Grande Futebol
O estranho caso de Amr Warda: da dispensa no Feirense à liderança da Liga grega
2017-10-31 16:55:00
Egípcio aterrou em Portugal no defeso, saiu dias depois e, volvidas algumas semanas, é já uma das sensações na Grécia

Chegou a Portugal no dia 8 de agosto, sendo anunciado como reforço do Feirense com expectativas altas à mistura. Mas Amr Warda ficou por cá menos de uma semana. O empréstimo terminou de forma precoce, após uma situação que fez correr muita tinta na imprensa, mas que nunca foi oficialmente esclarecida pelo clube nortenho. Warda regressou à base e o PAOK voltou a emprestá-lo. Desta vez ao Atromitos. Curiosamente, cerca de dois meses depois, está a ser uma das surpresas da Liga grega, ajudando o “modesto” clube de Atenas a alcançar a surpreendente liderança do campeonato. Talento parece, por isso, não ser o problema do atacante egípcio.

A imprensa desportiva portuguesa falou num suposto caso de indisciplina, que envolvia um eventual assédio a mulheres de companheiros de equipa. Dessa forma, o clube terá decidido afastar o jogador dos treinos em “prol do grupo”, segundo escreveu o jornal “Record” quatro dias depois da oficialização da chegada do jogador. Warda ainda fez um desmentido sobre o caso nas redes sociais, garantindo que tudo não passava de “alegações falsas e feias”, mas, a verdade, é que regressou mesmo à Grécia, sem que o Feirense o anunciasse oficialmente. Contactado pelo Bancada, o clube continua a rejeitar tomar uma posição oficial sobre o sucedido com Warda.

Devido ao atribulado arranque de temporada, Warda apenas começou a jogar no Atromitos à terceira jornada. Foi logo titular e, desde então, nunca mais perdeu esse estatuto. Em sete jornadas ajudou o Atromitos a alcançar dois empates e cinco triunfos – a antiga equipa de Sá Pinto continua invicta na Liga, sendo que vai numa série de cinco vitórias seguidas. O internacional egípcio apontou já dois golos - mais um na Taça - e fez três assistências. Um dos golos foi obtido este domingo, no triunfo por 2-0 no terreno do Xanthi, que ajudou a manter a liderança inesperada da equipa que terminou a última época no oitavo posto.

No entanto, o percurso de Warda não tem sido estável. Se a situação em Santa Maria da Feira terá sido polémica, também não é muito compreensível a forma como o PAOK abdicou do atacante. Foi contratado em dezembro passado ao Panetolikos e pegou de estaca na equipa. Entre jogos no campeonato e na Liga Europa, fez dois golos e algumas assistências, ajudando o clube de Salónica a terminar a fase regular no segundo posto, conquistando posteriormente o acesso à Liga Europa. No entanto, nem isso foi suficiente para permanecer no PAOK, que agora vê o jogador brilhar num rival – o PAOK segue no segundo posto do campeonato, a um ponto do Atromitos.

Descoberto por um português

Quem conhece Warda de perto garante que o atacante egípcio poderia ter sido uma das sensações da Liga e que nunca existiu qualquer tipo de problemas entre ambos. “Nunca teve problemas comigo. No entanto, encontrei-o numa fase em que ele veio muito mais tímido, porque tinha acabado de sair do Egito e ainda trazia uma cultura e um conjunto de valores completamente distintos. Teve de ter capacidade de adaptar-se a uma vida distinta. Essa adaptação demorou o seu tempo, mas penso que agora já está adaptado. Não sei muito bem o que se passou, mas não consigo associá-lo ao tipo de problemas de que se falaram”, frisa Leonel Pontes, técnico que em 2015/16 o contratou para o Panetolikos.

“Vi o Warda quando ele jogava no Al-Ittihad Alexandria, através de um vídeo, e adorei. Precisávamos de um número 10, que jogasse como médio de ataque ou pela ala. Era tecnicamente evoluído e tinha uma relação muito boa com a bola. Tinha capacidade de desequilíbrio no um para um, era bom no passe para golo e também na finalização. Colocava algum brilhantismo no jogo, acrescentava algo artístico, gostava de adornar os lances e criar situações de desequilíbrio sozinho e assumir o jogo em ataque apoiado, mas também era muito forte em contra-ataque, na progressão com bola. Mostrava todas essas características no vídeo, mas era um vídeo e nunca sabemos o que pode sair dali”, relembra o técnico português, de 45 anos.

A primeira experiência europeia começou da melhor forma. Warda chegou viu e venceu. “Posteriormente informei-me sobre o jogador. Ele tinha ambição de vir para a Europa, acreditava que no Egito não tinha o espaço ideal. Conseguimos trazê-lo para o Panetolikos e comigo jogou sempre, à exceção de um jogo em que teve uma lesão. Inclusive chegou a uma segunda-feira e jogou ao sábado contra o Panathinaikos. Correspondeu às expectativas e ao que tinha visto no vídeo. Acredito que com regularidade e numa equipa melhor pode ser melhor jogador e pode fazer uma boa carreira”, confessa-nos Leonel Pontes.

“Foi à conta do rendimento que teve no Panetolikos que foi chamado à seleção do Egito, com o Hector Cúper, que acredita nele”, conta Pontes. Apesar do arranque positivo a nível individual, a ligação entre ambos terminou cedo. O técnico português foi despedido à quinta jornada, numa altura em que o clube ocupava o quinto posto. Tudo por culpa de uma derrota por 5-1 no terreno do Kalloni FC, na tal partida em que Warda ficou no banco por problemas físicos. Mas a ligação manteve-se fora das quatro linhas. “Até foi ele que depois me indicou para treinador do Al-Ittihad Alexandria e fui para lá. Também falei com ele várias vezes quando veio para Portugal. Lamentavelmente não ficou. Estava muito curioso para perceber a evolução dele cá. Acabou por voltar para o Atromitos e está a fazer um bom campeonato. Tenho seguido com atenção e as coisas estão a correr-lhe bem”, sublinha.

Leonel Pontel via em Warda potencial para vingar na Liga portuguesa, até num patamar superior. “Poderia ser um jogador sensação em Portugal, porque a fase de adaptação à Europa já estava feita. Ele teve um ano no Panetolikos e depois foi para o PAOK. Fez muitos jogos, alguns golos e assistências. Acredito que numa equipa de meio da tabela, como o Feirense, poderia fazer uma boa época. Mas acredito ainda que ele poderia ser um jogador um pouco mais acima. Precisava desse patamar de crescimento, num Vitória de Guimarães, SC Braga ou Rio Ave, por exemplo, para exponenciar todas essas qualidades, principalmente por estar inserido num contexto com melhores jogadores”, conclui o técnico madeirense.