Grande Futebol
O conto de fadas mais contestado da história dos Mundiais
2018-06-14 19:05:00
A Coreia do Sul não tem muita história em Campeonatos do Mundo. Mas a que tem é famosa

O Mundial de 2002 não é de boa memória para os portugueses. A Seleção Nacional foi eliminada na fase de grupos e disse adeus à competição bem cedo. Uma das seleções que trouxe pesadelos a Portugal foi a Coreia do Sul, que organizava a prova em conjunto com o Japão. No último e decisivo encontro da fase de grupos, os asiáticos bateram os lusitanos por 1-0 graças ao golo de Park Ji-sung, antigo jogador do Manchester United. Essa foi também a famosa partida em que João Vieira Pinto foi expulso depois de agredir o árbitro argentino Ángel Sánchez, deixando Portugal com um jogador a menos. Aos 66', Beto também foi para a rua e pouco depois Vítor Baía sofreu o tento que levantou um país e deitou outro ao chão.

Mas não estamos aqui para falar de Portugal, mas sim da Coreia do Sul, que foi a grande sensação desse Mundial de 2002 a par com a Turquia. Antes do triunfo sobre Portugal, já a Coreia do Sul havia batido a Polónia por 2-0 e empatado com os Estados Unidos da América a um golo, o que permitiu que a equipa então orientada pelo holandês Guus Hiddink terminasse a fase de grupos num fabuloso primeiro lugar e se qualificasse para as rondas a eliminar pela primeira vez na história. Até aqui, era 'só' um conto de fadas como aqueles que, felizmente, acontecem de vez em quando no mundo do futebol. E, como quase todos os adeptos gostam de ver os 'underdogs' a escalarem montanhas de uma inclinação elevada, os coreanos estavam no paraíso.

Contudo, a história mudou logo a seguir. Contra uma Itália cheia de estrelas (Buffon, Maldini, Zanetti, Del Piero, Totti, Vieri, Gattuso, Cannavaro, Nesta, Materazzi ou Inzaghi eram algumas delas), a Coreia do Sul venceu graças ao golo de ouro de Ahn Jung-hwan aos 119'. Podia ter sido 'apenas' mais uma vitória épica da Coreia do Sul, mas não. Com uma tática 3x4x3, os coreanos adotaram uma estratégia de pressão muito agressiva e dura, o que não impediu a Itália de se adiantar no marcador aos 18' por intermédio de Vieri, mas que serviu para incomodar e de que maneira os transalpinos, que começavam a não gostar de ver a impunidade dos adversários. O árbitro Byron Moreno, do Equador, fechou os olhos a muitas entradas duras que impediam a seleção de Giovanni Trapattoni de poder jogar o futebol pretendido. Não haveria problema se a Coreia do Sul fizesse isso dentro das leis, mas não foi isso que se viu. A Coreia do Sul, claramente beneficiada pela equipa de arbitragem, conseguiu chegar ao empate aos 88' com golo de Seol Ki-hyeon, levando o jogo para tempo extra que seria terminado com um golo de ouro.

Entre as razões de queixa da Itália encontra-se a expulsão de Totti por alegada simulação, o golo mal anulado a Damiano Tommasi, a entrada de Choi Jin-cheul sobre Zambrotta ou a cotovelada de Kim Tae-young a Del Piero. Estas duas últimas saíram completamente impunes e a Coreia do Sul marcou o 2-1 final. A revolta italiana foi grande e os europeus não tiveram problemas em dizer que os grandes responsáveis pelo resultado foram o árbitro e os respetivos assistentes. Começaram, também, a surgir as primeiras suspeitas de corrupção em relação à prestação da Coreia do Sul no Mundial.

Tais suspeitas ganharam mais tempo de vida logo a seguir. Nos quartos-de-final, a Coreia do Sul apanhou a Espanha de Casillas, Puyol, Hierro, Morientes, Xavi ou Raúl e voltou a vencer, desta feita no desempate por pontapés de penálti depois do nulo prevalecer em 120 minutos. A polémica, ainda assim, voltou a ser o maior destaque, visto que o árbitro egípcio Gamal Al-Ghandour anulou dois golos aparentemente limpos aos espanhóis. A revolta espanhola foi semelhante à italiana e ainda hoje, 16 anos depois, há quem tenha a certeza que a Coreia do Sul chegou onde chegou graças a corrupção. Eliminados pela Alemanha nas meias-finais, os coreanos viraram heróis no seu país depois de alimentarem um sonho de um povo quase até ao fim. Povo esse que, ao contrário dos derrotados, pouco ou nada se importa que os resultados tenham sido comprados ou não.

Sérgio Conceição de rastos no jogo entre Portugal e Coreia do Norte que ditou o afastamento lusitano do Mundial 2002 (Christophe Simon/EPA)

PERCURSO RUMO AO RÚSSIA 2018

A Coreia do Sul teve duas fases na qualificação. Na primeira, dominou com facilidade um grupo com Líbano, Kuwait, Mianmar e Laos, vencendo todas as sete partidas com 24 golos marcados e nenhum sofrido. A seguir, contudo, foi mais complicado. A equipa calhou no mesmo grupo que Irão, Síria, Usbequistão, China e Catar e qualificou-se na segunda posição com 15 pontos, apenas mais dois que Síria e Usbequistão e mais três que a formação chinesa. O selecionador Uli Stielike foi despedido depois de uma derrota com o Catar, o que fez com que Shin Tae-yong assumisse o cargo e assegurasse o apuramento direto para o Mundial.

JOGADOR A SEGUIR: Lee Jae-sung

Son Heung-min, avançado que brilha no Tottenham e na Liga Inglesa, é a grande estrela da equipa, pelo que ninguém deve ficar surpreendido com o talento que pode demonstrar na Rússia. Menos famoso é Lee Jae-sung, médio do Jeonbuk Hyundai Motors, clube que atua na Liga da Coreia do Sul. Aos 25 anos, Lee Jae-sung está habituado a ganhar títulos na Ásia e destaca-se pela criatividade e pela capacidade técnica. Tem alguns golos pelo clube e pela seleção, mas esse não é o seu forte. Se, como a maioria dos portugueses, não é grande conhecedor do futebol sul-coreano, fique atento às exibições deste jogador.

CONVOCADOS

Guarda-redes: Kim Seung-gyu (Vissel Kobe/Japão), Kim Jin-hyeon (Cerezo Osaka/Japão) e Cho Hyun-woo (Daegu FC/Coreia do Sul).

Defesas: Kim young-gwon (Guangzhou Evergrande/China), Jang Hyun-soo (FC Tokyo/Japão), Jung Seung-hyun (Sagan Tosu/Japão), Yun Yong-sun (Seongnam FC/Coreia do Sul), Oh Ban-suk (Jeju United/Coreia do Sul), Kim Min-woo (Sangju Sangmu/Coreia do Sul), Park Joo-ho (Ulsan Hyundai/Coreia do Sul), Hong Chul (Sangju Sangmu/Coreia do Sul), Go Yo-han (FC Seoul/Coreia do Sul), Lee Yong (Jeonbuk Hyundai Motors/Coreia do Sul).

Médios: Ki Sung-yueng (Swansea City/País de Gales), Jung Woo-young (Vissel Kobe/Japão), Ju Se-jong (Asan Mugunghwa FC/Coreia do Sul), Koo Ja-cheol (FC Augsburgo/Alemanha), Lee Jae-sung (Jeonbuk Hyundai Motors/Coreia do Sul), Lee Seung-woo (Hellas Verona/Itália), Moon Seon-min (Incheon United/Coreia do Sul).

Avançados: Kim Shin-wook (Jeonbuk Hyundai Motors/Coreia do Sul), Son Heung-min (Tottenham/Inglaterra), Hwang Hee-chan (Red Bull Salzburgo/Áustria).

ONZE PROVÁVEL

Treinador: Shin Tae-yong

GUIA BANCADA: O MUNDIAL EM HISTÓRIAS

Grupo A

Rússia: O dia em que Rússia boicotou e "roubou" a Ucrânia para jogar o Mundial
Arábia Saudita: A lenda do "Pelé do Deserto", o terror de Setúbal
Egito: O futebol nascido de uma tragédia
Uruguai: Uruguai quer fazer um Maracanazo. Ou um Maracanazov

Grupo B

Portugal: Portugal, toca a jogar pelo chão que, de “Saltillos”, já foi suficiente
Espanha: O dia em que o General Franco teve medo dos russos e tirou um título à Espanha
Marrocos: "África minha" de Hervé Renard tem novo capítulo em Marrocos
Irão: Carlos Queiroz e o Irão: uma relação de amor e ódio

Grupo C

França: Didier Deschamps, o capitão da saga de 1998 em busca da redenção como treinador
Austrália: Um continente pequeno demais para uma seleção
Perú: O amor que os brasileiros ganharam ao Peru e a Cubillas, com a Argentina no meio
Dinamarca: Elkjaer fumava e bebia, mas corria que se fartava

Grupo D

Argentina: O dia em que Deus deu a mão para Maradona ficar na história do futebol
Islândia: Islândia e a aritmética que permite escolher os 23 convocados
Croácia: Quando Boban e Suker viraram heróis de uma nação
Nigéria: Yekini, um lugar na história da Nigéria e no coração dos portugueses

Grupo E

Brasil: Marinho Peres: capitão, desertor e um sonho que virou pesadelo em Barcelona
Suíça: Uma reunião de lendas, duas batalhas épicas e um capitão a jogar com um tumor
Costa Rica: No país mais feliz do Mundo, há um Oásis onde só entram grandes guarda redes
Sérvia: Um goleador esquecido pelo tempo, ídolo de Puskas e um jogo que tudo mudou

Grupo F

Alemanha: O jogo mais tenso de sempre. O jogo de dois vencedores. O jogo do futebol
México: Negrete marcou o melhor golo do Mundo e veio para o Sporting, pena os relvados
Suécia: Brolin, o sueco da pirueta que fez birra na Premier League porque lhe mentiram
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