João Filipe é o homem do momento. O campeão europeu sub-19 está na berlinda e para efeitos futebolísticos, chamemos-lhe “Jota”. Quem o conhece diz-nos que é tratado assim desde tenra idade. Quisemos conhecer melhor este rapaz que destruiu os adversários de Portugal, no Euro sub-19, e, com a ajuda de Gonçalo Medeiros, Tomás Pires, Gonçalo Raposo e Diogo Pacheco, todos ex-colegas, chegámos a um perfil que nos parece fiel. E temos histórias com beatbox, com truques, com “malandrices” e com competições a sério. A ler mais à frente.
Para já, antes de irmos ao Jota – um jogador do Benfica que já está sob a alçada de Jorge Mendes –, conheçamos o João Filipe. Juntando o que nos disseram, não há dúvidas de que este jovem é, no dia-a-dia, um grande “doido”. No bom sentido.
Gonçalo Medeiros, ex-colega, fala, ao Bancada, do lado brincalhão: “Considero o Jota uma pessoa bem-disposta, sempre a sorrir e criador de bom ambiente no balneário. Lembro-me de momentos no ginásio e de muita gargalhada. Quem conhece o Jota sabe que ele é uma fonte de energia e boa disposição”.
Tudo bem, o rapaz é bom a animar a malta. Mas e a dar-lhes música? “Ele bem tentava imitar-me no que toca a tentar fazer beatbox, mas não conseguia lá muito bem”, acrescenta o ex-colega.
“Quando era para a brincadeira, era para a brincadeira”, dispara, por sua vez, Tomás Pires, outro ex-colega, apesar de acrescentar: “Mas ele sabe distinguir bem os diferentes espaços. Dentro do campo era para estar concentrado”.
Para além da paródia, Jota tem tiques de líder e era um norte para os mais jovens. “Não era por acaso que era um dos capitães de equipa, pois ajudava muito os jogadores novos, quer na integração deles no plantel, como até do ponto vista motivacional”, destaca.
Geraldes não é o único
Ainda sobre a personalidade do jovem craque, houve um depoimento que nos saltou à vista. Tal como Francisco Geraldes é falado pelo nível de cultura e gosto pelo erudito, João Filipe também tem esse lado. Diogo Pacheco e Tomás Pires garantem-nos isso. “É uma pessoa bem formada, com cultura, inteligente e que nunca deixou os estudos de parte”, diz Diogo, numa visão subscrita por Tomás: “É uma pessoa muito consciente da vida fora do futebol”.
Nada disto – a qualidade futebolística e o nível cultural –, no entanto, traz presunção a João Filipe. Pelo contrário. “É um miúdo trabalhador, muito divertido com o grupo que o rodeia e, apesar de estar no topo, é muito humilde”, diz Gonçalo Raposo.
Mas vamos lá à primeira historinha. E, por ser a primeira, vem mesmo da boca do próprio Jota.
“No meu primeiro torneio, a minha equipa [Ginásio de Corroios] chegou à final. Ganhámos 11-0, tendo os onze golos sido apontados por mim. Os olheiros do Benfica falaram com os meus pais e disseram que queriam que fosse realizar alguns treinos ao clube", contou, em 2015, ao site “Jovens Promessas”.
Dez tenros anos e onze impressionantes golos. Aliás, isto é algo que não ficou por aqui. Já no Benfica, o rapaz, apesar de jogar a partir da ala, marcava que se fartava.
Diogo Pacheco di-lo por experiência própria, dado que Jota tratou de ofuscar aquela que, um dia, poderia ter sido o dia de glória de um estreante Diogo. Roubou os holofotes ao rapaz. “Lembro-me bem do meu primeiro jogo pelo Benfica, no qual marquei um hat-trick”, começa por contar, acrescentando: “Mesmo assim, ele marcou quatro golos. Uma máquina. O Jota é aquele jogador que, quando lhe passamos a bola, já sabemos que ‘vai para cima’ e é disso que os melhores jogadores precisam, dessa mentalidade de guerreiro”. Em todos os jogos percebia-se que era ele quem se destacava, sempre rebelde com a bola nos pés e com a vontade de ir sempre em busca de mais um golo”.
“Ele ficava maluco”
Este é um bom pretexto para passarmos, definitivamente, do João Filipe para o Jota. Jota é um craque. Não, não tem uma “mota” que distingue alguns extremos, mas tens uns pezinhos dos diabos. “Nunca o achei um extremo rápido como há hoje em dia, mas tem o que muitos não têm, que é qualidade técnica”, explica Gonçalo Raposo, ex-colega.
Trata-se de um ala forte no 1 contra 1 – quer de dentro para fora como de fora para dentro – e que, por ser quase ambidestro, tem logo uma vantagem tremenda na imprevisibilidade. É muito bom no passe – quer no último passe, pelo chão, quer no passe longo, a virar o centro do jogo – e é, sobretudo, um jogador sem medo de perder bolas. Arrisca. O próprio Jota assume-o: “Sou um jogador diferente porque acho que tenho o futebol de rua nas botas. Às vezes, perco a bola por causa disso e tenho de me adaptar ao futebol moderno, mas o meu objetivo é esse mesmo”, disse, recentemente, citado pelo “Observador”.
Como nada acontece por acaso, colocamos aqui uma imagem que mostra Jota junto de um grande passador de bolas e “amigo” dos avançados – Andrea Pirlo – e outra com alguém que foi um grande driblador e que é, agora, um grande finalizador – Cristiano Ronaldo.
Jota arrisca no drible e no passe, mas também no remate. Não é que tenha um “pastel” muito forte, mas finaliza muito bem. Aquela malta do Euro sub-19 que o diga. Esses e… Tomás Pires, que era guarda-redes do Benfica.
“Lembro-me de que, nos treinos, havia sempre exercícios de finalização e, como eu era guarda-redes, andávamos sempre a ver quantos golos é que ele me marcava. Se eu defendesse mais, bolas do que aquelas que entravam, ele ficava maluco. Depois, se fosse preciso, no treino a seguir, eu estava tramado com ele, porque dificilmente tirava alguma”, conta, ao Bancada, entre risos.
Jota chegou ao Benfica com nove anos, depois do tal jogo dos onze golos. Passou pelos patamares todos e, em vários anos, acabou por jogar no escalão acima do dele. Em 2014/15, por exemplo, este juvenil de primeiro ano foi campeão pela equipa de segundo ano e ainda deu uma perninha nos juniores.
“Não te queremos”, disse o Manchester United
Antes disto, com 15 anos, Jota foi chamado para ir fazer uns treininhos ao Manchester United, depois de uma temporada com 22 golos em 33 jogos. Na altura, foi com o guarda-redes João Virgínia, outro campeão da Europa.
Não ficou. Nem ele nem Virgínia. O guarda-redes acabou por ir para o Arsenal no ano seguinte, mas Jota deixou-se ficar pelo Seixal.
E era a ir para o Seixal que, todos os dias, inventava coisas novas. Daniel Afonso, ex-colega, lembra-se bem disso: “Ele aparecia sempre com truques novos. Todos os treinos”.
Antes de terminarmos com mais uma historinha, temos de trazer alguns dados importantes, prometendo não maçar com um perfil cronológico e com estatísticas chatas. Aos 19 anos, Jota já soma vários títulos de formação, no Benfica, um europeu sub-17, um europeu sub-19 e quase 30 jogos pela equipa B dos encarnados.
“Vou ter de virar o gajo…”
A terminar, trazemos um momento que atesta, sobremaneira, o que Jota é capaz de fazer em campo. Ele dribla – dribla muito – e, com isso, irrita muita gente.
“Lembro-me de uma que não foi comigo, mas que eu presenciei. Num treino, o João estava sempre a fazer “maldades” ao lateral e lembro-me de esse jogador me dizer que, na próxima, teria de o "virar". Era a única maneira de lhe tirar a bola. O engraçado é que, mesmo assim, não conseguiu tirar-lhe a bola”.