Grande Futebol
Diário de um jornalista no Mundial (4)
2018-06-18 13:00:00
António Tadeia vai publicar todos os dias uma entrada neste diário, sempre pelas 13h

O quarto dia de Mundial foi um dia cheio de contradições. Estou em Lisboa, pude ver mais jogos e vê-los com mais atenção do que o faria se estivesse num estádio, entre diretos, à espera da entrada em campo de Portugal, pelo que este foi um dia de avaliar futebol. E de ver mais dois candidatos ao título, como o Brasil e a Alemanha. Que não ganharam.

As coisas não são sempre o que parecem e tudo nos três jogos de ontem o demonstra. Vejam o caso do Brasil. Vinte minutos muito bons, com troca de passes e de posições, com situações de envolvimento sucessivas, a culminarem no golo de Coutinho, provavelmente o melhor que o Mundial viu até agora. E depois a tentação do controlo. O recuo, o arrumar da ambição numa gaveta e o convite à Suíça que jogasse também. É verdade que o golo do empate suíço podia ter sido anulado, porque há um empurrão de Zuber em Miranda, ou que Neymar foi o jogador mais castigado com faltas num jogo do Mundial em 20 anos (foram dez!), mas isso não chegou para que os brasileiros se revissem nas ferozes críticas de Galvão Bueno, o mítico narrador dos jogos do escrete, à equipa de arbitragem. As redes sociais encheram-se de críticas a essa visão tão própria de um país como Portugal, porque o Brasil, pô, é o Brasil. Tem de ganhar, mas tem de jogar mais do que fez nos 70 minutos depois de se ter colocado em vantagem. E aí a cobrança não vai em direção ao árbitro mas sim para Tite, o tal selecionador que na luta (que começou em 1978, com Cláudio Coutinho) entre a influência da criatividade criola e do rigor europeu puxou o ponteiro outra vez para o lado europeísta. É verdade que os últimos dois escretes campeões (1994 e 2002) eram mais europeus que criolos, mas tanto um como o outro tinham uma mega-estrela (Romário primeiro, Ronaldo depois) que Neymar não soube ser. E que, a julgar pela forma como chegou a mancar no jogo inaugural, talvez não consiga ser este ano.

As contradições, porém, tinham começado mais cedo, logo no Sérvia-Costa Rica, que comentei em direto com o Alexandre Albuquerque, na RTP1. Os costa-riquenhos são o que sempre se soube que eram, uma equipa que tenta controlar o jogo sem bola, à espera de uma oportunidade de magoar o adversário. A Sérvia, porém, começou muito aquém daquilo que pode ser. Tal como o Brasil, a Sérvia tem muito talento. E tal como o Brasil vive a ouvir que tem de o controlar, de o disciplinar. O resultado foi uma equipa presa, amarrada, dividida entre o que lhe está na natureza (criação) e o que tentam incutir-lhe (rigor). Valeu que após o intervalo os jogadores se soltaram: os laterais passaram a subir, Matic deixou de ficar lá atrás, ao lado de Milivojevic, e os desquilíbrios sempre apareceram. Sem eles, estou convencido de que a Costa Rica acabaria por ganhar o jogo.

Vi pior o Alemanha-México, porque estive em estúdio após o final do Sérvia-Costa Rica, a presenciar a estreia do José Pedro Teixeira como comentador. O Zé Pedro, que é um dos segredos mais bem guardados do programa da Liga dos Campeões da RTP, saiu dos bastidores e em boa hora o fez: mostrou-se sempre seguro, sabedor, assertivo. Ambos nos enganámos acerca da Alemanha, no entanto. Mas aos alemães voltarei noutra ocasião.