Portugal
"O povo vai para a rua mas não é para festejar títulos", avisa Manuel José
2020-03-26 12:55:00
Treinador explica ao Bancada que se o futebol regressar esperam "desafios tremendos" às equipas e adeptos

Marquês de Pombal e Aliados têm sido, nos últimos anos, o centro nevrálgico das comemorações dos títulos de campeão, com milhares a deslocarem-se de bandeira na mão, cachecol ao peito e gritos de incentivo. Este ano, por causa da pandemia de Covid-19, ninguém sabe bem como é que as coisas vão acontecer, até porque nem é seguro dizer, ao dia de hoje, que o campeonato será finalizado seja no campo ou na secretaria e se haverá alguma equipa considerada campeã. 

Manuel José, prestigiado treinador português, conversou com o Bancada e admitiu que se não for possível jogar mais nesta época, a melhor solução é "ninguém ser considerado campeão".

Mas no caso de ser possível retomar a competição (sinal de que a pandemia deu tréguas e as pessoas podem retomar as suas vidas), e se for possível encontrar um campeão no campo, Manuel José crê que as pessoas vão mesmo sair à rua mas por outras razões que não os festejos habituais.

"O povo vai para a rua mas não é para festejar títulos. O povo vai para a rua reclamar por comida, por dinheiro, por trabalho porque isto vai ser uma crise grave e o futebol não será o foco das preocupações", vaticina Manuel José.

O técnico admite, de resto, que será o povo quem irá "sofrer mais" com a crise económica e como é o povo que 'consome' futebol... por arrasto o desporto irá sofrer.

"Mesmo para quem mais gosta de futebol que é o povo, o futebol vai passar para segundo ou terceiro plano num cenário tremendo que vamos todos ter de enfrentar assim que a crise de saúde seja ultrapassada. Vamos ter um cenário muito difícil. As pessoas já estão a ter noção disso mesmo", descreve Manuel José.

Nesta entrevista ao Bancada, o ex-treinador de Benfica, Sporting e Boavista, entre outros emblemas, considera que o futebol não irá apenas sofrer um impacto secundário a nível financeiro mas também diretamente com os patrocínios.

"Grande parte do tecido empresarial em Portugal que apoia os clubes são pequenas e médias empresas e muitas delas vão fechar por falta de receitas. As pessoas vão ficar desesperadas e o futebol também vai sentir isso. Os patrões vão começar a despedir, como já vamos vendo que alguns querem fazer, e haverá menos dinheiro para o futebol", realça Manuel José.

E no caso de ser possível retomar a competição, como é que as equipas vão aparecer após esta paragem? Manuel José acredita que tanto a Liga como a Federação Portuguesa de Futebol não vão dar muito tempo aos clubes para realizarem uma espécie de pré-época.

"As pessoas têm de ter a noção de que esta paragem poderá ser maior, ou já está mesmo a ser, do que a habitual paragem no fim do campeonato, nas quais muitos jogadores nem férias têm pois vão para as seleções. É preciso ter noção de que, se existir a possibilidade de terminar a época em campo, será uma ponta final de temporada muito exigente".

O treinador realça ainda que grande parte das equipas portuguesas "não estão habituadas a três jogos por semana mas têm de se adaptar" e prevê que as entidades que gerem o futebol nacional possam dar algumas semanas de preparação.

"Acredito que se for possível, vão dar uma ou duas semanas para treinarem e depois começa logo a competição", disse, certo de que, apesar das limitações, o trabalho que vem sendo feito pelos jogadores em casa, acabará por contar mas existem sempre reservas.

"Treinar em casa é uma coisa e jogar é outra. Não haverá tempo para pré-época".

Manuel José está certo de que "os jogadores perderam rotinas mas não haverá tempo para esperar".

"Depois cada um jogará com as 'armas' que tiver e estará melhor quem nesta paragem forçada conseguir ter os jogadores em forma, mais ligados, o grupo unido por videoconferência e vá conseguindo desenvolver mecanismos para o regresso à competição".

A Liga portuguesa parou na 24.ª jornada, faltando realizar 10 rondas para o final. Nesta altura, o FC Porto é primeiro, o Benfica, segundo, o SC Braga terceiro e o Sporting quarto. 

Na quinta posição está o Rio Ave que, face aos finalistas da Taça de Portugal (Benfica e FC Porto) poderá ter vaga no acesso à Liga Europa.

Em zona de despromoção estão Portimonense e Desportivo das Aves.