Opinião
O tempo e o vento
2018-02-07 14:00:00

Passado o festim do mercado de janeiro, FC Porto e Sporting continuam a marcar o ritmo do futebol português, mas agora já só dançam cara a cara na Taça de Portugal.

No campeonato, o Benfica mantém-se impante quando joga em casa, transformando cada encontro na Luz numa afirmação de capacidade de luta por um pentacampeonato que volta a ser um objetivo viável, agora que a liderança está a uma distância encorajadora para a equipa de Rui Vitória.

Fevereiro, um pequeno e gélido mês, começou por acentuar a ideia de equilíbrio entre as três candidaturas, ao mesmo tempo que confirmou que há uma distância quase inultrapassável de argumentos em relação a quem segue no degrau abaixo.

O Braga (quarto classificado), crónico candidato à interrupção do histórico domínio tripartido, somou a quarta derrota em cinco confrontos com os grandes no campeonato (dois desaires com o FC Porto, duas derrotas frente ao Benfica e um empate a dois golos em Alvalade).

No jogo do Dragão, a equipa de Abel Ferreira perdeu a compostura defensiva em três ataques aéreos de grande qualidade, todos planeados por Alex Telles, um multiplicador de assistências para golo que merece um lugar de destaque na lista das principais figuras do campeonato. Já agora, ao lado do brasileiro também merece estar outro lateral esquerdo, o benfiquista Alex Grimaldo. No jogo frente ao Rio Ave (quinto classificado), o defesa espanhol do Benfica juntou-se de forma perfeita a Cervi e Zivkovic, numa sociedade de criação de desequilíbrios com fins muito lucrativos para os encarnados.

Está aberta a fase da temporada em que o vento muda rapidamente, faz oscilar a confiança e provoca alterações rápidas na classificação. O Sporting acabou por sentir a confirmação daquilo que o FC Porto deixou (por enquanto) pela metade: uma derrota na casa do Estoril.

A coincidência é sempre um ponto de partida demasiado arriscado para qualquer análise. Mais ainda neste caso, porque se percebe a contínua evolução no jogar do Estoril, desde que Ivo Vieira chegou à equipa amarela. Estamos perante uma formação que não desiste do bom futebol, que demonstra ser tecnicamente forte e que tenta sempre atacar a baliza adversária. Tudo isto soma ao talento individual de Ewandro (emprestado em janeiro pela Udinese), Eduardo e Lucas Evangelista (acima de todos), acabando por permitir ao Estoril equilibrar jogos e ambições frente a adversários mais fortes.

É um exagero dizer que o Sporting jogou na Amoreira decepado de metade da qualidade ofensiva, mas fará sentido sublinhar os problemas que as ausências de Bas Dost e Gelson Martins criam nas intenções atacantes de Jorge Jesus. Frente ao Estoril-Praia, o técnico leonino lançou Doumbia, com o apoio de Bruno Fernandes nas costas e de Acuña e Bruno César nas alas, mas com este elenco Jorge Jesus viu a equipa perder poder de penetração no espaço interior. Face à ausência de Gelson e com Rúben Ribeiro e Bryan Ruiz no banco de suplentes (entraram ambos na segunda parte), sobrava Bruno Fernandes para essa missão essencial para o sucesso ofensivo dos leões.

Com Gelson Martins a regressar de lesão e sem Bas Dost nos planos para o clássico do Dragão, Jorge Jesus corre o risco de enfrentar alguns dos mesmos problemas, mas desta vez frente a um rival bastante mais competitivo que o Estoril. A provável titularidade de Doumbia não mascara a ausência de uma alternativa sólida ao goleador holandês no plantel do Sporting.

O tempo é de decisões, mas também de indefinições e encostos à parede. Bruno de Carvalho entendeu que esta é a altura certa para medir a musculatura do apoio dos sócios e colocou a liderança à prova, ficando dependente da aprovação de três pontos em Assembleia-Geral. No entanto, no “ultimato” anunciado aos associados, Bruno de Carvalho exige uma aclamação, uma volta triunfal que lhe permita ganhar ânimo perante o que diz ser uma vida de “sequestro” diário, desde que se envolveu no dirigismo leonino.

O Sporting não é diferente da generalidade dos clubes portugueses. Tal como os rivais, tem um modelo de governação unipessoal e com pouca simpatia por opiniões divergentes. A diferença está no facto de Bruno de Carvalho querer verter para os estatutos essa prática de mau convívio com as críticas, decretando um unanimismo que parece ser pouco natural. E pouco democrático.

Manuel Fernandes Silva é jornalista na RTP e escreve no Bancada às quartas-feiras.