Opinião
A Justiça chegou ao futebol, doa a quem doer
2018-09-13 14:00:00

A ideia de que os ricos e poderosos estão a salvo e conseguem escapar a tudo, uma ideia que durante muitos anos fez escola em Portugal parece finalmente estar a cair em desuso. Aqui e ali eles começam a ser escrutinados e objeto de investigação séria. Se a Justiça agiu assim nos últimos anos contra altos responsáveis políticos e da banca porque razão o futebol teria de continuar a gozar de impunidade.

Sauda-se, por isso, a operação desencadeada pelo Ministério Púbico que visa o Benfica no processo E-Toupeira e o Sporting no caso Cashball, se for deduzida acusação ao clube leonino naquele processo. Assim como, noutro plano, a recente decisão, inédita, do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol em punir o Benfica, o SC Braga e o FC Paços de Ferreira com um jogo à porta fechada por mau comportamento dos adeptos.

As coisas estão a mexer. E a mudar. Depois de muitos anos de inoperância, a Justiça começa a chegar ao futebol. Começa-se a investigar quem gozava do estatuto de estar sempre a salvo de qualquer investigação. Sem olhar a cores clubisticas e a interesses dominantes. Como deve ser. Um bom sinal que, infelizmente os clubes ainda não acompanham. Reagem como virgens ofendidas, tecem teorias da conspiração como se o mundo estivesse todo contra eles, defendem quase sempre o indefensável e optam pela fuga para a frente em vez de corrigirem comportamentos desviantes da verdade desportiva. Estou em crer que com a chegada de novos gestores ao futebol, mais jovens e mais bem preparados as coisas vão melhorar e um dos maiores flagelos não só do futebol mas da sociedade em geral, a corrupção, começará a ser devidamente atacada.

Em entrevista ao jornal O Jogo, José Manuel Meirim colocou o dedo na ferida. "Há uma teoria de conspiração em que não se ataca, nem se critica a própria decisão. O que vem à cabeça é que num caso foi assim e noutro assado (...) Não sou como os arguidos gourmet deste país, que a primeira coisa que fazem em casos em que são arguidos é dizer: "Ai, eu durmo muito bem, estou de consciência tranquila".

A Justiça, que deve ser transversal a todas as áreas da sociedade, parece ter chegado ao futebol português. E afinal há esperança de começar-se a combater uma sensação de impunidade de que o desporto-rei tem vivido de há muito, como se de uma sociedade secreta se tratasse. Aguarda-se, porém, que tenha vindo para ficar. Doa a quem doer. E não haja medo de aplicar medidas duras, como aconteceu em Itália com o Calciocaos, em 2006, e que visava a época de 2004/05, o caso que levou à descida de divisão da Juventus e a um novo campeão. Na altura, vários clubes da elite do futebol italiano foram apanhados em escutas telefónicas na tentativa de condicionamento das equipas de arbitragem. Juventus, Milan, Fiorentina, Lazio e Reggina manteriam, através de dirigentes com altos cargos, uma relação estreia com os organismos que nomeavam os árbitros para os diversos encontros de Serie A e Serie B, manipulando, a seu favor, os nomes dos juízes escolhidos.