Prolongamento
Djalmir: do revolucionário Sérgio Conceição ao sonho de ser presidente
2018-10-18 21:30:00
Aos 42 anos, o histórico avançado do Olhanense está de volta aos relvados

A 6 de março de 2010, Djalmir fazia aquilo de que muito poucos se podem orgulhar: bisava no Dragão e colocava o FC Porto de Falcão, Hulk, Bruno Alves, Alvaro Pereira, Helton e companhia, literalmente, em sentido. A equipa liderada na altura por Jesualdo Ferreira saía para o intervalo debaixo de um enorme coro de assobios a perder por 2-0 perante o Olhanense. Falcão, a nove minutos do final, e Guarín, já no quarto minuto de compensação, atenuaram o desaire dos azuis e brancos que, assim, empataram a dois golos perante um destemido conjunto algarvio, que ia fazendo sensação na Liga sob as ordens de Jorge Costa e sob a capacidade goleadora de um veterano avançado brasileiro, que acabaria por se tornar numa das maiores referências da história do Olhanense.

“Ainda hoje tenho esse jogo no meu telemóvel”, conta Djalmir ao Bancada. "Ficou para sempre gravado na minha memória. Foi uma bela exibição do Olhanense ainda por cima na casa de um grande. Fizemos dois golos na primeira parte e só dava mesmo Olhanense. Lembro-me que a primeira parte terminou com os adeptos a assobiarem a equipa do FC Porto, pois ninguém contava com aquele cenário. E não era um FC Porto qualquer, tinha o Helton, o Hulk, o Falcão, o Bruno Alves, o Álvaro Pereira e aquele careca que agora joga no Galatasarary [Maicon]. Se não fosse o Guarín com um golo aos 90+4 tínhamos ganho o jogo", sublinha.

Oito anos passaram e Djalmir, agora com 42 anos, voltou aos relvados no sentido de ajudar o clube “do coração”, nesta altura no Campeonato de Portugal, envolto numa grave crise. O avançado brasileiro mais português de Olhão, natural de Aracajú, capital do estado de Sergipe, na costa nordeste do Brasil, participou no triunfo da equipa dirigida por Ivo Soares sobre o Sacavenense, por 2-1, resultado que permitiu ao Olhanense subir ao oitavo lugar da série D com 12 pontos, a sete do líder Amora FC, correspondentes a três vitórias, três empates e duas derrotas. Para trás das costas ficaram cinco anos de afastamento dos relvados. Porquê, então, regressar agora? Djalmir explica.

“Na verdade, o meu regresso tinha por objetivo ficar na retaguarda da equipa, seria um apoio mais externo, mas como estamos passando por dificuldades convidaram-me para treinar, o míster gostou e cá estou. Este não era o meu primeiro objetivo. Já tinha terminado a carreira porque o que queria era trabalhar fora das quatro linhas e arranjar investidores para a SAD. Não foi possível e, regressar aos relvados, foi uma das maneiras que encontrei para ajudar o Olhanense. Só quero ajudar. Gosto muito deste clube e as pessoas gostam muito de mim. É um sentimento sincero, muito intenso."

Apesar de afastado do futebol há cinco anos, Djalmir não parou. Tirou uma licenciatura em Desporto, fez uma pós-gradução em futebol, praticou futevólei e participou em vários torneios até que recebeu um convite do… Almancilense para voltar aos relvados. Comunicou o sucedido a Luís Torres, responsável pela SAD dos rubros-negros, e não teve outro remédio senão recusar. “'Se é para jogares, jogas no Olhanense', disse-me o Luís. E assim foi. Estou a treinar no duro há cinco semanas e estou a sentir-me bem. Já fiz a minha pré-temporada.” E como foi o regresso aos relvados? “Joguei pouco tempo mas já deu para sentir aquela adrenalina e o carinho dos adeptos, que sempre foram fora do comum. Gostam de mim e eu gosto muito deles”, refere ao Bancada.

Djalmir está nitidamente feliz por voltar a jogar. Sabe que a idade já não lhe permite ter a frescura de outros tempos, mas acredita que o faro que (ainda) tem pelo golo poderá ser útil ao histórico algarvio. “Quem marca golos, não esquece. É algo de instintivo. Ainda sinto o aroma do golo. Vamos ver se ainda consigo fazer alguns.”

A alegria do cheiro dos relvados contrasta com a tristeza pelo momento vivido pelo Olhanense, mergulhado numa grave crise. Djalmir não esconde que tem o sonho de ser presidente do clube que aprendeu a amar, mas sublinha que a conjuntura não é nada fácil. “Candidatar-me à presidência é um sonho. Tenho a confiança dos adeptos, mas o Olhanense atravessa uma crise financeira muito grande. Hoje, o Olhanense não tem a galinha dos ovos de ouro que é o futebol, uma vez que a sociedade desportiva foi vendida aos italianos. É muito complicada a situação do clube. Para ser candidato, tenho de perceber a dívida real do clube, tem de ser tudo bem conferido, saber o que se tem de pagar. Neste momento, a única coisa que temos é o estádio. Tínhamos vários patrimónios mas tudo foi queimado. Neste momento, temos praticamente zero. Se houver condições e sentir que tenho o apoio de pessoas importantes posso candidatar-me, mas preciso de quem me apoie. Este é o momento para as pessoas de Olhão se unirem em volta do clube. Eu estou a tentar fazer uma parte. Espero que o meu regresso ajude a fazer com que as pessoas voltem a acreditar no Olhanense. Muitas estão afastadas porque foram mal tratadas, principalmente nos últimos anos.”

As eleições têm lugar no próximo ano e Djalmir alerta para a necessidade de uma solução sob pena de o clube poder, inclusive, acabar. “Tenho o sonho de ser presidente deste clube. Só que hoje o Olhanense, como disse, passa por dificuldades financeiras enormes e esta questão tem de ser resolvida urgentemente, caso contrário o clube poderá ter um fim drástico. É preciso que este emblema centenário volte ao lugar que lhe pertence no desporto português. Enquanto não chegam as eleições, eu ajudo como posso, a jogar, e no balneário, apoiando a equipa a todo o momento.”

O revolucionário e exigente Sérgio Conceição

São mais de 150 jogos, seis dezenas de golos com a camisola do Olhanense. No Algarve, Djalmir conviveu com muitos treinadores, entre os quais Sérgio Conceição, que começou a carreira de técnico principal precisamente em Olhão. “Via-se logo na altura que tinha enorme potencial”, lembra Djalmir, acrescentando: “Fez muitas exigências para melhorar a equipa, para mudar e revolucionar  o clube, mas o Olhanense não tinha meios para lhe oferecer tudo o que pretendia. No entanto, já se percebia que ia ser um grande treinador e que ia crescer com a cobrança inerente ao mundo do futebol.”

“Com ele”, recorda o veterano avançado, “não havia brincadeira nos treinos, pois trabalho era trabalho. O Sérgio sabe como ter um grupo na mão, foi campeão no FC Porto e está no lugar que merece.”

Foi, aliás, com Sérgio Conceição que Djalmir encerrou, numa primeira fase, a carreira de jogador, passando a diretor desportivo. "O Sérgio exigiu que eu passasse a diretor. A nível de trabalho, é cinco estrelas, sempre muito focado e organizado no dia-a-dia.”

Um virar de século emblemático

Djalmir chegou a Portugal na viragem do século, oriundo do Cascavel com destino ao Famalicão. Logo na época de estreia apontou 18 golos em 30 jogos, despertando o interesse do Belenenses. Fez duas temporadas no Restelo sem o fulgor inicial efetuando quatro remates certeiros em 27 desafios. Em 2003/04 rumou a Vidal Pinheiro. Realizou uma época com a camisola do Salgueiros, correspondente a 30 jogos e meia dúzia de golos, após o que rumou ao Feirense. Esteve em Santa Maria da Feira de 2004 a 2006, período durante o qual marcou presença em  56 jogos, tendo apontado 19 golos.

Foi então, em 2006/07, que descobriu o clube da sua vida em Portugal. Esteve em Olhão durante sete temporadas consecutivas ao longo das quais completou exatamente 150 jogos, tendo feito o gosto ao pé (e à cabeça) por 60 ocasiões. Em 2008/09 sagrou-se o rei dos golos da segunda liga, com 23 remates certeiros, contribuindo de forma decisiva para a subida de divisão do Olhanense.

O bis apontado em pleno Dragão é o principal cartão de visita de Djalmir, mas o hábito de marcar aos grandes não se esgotou aqui. Na temporada 2010/11, garantiu um empate ao Olhanense frente ao Benfica com um golo de cabeça obtido aos 90+4, antecipando-se a Roberto, depois de Franco Jara ter colocado os encarnados na frente do marcador logo ao minuto 4. Jorge Jesus era o treinador do clube da Luz, enquanto do lado dos algarvios estava Jorge Costa. O último golo apontado pelo avançado brasileiro com a camisola do Olhanense teve lugar a 22 de abril de 2013, num jogo em que os algarvios acabaram por perder em casa (2-1) diante do Vitória SC.

Foi nessa época, 2012/13, que Djalmir decidiu encerrar a carreira mas está agora de volta, em 2018/19. Aos 42 anos, já fez um jogo, Faltam os golos…