Visto da Bancada
Nuno Nunes (N.º 301)
2018-10-08 12:30:00

Na edição 301 do "Visto da Bancada" temos, novamente, ligação entre o futebol e a ficção. Nuno Nunes é um ator português e, ao Bancada, reconhece que, atualmente, é raro ir ao futebol. Ainda assim, recorda-nos uma história que envolve o Feirense, clube do coração. A história envolve... um buraco numa rede.

"O meu interesse por futebol resume-se ao clube do coração, o Feirense, à selecção Nacional e pouco mais. Raramente vou ver um jogo, mas era habitual, na minha infância e adolescência, acompanhar o meu pai e o meu irmão aos jogos do Feirense. Na época 88/89, o Feirense esteve na primeira divisão pela terceira vez na sua história. Tínhamos assistido a todos os jogos da época anterior e testemunhado o épico confronto com a gigante da altura, Académica de Coimbra, despromovida a disputar a zona centro da 2ª Divisão, e à frente de quem o Feirense era obrigado a classificar-se se queria ser campeão – o que veio a acontecer e deu azo à plantação do primeiro relvado natural do clube para poder jogar no escalão superior do futebol nacional. Foi então, em 1989, que a famosa equipa 100% portuguesa se preparava para descer de volta à 2ª divisão ao mesmo tempo que estava nas meias finais da Taça de Portugal e recebia o FC Porto em casa. Esse jogo foi a prolongamento após 0-0 aos 90'. Lembro-me de termos mudado para a bancada superior sul para assistirmos ao prolongamento do lado da baliza do Porto e termos visto o golo do Feirense acontecer na primeira parte. Deste golo não me lembro, mas lembro-me de olhar para o céu incrédulo por estar a ver o Feirense a ganhar ao Porto e a projectar-se no final da Taça, e de ver o Artur Jorge a levar as mãos à cabeça. Já na segunda parte do prolongamento, esta baliza passou a ser a do Feirense e nós todos, naquela bancada superior sul defendíamos com o sonho dos Davides aquele ataque esmagador dos campeões europeus. Uma bola caprichosa traiu-nos: subia verticalmente uns 10 metros depois de um chuto atacante ter feito ricochete na nossa defesa, depois é o nosso Pinto (defesa) que a corta mas ela volta a elevar-se a essa altura... de cada vez que a víamos subir, os nossos corações paravam, à espera que algum deus a soprasse para longe, mas ela insistia em cair em cima da entrada da grande área, e eis que um pontapé venenoso e enviesado a encaminhou aos raspões até à nossa baliza dando assim o empate ao Porto. A minha reação de enorme frustração foi ter dado um pontapé na rede (sim, eu estava colado à rede que separava a bancada do campo) e ter deixado nela um buraco do tamanho da minha desilusão. A dimensão surpreendente desse buraco fez-me temer ser o meu pai chamado a pagar uma indemnização ao clube, e ficou-me para sempre como um elemento agregador desta memória. Na segunda mão desta meia-final o Feirense perdeu 2-1 no estádio das Antas".