Grande Futebol
Ndidi foi da miséria ao topo, chamando-se... “dádiva de Deus”
2018-04-23 18:00:00
Com toda esta humildade, qualidade, juventude e disponibilidade para aprender, Ndidi tem o Mundo à frente.

Onyinye Wilfred Ndidi. Se segue o futebol inglês, certamente conhece este “polvo” nigeriano. Aos 21 anos, o médio do Leicester já é um dos melhores médios defensivos do futebol europeu e vai estar no Mundial 2018. Olho nele, que o rapaz é bom. Aliás, nem o nome engana. Já lá vamos. A isso e à mania de ajudar, que deu um belo relato, em Inglaterra, e ao primeiro agradecimento de sempre.

Ndidi é o líder em interceções de bola, na Liga Inglesa, e é o esteio da temporada confortável do Leicester. Tem contrato até 2022, mas, dizemos nós, dificilmente esse vínculo será cumprido. Dizemo-lo por três motivos: 1- Falando curto e grosso, Ndidi é craque. 2- Há vários tubarões europeus carenciados de alguém que, sozinho, “coma” toda a zona defensiva do meio campo. 3- Tanta qualidade, com apenas 21 anos, é um “docinho”.

Dádiva de Deus

No dialeto do povo Igbo, nativo sobretudo da Nigéria, Onyinye, primeiro nome de Ndidi, significa “dádiva de Deus”. Não há dúvidas que este rapaz recebeu uma dádiva, seja de quem tenha sido. Nascido em Lagos, capital nigeriana, no sul do país, Ndidi subiu a pulso.

Ao site “Joe”, o jovem nigeriano conta que, ainda na Nigéria, tinha condições de vida muito precárias. Mas o futebol, ainda assim, nunca faltou. “Não tinha uma bola para jogar, por isso ia buscar papéis e fita cola e colava-os em forma de bola”, conta, explicando que, como tantos outros jovens “futeboleiros”, teve de ultrapassar a intransigência de uns pais desagradados pela obsessão do filho com o futebol. Primeiro, estudar. Depois, jogar. Na Nigéria, Ndidi juntou as duas coisas, numa Academia.

Ndidi, em 2013, no Mundial sub-20

Um dia, 40 equipas competiam num torneio na Nigéria, no qual estavam olheiros de alguns clubes europeus. No meio de mais de 500 jovens, o que mais deu nas vistas foi um defesa alto, de 16 anos, que dava cabo de calmeirões com muitos anos de futebol sénior. Um olheiro do Genk, da Bélgica, pescou aquele peixe miúdo, mas que prometia ser peixe graúdo.

O rapaz lá foi fazer testes à Bélgica e falhou nos desafios de passe e drible. “Os truques e os dribles não são para mim. Tento fazer o que é útil na minha posição e não o que parece mais bonito”, reconhece Ndidi que, no entanto, impressionou na mesma.

“Ele era intratável na recuperação de bola. Aquelas pernas longas estavam em todo o lado, tipo um polvo”, recorda Domenico Olivieri, responsável do Genk por observar aquele talento. “Ele foi logo integrado no grupo, mostrou-se aberto a conselhos e a ética de trabalho era irrepreensível”, acrescenta.

 “É típico dele”

Como o Genk não podia assinar contrato com aquele sub-18, Ndidi voltou à Nigéria, mas sem saber que, pouco tempo depois, voltaria mesmo ao nordeste belga, para ser jogador do clube.

Passado um mês, Ndidi foi… Ndidi. “Ele ainda nem sabia que nós lhe daríamos o contrato, mas mesmo assim ligou-me para me agradecer. Foi o primeiro jogador à experiência que me ligou a agradecer”, garante Olivieri.

Chegado ao Genk, que pagou cerca de 90 mil euros ao Nath Boys, da Nigéria, Ndidi, central, virou médio defensivo. Milinkovic-Savic tinha saído para a Lazio e o treinador do Genk precisava de um novo médio. “Podes ser um guardião perfeito para a defesa e dar equilíbrio à equipa”, disseram a Ndidi.

Com uma temporada e meia de Genk, veio o Leicester, ansioso por conseguir uma cópia de N’Golo Kanté, que saiu para o Chelsea. Cerca de 17 milhões de euros foi o que lucrou o Genk, que tinha gasto apenas 90 mil euros com aquele projeto nigeriano.

Um projeto que já não é projeto, mas sim um craque à espera que um tubarão lhe pegue. Mas, se não pegar, também não deve preocupar muito Ndidi que, com humildade, garante que sabe de onde veio e que não se ilude. E avalia até o que lhe falta: "Tenho de melhorar na distribuição de jogo e na chegada ao último terço do campo". Lá está, os tais problemas de passe que quase o entalaram naquele teste no Genk.

Ndidi é tão simples e tão afável que a própria reportagem do site “Joe” começou… antes de começar. Deixemos o relato como o jornalista britânico o fez.

“Depois do treino, Ndidi estava a vir para a entrevista, no complexo do Leicester, e viu um fotógrafo com dificuldades em mover o equipamento da entrada principal. Tal como faz no campo, onde ajuda a resolver problemas, ele identificou um potencial problema e resolveu-o, pegando logo num tripé, movendo-o. ‘É típico de Ndidi’, disseram-nos. Muitas vezes, é antes da entrevista que ficamos a conhecer o entrevistado. As suas ações podem dizer mais do que as respostas”.

Com toda esta humildade, qualidade, juventude e disponibilidade para aprender, Ndidi tem o Mundo à frente.