Opinião
O silêncio dos inocentes
2018-03-08 14:00:00

"Tudo o que soube foi pelos jornais", disse Luís Filipe Vieira à saída da reunião de Presidentes, em Coimbra. O silêncio camuflado do presidente do Benfica sobre aquele que foi o braço direito do líder do clube da Luz durante vários anos, agora indiciado por alegada suspeita de corromper funcionários judiciais para favorecer os encarnados, é descabida e indiciadora de compromisso, assim como foi a reação à de não conhecer a existência de claques no clube. A suspeita que recai sobre Paulo Gonçalves, na denominada operação e-toupeira, não pode ser desassociada do Benfica, e muito menos de Vieira, que o trouxe para o clube como parte crucial de uma estratégia, seja ela qual for.

Porque o melhor, e mais sensato, que o presidente do Benfica deveria fazer numa altura destas em que os adeptos encarnados se interrogam sobre o terremoto que assolou o clube nos últimos dias , era o de tomar uma posição sobre o que se está passar. É a imagem do clube que está em jogo. Mas se tudo o que soube foi pelos jornais, o silêncio dos inocentes vai perdurar.

Não me interessa, sinceramente, se o Benfica está a ser alvo de uma cabala como sustentam alguns dos ideólogos do clube, ou se os seus próprios representantes estão mesmo comprometidos com os últimos casos que a justiça revelou. O grave em tudo isto, e o que devia preocupar as instâncias desportivas e governamentais, é mesmo a falta de credibilidade que o futebol português, que ostenta o título de campeão europeu, vai ganhando junto dos cidadãos, que têm cada vez mais razões para desconfiar, para andarem escaldados. Os casos sucedem-se – as suspeitas que recaem sobre o jogo Estoril-FC Porto é outro caso que tem de ser esclarecido em nome da verdade desportiva - um sentimento de impunidade paira no ar, consubstanciado na falta de força da justiça desportiva, e o pensamento de que o futebol também se ganha fora das quatro linhas tornou-se quase banal.

O futebol português vive num limbo, num chão que aparenta pisar com tanta certeza mas que, afinal, já não está tão firme assim. Aos olhos dos cidadãos, o futebol deixou de ter credibilidade por culpa da falta de sentido ético em muitas das coisas que os principais agentes fazem. Pior ainda é o sentimento de resignação a que este estado vegetativo conduz: gente que encolhe os ombros e diz...."não vai dar em nada; todos roubam, são todos iguais…”. A sensação que o comum cidadão tem é a de que alguns ficarão sempre impunes. Os sinais de alarme estão aí, é preciso fazer alguma coisa antes que seja tarde de mais. Urge criar condições para que o futebol português de uma vez por todas seja transparente. A consagração do Estado de Direito, o verdadeiro, tem de ser levado até às últimas consequências. Doa a quem doer. Antes que seja tarde de mais.