Opinião
O que vale José Peseiro
2018-08-02 14:00:00

A chegada de José Peseiro ao Sporting não foi consensual, percebe-se, de tão dividido que está o clube, mas a pouco mais de uma semana do início do campeonato o treinador leonino, partindo com atraso em relação aos outros concorrentes mais diretos, foi tendo a paciência necessária para indo juntar as peças do puzzle, à medida que as ia tendo, e do que se viu no jogo de apresentação aos sócios, frente ao Olympique Marselha, já se nota trabalho de treinador. De uma manta de retalhos, Peseiro e a sua equipa técnica foram capazes de coser um cobertor. Ainda é curto (faltarão ainda mais um médio e um avançado) e até pode ser que não seja suficiente para atingir objetivos maiores, mas em vésperas do arranque do campeonato em Moreira de Cónegos, diante do Moreirense, há, pelo menos, uma certeza. Depois da tempestade que assolou o clube, o Sporting tem uma equipa competitiva e, aqui e acolá, apesar dos adversários de pré-temporada não terem sido de elevado grau de dificuldade, à exceção do OM, o leão já mostrou o tal futebol atrativo que Peseiro prometeu, apesar de revelar algum amadurecimento ao nível das ideias de jogo ao dizer que por vezes atacar em demasia pode ser prejudicial aos objetivos de um aequipa, que é vencer. O Sporting dá sinais de vida, apesar da mais conturbada pré-época da história centenária do clube de Alvalade.

José Peseiro teve a coragem de aceitar um desafio que não se prevê nada fácil. A começar pela conjuntura do clube de Alvalade mergulhado em período eleitoral do qual sairá, não se sabe, se unido ou ainda mais dividido, e pela própria história do técnico no Sporting. Em 2004/05, recorde-se, Peseiro perdeu tudo numa semana, começando a ganhar a fama do treinador do quase. Falhou o título de campeão nacional após derrota com o Benfica, falhou a conquista da Taça UEFA, em pleno Estádio José de Alvalade, perdendo com o CSKA por 3-1, na final. E no último jogo do campeonato, em casa, perdeu o acesso à Liga dos Campeões ao ser derrotado pelo Nacional da Madeira. Peseiro ainda carrega nas costas essa imagem e apesar de dizer que este regresso a Alvalade "não é um ajuste de contas com o passado", esse fantasma pairará sempre se os resultados não forem os melhores.

A abordagem que se faz à carreira de Peseiro faz sempre lembrar aquela questão do copo meio cheio ou meio vazio. Olhando apenas para a vertente dos resultados, temos os defensores do copo meio vazio, olhando para o percurso do treinador ribatejano temos a do grupo do copo meio cheio. A verdade é que desde o último título em 2001/02, já lá vão 16 anos, o Sporting esteve na corrida pela conquista do campeonato até ao fim apenas por quatro vezes e uma delas foi com Peseiro que ainda é o único treinador que levou o Sporting a uma final europeia.

A falta de títulos vistosos não enfraquece a consistência que José Peseiro tem tido ao longo de uma carreira que começou em 1992 no União de Santarém. Peseiro já passou por FC Porto, SC Braga, Vitória SC em Portugal, bem como Al Hilal, Panathinaikos, Rapid Bucareste, seleção da Arábia Saudita, Al Wahda, Al-Ahly, no estrangeiro, um percurso de resiliência de um treinador que continua, aos 58 anos, à procura de maior glória do que ter vencido uma Taça da Liga na primeira passagem pelo SC Braga, um título da II Divisão ao serviço do Nacional da Madeira, e um título de campeão egípcio pelo Al-Ahly, apesar de ter saído a meio da época para substituir Lopetegui no FC Porto. Temos tendência a avaliar o percurso dos treinadores pelos resultados e esquecemo-nos de olhar para o percurso. E o percurso de José Peseiro tem sido de uma consistência que o faz estar sempre em clubes de topo, embora sempre em contextos difíceis. Como agora no Sporting.