Portugal
Terminar a carreira em casa, um sonho global mas de difícil concretização
2017-10-13 17:20:00
O Bancada recorda três nomes recentes do futebol português que regressaram ao clube do coração para terminar a carreira.

Regressar a casa para terminar uma carreira futebolística é, para muitos jogadores e adeptos, um cenário de perfeição e derradeira declaração de amor que um futebolista ou adepto pode protagonizar. Ao longo da carreira são também vários os jogadores de futebol que, confrontados com a questão, não evitam deixar os adeptos de determinado clube a sonhar e suspirar com o regresso do filho pródigo a casa. Muitas vezes, porém, essas declarações de amor não são dotadas de especial possibilidade e, menos ainda, são as ocasiões em que o regresso de uma antiga glória do clube ou jogador acarinhado pela massa adepta de determinado clube realmente se efetiva. Ederson, confrontado com a possibilidade de um dia terminar a carreira no Brasil, afirmou hoje que gostaria, sim, de terminar a sua carreira ao serviço do Benfica. O atual guarda redes do Benfica junta-se assim a um conjunto de jogadores que, em tempos, afirmaram querer regressar "a casa" para terminar a carreira futebolística.  

As palavras de Ederson, antigo guarda redes do Benfica, que trocou Lisboa pelo Manchester City este verão a troco de 40 milhões de euros, fizeram hoje eco na imprensa nacional. Ao portal "Desimpedidos", após a primeira internacionalização pela equipa principal do Brasil, na vitória canarinha por 3-0 perante o Chile, Ederson afirmou a intenção de terminar a sua carreira em Portugal e ao serviço do Benfica. Quando confrontado com a pergunta se pretende terminar a carreira no Brasil, Ederson respondeu negativamente, assumindo o desejo de pendurar as luvas ao serviço do Benfica. Uma afirmação que apesar de muitos poderem considerar circunstancial e politicamente correta, não surpreende totalmente atendendo ao facto do antigo guarda redes do Benfica ter deixado São Paulo para ingressar no Benfica com apenas 15 anos.  

O regresso de jogadores acarinhados pela massa adepta dos três grandes, porém, não é uma recorrência habitual no atual panorama futebolístico português. Portugal, país vendedor e formador, tem políticas desportivas que não se coadunam com tal romantismo. No Benfica, em particular, tal situação não se sucede desde que Rui Costa regressou ao clube da Luz em 2006. Uma experiência que Luís Figo, por exemplo, no caso do Sporting, acabou por não conhecer apesar das várias manifestações de interesse ao longo da carreira. Contudo, há exceções. Rui Costa, no Benfica, foi uma delas, mas nas últimas décadas nomes como Carlos Xavier no Sporting, ou Domingos no FC Porto, também regressaram a casa a tempo de terminar a carreira no clube em que se notabilizaram. Será Ricardo Quaresma, o próximo? Ele que já tantas vezes vocalizou a intenção de terminar a carreira no FC Porto? 

Encantar o País Basco antes de regressar a casa para quase vencer uma Taça de Portugal 

Foi já à beira dos trinta anos que a primeira experiência internacional de Carlos Xavier surgiu na carreira do antigo internacional português e antigo capitão sportinguista. Já com um título nacional conquistado pelo Sporting, em 1981/82, Carlos Xavier rumou à Real Sociedad em 1991, clube no qual é ainda hoje recordado como um médio de grande talento que encantou a massa adepta basca devido à sua visão de jogo e qualidade de passe.  

Por San Sebastián, Carlos Xavier acabou por representar a Real Sociedad em três temporadas nas quais participou na quase totalidade dos encontros disputados pelo conjunto basco durante essas mesmas temporadas, período que o próprio Carlos Xavier definiu como o melhor da sua carreira. Em entrevista à revista Sábado em 2015, Carlos Xavier afirmou que na Real Sociedad "jogava onde queria, a seu bel-prazer". Clube ao qual chegou na companhia de Oceano e no qual foi orientado por Josh Toshack treinador que já tinha encontrado por Alvalade durante a temporada 1984/85. "Toshack confiou em mim, ajudou-me e deu-me liberdade. Já me conhecia do Sporting e foi ele que nos levou, a mim e ao Oceano, para a Real Sociedad. Hoje, se soubesse que iria acabar da maneira como acabei no Sporting, tinha ficado em Espanha. Se calhar ainda lá estava a trabalhar.", referiu Carlos Xavier na mesma entrevista. 

Carlos Xavier terminou a carreira no Sporting aos 34 anos em 1996, mas ainda que tenha regressado a casa para terminar a carreira, não o fez da forma como desejava. "Estava para fazer mais um ano de contrato, mas depois arranjaram ali um enredo em que todos foram culpados, mas ninguém teve culpa. Arranjaram maneira de acabar a carreira aos 34 anos. Foi um fim precipitado. Garantidamente, podia ter feito mais um ou dois anos. Se tivesse ficado em Espanha teria jogado até aos 36 anos" assumiu o antigo médio e lateral do Sporting. Certo, é que Carlos Xavier terminou a carreira após uma temporada prolífica na qual faturou por oito vezes ao serviço do Sporting, clube com o qual alcançou uma final da Taça de Portugal perdida no Jamor, por 3-1, perante o Benfica.  

O regresso do Maestro que nem precisou ler a partitura antes de a executar 

Sobre o regresso de Rui Costa, ao Benfica, em 2006, já praticamente tudo foi dito ou escrito. Para a história ficou o relato de uma assinatura de contrato sem sequer o ler ou saber o valor que iria auferir durante o período que voltou a envergar a camisola do clube da Luz. “O Rui disse-me para meter o contrato à frente, e que o assinaria sem lá estar o valor que iria ganhar. O Rui só soube quanto ia ganhar depois de assinar. Isto revela o seu carácter. É um grande homem, para além de um grande futebolista”, revelou Luís Filipe Vieira em 2006 por ocasião da apresentação oficial de Rui Costa como reforço do Benfica para a temporada 2006/07. 

Nessa temporada 2006/07 chegaram à Luz dois nomes históricos do futebol português. Não só Rui Costa regressou ao Benfica doze anos depois de o ter abandonado rumo a Itália e à Fiorentina, como Fernando Santos foi apresentado como o novo treinador do Benfica para a referida temporada. Fernando Santos, antigo campeão nacional e futuro campeão europeu, tornou-se assim no mais recente técnico a liderar os três grandes de Portugal.  

No regresso à Luz, porém, Rui Costa não conseguiu igualar o feito alcançado na temporada 93/94, a última antes de seguir viagem para Itália, deixando o Benfica como campeão nacional. Na temporada de regresso ao Benfica, Rui Costa participou em 22 partidas ajudando o clube encarnado a uma temporada invicto em jogos caseiros, mas ficou a dois pontos do título nacional vencido pelo FC Porto. A derradeira temporada de Rui Costa, quer no Benfica, quer da própria carreira, chegou em 2007/08, em que apesar do quarto lugar final na liga e de uma distância de dezassete pontos para o campeão FC Porto, participou em 45 jogos pelo Benfica nos quais faturou por 10 vezes, números que não registava desde o final dos anos 90 então ao serviço da Fiorentina. 

"Rapto" de última hora para um final de carreira perto de casa 

Quando Domingos Paciência deixou o Tenerife, em 1999, talvez já não passasse pela cabeça do antigo avançado do FC Porto regressar ao clube que o celebrizou de forma a terminar, perto de casa, a sua carreira profissional, mesmo que esse até fosse o desejo de Domingos. Mas, no futebol, como na vida, o destino é traiçoeiro e nem sempre o que parece, é, ou acaba por acontecer. Domingos tinha tudo acertado com o Sporting para o seu regresso a Portugal depois de duas temporadas na liga espanhola ao serviço do Tenerife. Porém, uma chamada telefónica de Pinto da Costa, quando seguia a caminho de Lisboa, trocou as voltas à carreira de Domingos, levando o antigo internacional português a esquecer o clube lisboeta e a assinar, sim, pelo FC Porto. 

As palavras são do próprio Domingos. Em entrevista ao DN em janeiro de 2016, o antigo avançado confirmou o quão perto esteve de assinar pelo Sporting em 1999 aquando do seu regresso a Portugal após curta passagem por Espanha. "Desde que decidi deixar Espanha, a minha vontade sempre fora regressar ao FC Porto, queria voltar a casa", assumiu, algo que justificou o facto de até ter aceitado receber menos no FC Porto que aquilo que iria receber no Sporting. "Eu queria era voltar ao clube do meu coração, e assim foi" acrescentou ainda. 

Tudo mudou, para Domingos, quando a caminho de Lisboa, viagem destinada a ultimar os detalhes da ligação ao Sporting, uma chamada telefónica de Pinto da Costa o demoveu de assinar pelo clube de Alvalade. O sonho de Domingos, afinal, cumprir-se-ia. "Estava a conduzir, já estava na autoestrada, ali perto da Exponor, quando o meu telefone tocou. Era o presidente Pinto da Costa a perguntar onde é que eu estava. Disse-lhe que estava a caminho de Lisboa e ele, de imediato, disse-me para não ir e que ia ter comigo para assinar pelo FC Porto" confessou Domingos ao DN. O antigo avançado, porém, garantiu que tudo estava devidamente previsto no acordo que tinha com José Veiga, então empresário e intermediário da transferência de Domingos para Alvalade. "Eu tinha um acordo com o José Veiga, segundo o qual se, em algum momento, o FC Porto aparecesse para me contratar, o negócio com o Sporting ficaria sem efeito" assegurou ainda. 

De possível reforço do Sporting a terminar a carreira de Dragão ao peito, passou, então, pouco tempo e Domingos terminaria a carreira em 2001 conhecendo apenas dois clubes na mesma. O FC Porto e o Tenerife, clube que representou entre 1997 e 99 em cinquenta ocasiões e pelo qual apontou seis golos. Domingos terminou a carreira em 2001, temporada que o FC Porto terminou na segunda posição da liga portuguesa e na qual conquistou uma Taça de Portugal. Jogo decisivo que, porém, não contou com a participação de Domingos Paciência.