Prolongamento
Ricardo Gomes: a bicicleta que alimenta o sonho do menino de Cabo Verde (Vídeo)
2018-04-17 20:35:00
O avançado do Nacional é o melhor marcador da 2ª Liga e está perto de regressar ao primeiro escalão

Na mesma semana em que Cristiano Ronaldo marcou um golo de bicicleta que correu mundo, em Portugal houve um jogador que repetiu com sucesso o gesto técnico do internacional português, na Choupana, diante da Académica. Ricardo Gomes, avançado do Nacional da Madeira, é nesta altura o melhor marcador da 2ª Liga, com 19 golos, mais um do que o brasileiro Vinícius, do Real SC, último classificado. Um nome que assim de repente parece-nos desconhecido, mas bem vistas as coisas há pontos de contacto que vão para além do mediatismo de um golo vistoso, do estatuto de ser o melhor o melhor marcador da prova e de ser titular, aos 26 anos, de um dos fortes candidatos à subida à I Liga. Sabia, por exemplo, que Ricardo Gomes já foi treinado por Rui Vitória? E que é representado pelo mesmo agente do treinador do Benfica?

A cidade da Praia, capital de Cabo Verde, cedo ficou para trás. Ricardo Gomes tinha apenas 17 anos quando rumou a Portugal à procura de melhores condições de vida levando com ele um sonho de menino: tornar-se futebolista profissional. Em Cabo Verde, onde jogou nos juniores do Batuque, equipa do Mindelo, ilha de São Vicente, em que foi companheiro de Zé Luís, jogador do Gil Vicente, SC Braga, e atualmente do Spartak de Moscovo, deixou os pais e quatro irmãos. Em Portugal, aguardava-o um outro irmão, na altura a estudar no Porto. Foi ele quem o ajudou na adaptação a um novo país.

Em Portugal, Ricardo Gomes representou apenas três clubes, dois deles vizinhos, o Vizela e o Vitória de Guimarães. No início desta temporada, vinculou-se em definitivo ao Nacional, depois de na época anterior ter sido emprestado pelo Vitória SC, clube onde não conseguiu singrar.

“Vim para Portugal para tentar a sorte no futebol. Cheguei ao Vizela [2009/10] ainda com idade para jogar nos juniores. Fiz alguns treinos e acabei por ficar. De início, foi complicado porque deixei a minha família, a quem sou muito ligado, em Cabo Verde mas tinha cá um irmão a estudar que me ajudou imenso. As coisas aqui são completamente diferentes, mas sabia que havia um preço a pagar e, apesar das saudades, conseguiu aguentar-me bem”, recordou o avançado em entrevista ao site oficial do Vitória SC.

Os primeiros anos no Vizela não foram fáceis. Ricardo Gomes esteve quase meia época parado devido a uma lesão. Como recorda Quim Berto, treinador dele em 2011/12, ao Bancada.  “Ele fraturou a tíbia e o perónio num treino, o que o afastou durante muito tempo da equipa. Mas demonstrou sempre uma personalidade forte e uma vontade enorme de superar as adversidades”. E quando regressou correspondeu às expetativas criadas. “É um jogador que faz bem todas as posições da frente, inclusive até a jogar nas costas do ponta de lança. É um jogador tecnicamente muito evoluído, rápido e bom finalizador. O lugar dele é na I Liga, sem dúvida”, refere Quim Berto.

Armando Evangelista, atual treinador do FC Penafiel, orientou-o na época seguinte no Vizela, e acabaria por levá-lo para o Vitória de Guimarães, onde alternou entre a equipa B e a equipa principal, então orientada por Rui Vitória, onde foi sempre mais vezes suplente utilizado. Rui Vitória com que tem um ponto em comum, é representado pelo mesmo agente, Moahmed Afzal.

Armando Evangelista recorda ao Bancada ter estado na presença de “um miúdo com um potencial enorme, fisicamente bem constituído, forte, rápido, tecnicamente evoluído, com uma capacidade de trabalho fantástica. Fez uma boa época na 2ª Divisão B e depois como o Vitória SC tinha uma equipa B achámos que era um jovem que poderíamos potenciar”.

As coisas não correram tão bem quanto se perspetivava, conforme reconhece Evangelista. “Ele esteve na B e foi à equipa principal, mas não deu tão certo como pensávamos. Acabou por ser emprestado ao Nacional e agora está a confirmar todo o seu potencial”. E razões para isso? “Está mais maduro, sabe pisar o terreno, não se desgasta tanto, compreende melhor o jogo. É um processo natural, ele teve poucos anos de formação em Portugal, amadureceu, é natural”.

Para o atual treinador do FC Penafiel, o estatuto de melhor marcador da Segunda Liga é algo que não o surpreende. “Ele teve sempre essa veia goleadora, sempre procurou o golo, sempre jogou perto da baliza”. O próprio Ricardo Gomes reconhece isso. “Melhorei muita coisa. Sobretudo jogar na frente. Eu antes jogava a extremo também. O meu estilo sempre foi esse só que agora está melhor. Tenho jogado com mais regularidade e isso ajuda muito”, admitiu numa das conferências de imprensa do clube madeirense.

Ricardo Gomes tem como ídolos Ronaldinho Gaúcho e Cristiano Ronaldo. E o campeonato onde mais gostava de jogar era o inglês. E um vício: as tatuagens. Tem oito e uma delas com o nome dos pais. E ao contrário da maioria dos jogadores não tem paciência para a playstation. “Adoro ver jogos de futebol. Passo o meu dia a ver jogos, ouvir música ou navegar na internet”.

De todos os treinadores que teve, tem uma especial admiração por Rui Vitória, “por ter sido o meu primeiro treinador num campeonato profissional, ajudou-me muito, aprendi muito com ele”, mas também por Costinha, o seu atual treinador no Nacional. “Deu-me a confiança que já há algum tempo não tinha, acreditou em mim”, disse recentemente. Confiança agora retribuída em golos que contribuem para o primeiro lugar do Nacional na 2ª Liga com vista para o regresso ao primeiro escalão.