Opinião
O Benfica e as lesões recorrentes
2017-08-29 14:00:00
Com Pizzi, já são doze os lesionados na Luz esta época. Suficiente para provocar o incómodo em Rui Vitória.

A forma como Rui Vitória se referiu à questão das lesões, no final do Rio Ave-Benfica, fez disparar muitas campainhas de alarme pelas redações deste país. O incómodo era visível para quem conhece minimamente as reações do treinador benfiquista, que acabara de perder Jardel e vira o seu substituto fazer o autogolo que deixou a equipa em desvantagem momentânea. A questão é que esta não é uma situação nova na Luz e o treinador não estaria mais surpreendido com ela do que com a qualidade do adversário, acerca de quem negou várias vezes essa mesma surpresa. E aos que adotam o raciocínio tantas vezes simplista de castigar o treino, basta recordar que esta já é uma situação recorrente desde os tempos da anterior equipa técnica, que depois não teve um décimo dos problemas quando mudou de cores. A questão é que, dê por onde der, alguma coisa está a falhar.

Só esta época, foram já doze os jogadores que o Benfica teve lesionados, tendo Salvio baixado ao estaleiro duas vezes, por causa de dois problemas diferentes. Além do argentino, que falhou o jogo de Vila do Conde, e de Jardel, que nele se lesionou, pelo departamento médico da Luz andam nestes momentos Fejsa, Grimaldo, Mitroglou e agora Pizzi, que tudo indica terá sido vítima de uma situação que Rui Vitória classificou como “caricata” – diz o Record que o jogador, entretanto dispensado da seleção por causa da lesão, se magoou a vestir os calções. E pelo departamento médico passaram já, desde o início da temporada, Júlio César, Krovinovic, André Horta, Luisão, Zivkovic e Carrillo. A situação podia ser classificada como uma onda de lesões, não trouxesse ela à memória o que se passou na época passada, quando o Benfica teve de encarar um par de jogos sem nenhum dos pontas-de-lança que tinha no plantel – Jonas, Jiménez e Mitroglou – acabando por adaptar Rafa e Gonçalo Guedes. E poderia ser imputada à forma de trabalhar desta equipa técnica, não fosse ela a repetição do que já se passara antes, quando era ainda Jorge Jesus a mandar, como recordou o João Vasco Nunes neste trabalho publicado há dias no Bancada.

O que falha, então? Há uns anos, ficou famosa em Portugal a expressão “índice lesional”, usada por Henrique Jones, médico da FPF, durante o catastrófico Mundial de 2014. E grande parte da explicação para o que se passa no Benfica há alguns anos pode estar aí: há, no Benfica, jogadores com um elevado “índice lesional”. Fejsa é um caso. Salvio é outro. Jonas, Grimaldo ou Júlio César estão na mesma linha. Há uns anos, a propósito de Robben – que entretanto parece ter reduzido a predisposição para se lesionar desde que chegou a Bayern – falava-se muito na imprensa internacional em “jogadores de cristal”, que quebram ao mínimo impacto, e é evidente que no Benfica o cristal está bem à mostra nas prateleiras. Mas alguém é capaz de dizer que o que falha é o “scouting”, por recomendar jogadores com elevado “índice lesional”, quando esses homens têm a qualidade e dão o contriuto de Salvio, Fejsa, Jonas, Grimaldo ou Júlio César? Esse parece um passo maior do que a perna.

Reivindicando tantas vezes o Benfica para si mesmo a vanguarda da ciência aplicada ao futebol, através do Benfica Lab, o que falha é claramente a articulação entre os cientistas e os que estão no terreno. Tenha ou não a situação sido causa de “atritos”, como escreveu o Correio da Manhã, é evidente que estes dois grupos falam linguagens diferentes e que algo funciona mal quando se passa de uns para os outros. A consciencialização desse problema chega para causar muito incómodo em quem, como Rui Vitória, assumiu o desafio do pentacampeonato com um plantel mais pobre do que o que lhe deu o tetra. Para lá chegar, o Benfica tem de fazer mais para evitar que os seus jogadores continuem a cair como tordos.