. ‘Oh Cândido, a mina está aquiiiii cara***!!!”.