Grande Futebol
Yaya Touré e a aversão de Guardiola por africanos. Será mesmo assim?
2018-06-05 14:50:00
As conclusões não são inequívocas, mas há tendências que permitem desconfiar da teoria de Touré.

Yaya Touré diz que Pep Guardiola tem um problema com jogadores africanos. Será assim? Fomos ver quantos jogadores africanos passaram pelas mãos do treinador espanhol, como foi a relação com Pep e ver se, de facto, Guardiola evita ter jogadores africanos nos seus plantéis, tendo menos africanos do que as restantes equipas de topo. As conclusões não são inequívocas, mas há tendências que permitem desconfiar da teoria de Touré, que considera que "talvez os africanos não sejam tratados por ele como os outros atletas". "Ele finge que não tem problemas com os jogadores de cor. Nunca lhe vai cair a máscara, é demasiado inteligente", acrescenta.

Primeiro, a fotografia geral. Em nove anos de carreira, Pep Guardiola teve apenas cinco jogadores africanos nos seus plantéis. Não, não é um número impressionante, o que permite corroborar a teoria de Touré. E atenção: contámos apenas verdadeiros africanos. Jogadores de origem africana, mas nascidos e formados já na Europa não contam.

Yaya Touré, Eto’o e Seydou Keita jogaram para Guardiola em Barcelona, Benatia cruzou-se com o catalão em Munique e Iheanacho em Manchester. Há ainda o caso particular de Bony, que estava no plantel do City, mas… foi emprestado. Nunca jogou com Guardiola, algo que Touré também usou para sustentar a teoria.

Há ainda outro caso particular: Eto’o. O avançado camaronês também já se queixou da forma como Guardiola o tratou: "O Guardiola nunca foi um grande jogador, era apenas um bom jogador. Eu disse-lhe isso. Ele não provou nada quando chegou e disse certas coisas. Queriam mandar-me para o Uzbequistão, mas eu fiquei no meu lugar e disse ao Guardiola que se iria arrepender disso no futuro (…) o Guardiola deu a camisola 9 ao Henry. Foi uma total falta de respeito, pois eu tinha dado muito ao clube. Ele nunca teve a coragem de me dizer as coisas na cara, passava-as através dos jogadores. Se não me respeitam, eu também não os respeito".

Por outro lado, temos as declarações de Benatia, que explicou por que motivo Guardiola fala pouco com os jogadores. “Uma vez, ele explicou-me que ficou desiludido com a relação que teve com alguns jogadores em Barcelona. Por isso, disse-me: ‘eu faço apenas o meu trabalho – treinar’”.

Resumamos:
Yaya Touré: teve sucesso com Guardiola e, agora, critica-o.
Eto’o: teve sucesso com Guardiola e, agora, critica-o.
Seydou Keita: contratado por Guardiola e sempre o elogiou.
Benatia: contratado por Guardiola e mostrou-se compreensivo com a postura do técnico.
Bony: dispensado.
Iheanacho: jogou no primeiro ano, foi dispensado no segundo.

Olhar para esta “big picture” é redutor e, possivelmente, injusto para com o treinador espanhol. Importa olhar para o número de africanos que, habitualmente, as equipas de topo costumam ter, para perceber se Guardiola costuma ter muito menos africanos do que a maioria das equipas. Fomos ver as últimas três temporadas no top10 do ranking da UEFA.

Os números mostram que Guardiola costuma ter, no máximo, um africano na equipa, mas mostram também que, nas equipas de topo, a média de jogadores africanos no plantel não costuma ser muito superior a isso. O Arsenal e a Juventus são as equipas que mais se destacam, chegando, por vezes, aos três africanos por temporada.

Talvez Yaya Touré não esteja a par destes números, mas o jogador costa-marfinense foi mais longe e teve uma declaração curiosa: "No dia em que Guardiola alinhar com uma equipa com cinco jogadores africanos, não naturalizados, prometo enviar-lhe um bolo".

Como curiosidade, fomos ver também a quantidade de africanos no top10 da Liga Portuguesa.

Porquê? 

Não existe uma explicação dada por Guardiola para esta aparente aversão a jogadores africanos, mas há um motivo apontado por alguns especialistas que pode fazer sentido. O jogador africano, quando não faz formação na Europa, tem uma base tática e de conhecimento do jogo geralmente fraca. Não se tratará de incapacidade cognitiva, mas sim da falta de conhecimento providenciado pelos clubes de formação no continente africano.

Por outro lado, Guardiola aplica, nas suas equipas, um estilo de jogo que apela às movimentações, noção coletiva de defesa e, por vezes, até inovações táticas (quem não se lembra de ver Lahm e Alaba, laterais, a participarem na primeira fase de construção quase como médios-centro?).

Posto isto, o perfil do jogador africano – forte fisicamente, forte na condução de bola e não tão forte taticamente – não é o típico modelo que encaixe nas ideias de Guardiola, que prefere artistas conhecedores do jogo e fortes no futebol de posse e passe.

É verdade, Gaurdiola não usa muitos africanos. Mas também é verdade que, nas equipas de topo, a percentagem de africanos não costuma ser muito grande.

Já houve quem assumisse isto

A polémica em torno dos jogadores africanos não é nova. Touré diz que Guardiola não os aprecia e que até lhes falta ao respeito, mas, há meses, um dirigente do West Ham assumiu-o sem qualquer problema.

Em fevereiro, Tony Henry terá escrito um e-mail a outro dirigente do clube, dizendo que “não queremos mais africanos”. Questionado, mais tarde, pela imprensa inglesa, Henry foi inconsistente na resposta, mas acabou por assumir a atual aversão à contratação de africanos para o clube londrino.

“Tivemos três e sentimos que não queremos mais jogadores africanos”, começou por dizer, antes de questionado acerca das razões: “Não há nenhuma razão. Não é por racismo. É apenas porque eles têm uma má atitude. Tivemos problemas com o Sakho, por exemplo. Percebemos que quando eles não estão no onze, causam o caos. Mas não é nada contra a raça africana”.

Tony Henry acabou, evidentemente, por ser despedido.