Prolongamento
Paulo Sousa, uma história de como um treinador constrói o sucesso fora de portas
2017-11-08 20:40:00
Inglaterra, Hungria, Israel, Suíça, Itália e agora a China... O treinador Paulo Sousa tem sido um "globetrotter".

Paulo Sousa é a prova viva de que um treinador português não tem que trilhar caminho somente no próprio país para obter reconhecimento e sucesso no futebol. Após uma galardoada carreira enquanto jogador, aos 47 anos o agora técnico ainda não orientou qualquer equipa portuguesa, mas já conquistou vários títulos fora de portas e prepara-se para uma nova aventura, mais precisamente no milionário futebol chinês, ao comando do Tianjin Quanjian.

Sem treinar desde o final da época 2016/17, Paulo Sousa prepara-se para regressar ao ativo e competir com outro português, André Villas-Boas (Xangai SIPG), pelo título de campeão chinês. Maestro dentro das quatro linhas enquanto jogador, como quem pautava o futebol das equipas pelas quais passava, Paulo Sousa tem feito carreira como treinador fora de Portugal, salvo o começo da mesma, que teve lugar enquanto adjunto da equipa técnica dos sub-16 da Seleção Nacional até 2008.

Paulo Sousa pode ser denominado como um autêntico “globetrotter” dos tempos modernos. Ora, enumere… Inglaterra, País de Gales, Hungria, Israel, Suíça, Itália e agora China. Apenas com 47 anos de idade, são estes os países que já contam no palmarés do técnico português enquanto timoneiro. Na maioria deles, encontra-se um dado comum: sucesso. Porém, nem tudo começou num mar de rosas… As primeiras experiências como treinador não terminaram da melhor forma, com as curtas passagens por Leicester City e Swansea City a não deixarem a desejar.

No entanto, tudo mudou num clube de nome Videoton e foi a partir daí que a carreira de Paulo Sousa catapultou. “Os 18 meses na Hungria ajudaram-me a descobrir a minha mentalidade vencedora”, salientou o timoneiro português numa entrevista concedida ao “The Guardian” em 2014. E a verdade é que foi mesmo isso que aconteceu. Não obstante o facto de ter falhado em conquistar o campeonato do país, o Videoton de Paulo Sousa venceu duas Supertaças húngaras e uma Taça da Liga. A acrescer a isso, cruzou-se no clube com alguns jogadores de nacionalidade portuguesa, entre eles Marco Caneira, Vítor Gomes e Filipe Oliveira.

Crédito: Twitter Titan Sports Plus.

Após a experiência na Hungria, seguiu-se Israel, mais precisamente o Maccabi Telavive, clube no qual Paulo Sousa esteve durante uma temporada e ganhou um campeonato e uma taça. “Não tenho problemas de ir para ligas menos conhecidas. Para um treinador, é importante ter sucesso porque justifica os seus métodos e a sua abordagem, e o sucesso cria uma atmosfera positiva”, reiterou o treinador ainda na entrevista ao “The Guardian”, datada de 2014. Antes de regressar ao futebol transalpino, Paulo Sousa ainda chegou e conquistou a Suíça, com uma liga vencida no comando técnico do FC Basileia, em 2014/15. Depois, chegou o verdadeiro teste de fogo…

O sabor agridoce de Florença

A temporada 2015/16 marcou o regresso de Paulo Sousa ao futebol italiano, desta feita como treinador, onde já tinha estado enquanto jogador em clubes como a Juventus, o Inter Milão e o Parma. O técnico português assumiu o comando técnico da Fiorentina e a primeira época não deixou dúvidas aos adeptos do conjunto de Florença: qualificação para as competições europeias assegurada, com o quinto lugar na Liga Italiana a uma campanha que apenas prometia vir a ser melhorada no futuro.

Porem, não foi isso que aconteceu e 2016/17 foi uma época com semblante totalmente distinto para a passagem do português por Florença. A Fiorentina demonstrou várias fragilidades que até aí não lhe eram conhecidas, demonstrou-se inconsistente e perdeu pontos contra aqueles adversários diante dos quais essa mesma situação não pode, de todo, acontecer. O resultado? Um modesto oitavo lugar na Serie A e o consequentemente afastamento das provas europeias na temporada seguinte, precisamente aquela em que nos encontramos agora.

Crédito: MAURIZIO DEGL'INNOCENTI / EPA.

Essa quebra de prestação e rendimento culminou com a saída de Paulo Sousa do comando técnico da Fiorentina, mas o técnico saiu de coração “cheio”. "Florença, para mim, não é só o jogo em si. Representa muitas outras coisas. O meu trabalho não era só no campo, mas em todas as coisas que construí todos os dias. Acho que os adeptos vão lembrar-se de mim", eis palavras de Paulo Sousa dias antes de sair do cargo de treinador do clube.

No fim de contas, foi a paixão que sente pelo futebol que Paulo Sousa considerou não ter conseguido transmitir aos jogadores e aquilo que apontou ser o fator determinante para o “fracasso” da segunda época. “Dei tudo o que tinha para ajudar a Fiorentina a vencer. Saio orgulhoso por ter dado tudo de mim. Jogamos sempre ganhar, mas infelizmente deixámos escapar muitos pontos contra equipas que eram inferiores. Por outro lado, por vezes ganhámos jogos que não merecíamos. Talvez, não consegui transmitir toda a minha paixão pelo futebol”, lamentou o treinador português.

Treinador português é bom e recomenda-se

O sucesso que Paulo Sousa tem encontrado no estrangeiro vai ao encontro de muitos outros treinadores portugueses, com carreiras marcadamente ligadas ao futebol fora de portas, numa fase em que o “ADN” do técnico luso é um dos mais falados no desporto rei. Qual o segredo para o sucesso do treinador português? José Pereira, presidente da ANTF (Associação Nacional de Treinadores de Futebol), revelou-o. “O principal fator é efetivamente uma boa formação que tem sido feita pelos treinadores e orientada pela FPF, pela ANTF e pelas associações regionais e distritais”, começou por referir ao Bancada.

“Há efetivamente um talento intrínseco dos treinadores portugueses, com algumas coisas fundamentais: a operacionalização do modelo de jogo no treino, ou seja serem capazes de fazer os exercícios em função daquilo que querem do jogo; a adaptabilidade que os treinadores portugueses têm, no sentido de saberem distinguir bem o que é uma equipa para subir, uma para descer, outra para o meio da tabela, portanto orientar o trabalho em virtude dessas circunstâncias; e saber adaptar-se à filosofia, à própria sociedade, ao que são as características dos jogadores e fazer um trabalho em função das várias vertentes”, prosseguiu José Pereira.

A própria cultura do povo português foi outro dos pontos salientados pelo presidente da ANTF quando abordou o sucesso dos treinadores lusos no estrangeiro, pelo facto de esse ser um pilar fulcral para a adaptação a outro país e outro campeonato para jogar. “Desde os primórdios da nossa história que descobrimos o mundo e fomos por ele fora, adaptámo-nos onde chegámos, criámos raízes e continuámos dentro dessa mesma filosofia e por isso temos essa faculdade de nos adaptarmos de acordo com o ambiente que vamos enfrentar.”

Paulo Sousa está então inserido numa vaga de treinadores portugueses que têm vindo a criar o próprio sucesso somente fora de portas, como são também os casos de José Romão, Pedro Caixinha, Manuel José, Nelo Vingada, entre outros. O que faz do próximo técnico do Tianjin Quanjian e dos treinadores portugueses uma parte da elite europeia no que concerne ao comando técnico de equipas de futebol? Nas palavras de José Pereira, é “a imaginação, criatividade, adaptação e o bom-senso – os treinadores portugueses até têm por norma fazer treinos específicos com alguns jogadores. Temos efetivamente uma forma de estar em que privilegiamos o treino individual de acordo com as características dos jogadores e do que podem vir a melhorar.”