Bancada esteve com o “rei das subidas” e fez uma viagem pelo tempo. As dez promoções contadas pelo próprio
Aos 63 anos Vítor Oliveira granjeia de um estatuto ímpar no futebol português: é o treinador que mais equipas sobe ao principal escalão do futebol luso e de forma destacada. Há quem diga que passou ao lado de uma grande carreira devido às suas opções. É dos poucos, no entanto, que pode escolher ao invés de ser escolhido. Com 45 anos de futebol profissional nunca teve empresários. O Bancada fez uma viagem no tempo e lembrou cada uma das subidas de Vítor Oliveira acompanhado pelo próprio. Leia as histórias das subidas do “Cabeçudo de Matosinhos”.
–Oh cabeçudo!
-Cabeçudo?! Mas estás a falar com quem? Que confianças são essas?
Foi desta forma, seguida por um grande abraço e de um “Então pá, como estás?” que o selecionador Fernando Santos e Vítor Oliveira se cumprimentaram na Cidade do Futebol aquando de um amigável entre o Portimonense e o Guanghzou de Scolari que cumpria um estágio de pré-época nas novas instalações da FPF. Os amigos de longa data estiveram à conversa por alguns minutos, junto ao banco do Portimonense, e depois cada um seguiu à sua vida. Um, campeão europeu. Outro, o “rei das subidas”.
Por muito que tente evitar o caminho fácil já desbravado e por mais voltas que dê à minha imaginação não conseguirei nunca encontrar epíteto que assente tão bem a Vítor Oliveira. É o que é. E nestes casos temos que baixar a cabeça e aceitar as coisas como são: Vítor Oliveira é mesmo o “rei das subidas”. São dez. Mais cinco que Manuel Fernandes.
Paços Ferreira – O início de uma história sem igual
Tudo começou na época 90/91 quando comandava o Paços Ferreira e cumpria a sua terceira época como timoneiro da equipa. Era ainda um jovem. Tinha 37 anos. Lembra o mister que quando abraçou o desafio em 1988 “o objetivo era manter a equipa na 2ª divisão, nunca se pensou na subida, o clube nunca tinha chegado à 1ª divisão”. E assim foi durante as duas primeiras épocas, garantiu ao “clube o seu espaço no segundo escalão e consequentemente os objetivos foram se alterando”. Depois, começou a fazer-se história. Com 21 vitórias ao fim de 38 jornadas não só conseguiu a histórica promoção do clube da capital do móvel como se sagrou campeão da 2ºdivisão pela primeira vez.
Vítor Oliveira acompanhou o clube na sua primeira época como primodivisionário garantindo a manutenção dos Castores com um 12º lugar. Deixou o clube ao fim de quatro épocas. Nunca mais ficaria num clube tanto tempo como o que ficou à frente dos destinos do Paços Ferreira.
Vídeo: Na época de estreia do Paços na 1.ª Divisão com Vítor Oliveira a vencer o Sporting (1-0)
https://playbuffer.com/watch_video.php?v=92H3B57816NR
Académica – Uma revolução no plantel
Seguiram-se aventuras na 1ª divisão com Gil Vicente e Vitória de Guimarães até que decidiu dar um passo atrás, que o mesmo é dizer: abraçou novo projeto no segundo escalão do futebol nacional. Na época 95/96, ia já a prova na 16ª jornada, aceitou o convite da Académica de Coimbra que lutava então pela permanência na 2ª divisão de honra. Conseguido esse desiderato era tempo de trazer os estudantes de volta à 1ª divisão. Foram nove longas épocas aquelas em que a Briosa esteve longe dos principais palcos do futebol português. Foi com a subida em mente que Vítor Oliveira operou uma autêntica revolução no plantel. “Dispensámos 16 ou 17 jogadores dum plantel muito caro na altura” recorda o próprio. Os resultados foram imediatos. Para gáudio dos adeptos do histórico clube a subida consumou-se nessa mesma época – 96/97.
Vídeo: primeira derrota de uma época que viria a ser de sucesso para os estudantes
https://playbuffer.com/watch_video.php?v=D83R56RGX5YY
União de Leiria – Uma equipa muito forte
Apesar do convite dos responsáveis da Académica, Vítor Oliveira, decide não acompanhar os estudantes no regresso à 1ª divisão na temporada 97/98. Tinha como destino seguinte a cidade do Lis. A União Desportiva de Leiria no rescaldo de uma despromoção, apostava forte num rápido regresso ao escalão maior do nosso futebol. “A equipa estava realmente apetrechada, era muito forte mesmo” assegura Vítor Oliveira. Resultado: campeão da 2º divisão de honra pela segunda vez e terceira subida em pouco mais de sete anos. Igualava Fernando Vaz, Manuel de Oliveira e Pedro Gomes na lista de treinadores com mais subidas à 1º divisão nacional.
Afirma Vítor Oliveira que nunca assina contratos por mais do que um ano. Não gosta, não quer, sente que não há necessidade. “O desafogo e a tranquilidade financeira são outros quando se assinam contratos mais longos”, mas garante que “não há nada que pague o chegar ao fim da época e fazer o balanço, se ambas as partes estiverem felizes pois bem”, assina por mais um ano. Não gosta de se sentir a mais e sabe que os resultados que vai conseguindo lhe “permitem este tipo de gestão”.
-Manafá! Oh Manafá…mais responsabilidade pá! Parece que estás a jogar à bola com os amigos.
Dois minutos passaram depois do puxão de orelhas de Vítor Oliveira e Wilson Manafá pega na bola e tira um par de jogadores chineses do caminho para depois fazer um passe para o coração da área de onde um colega seu acabaria por fazer um dos golos do Portimonense no jogo treino frente ao Guanghzou na Cidade do Futebol em Oeiras.
Os Belenenses – Terceira subida consecutiva
Começa a temporada seguinte – 98/99 – no europeu Braga. Tudo corria às mil maravilhas até à pesada derrota com o eterno rival Vitória de Guimarães. 5-1 no Dom Afonso Henriques. A equipa nunca mais se encontrou, nem com as vitórias, nem com os adeptos. A decisão de abandonar acontece depois da eliminação europeia aos pés dos moscovitas do Lokomotiv. A notícia de que Vítor Oliveira estava livre foi música para os ouvidos dos responsáveis do Belenenses que procuravam na altura alguém capaz de devolver a equipa do Restelo à 1ª divisão. Substitui Manuel Cajuda à 13ª jornada com a equipa em 5º lugar poucos dias depois da eliminação na Taça de Portugal contra o modestíssimo Câmara de Lobos (0-3). Pouco mais de um mês depois de deixar o Minho, Vítor Oliveira estava de regresso à 2ª liga, agora, para orientar o clube da Cruz de Cristo. A aposta revelou-se acertada e no fim da temporada o Belenenses conseguia a promoção. A terceira consecutiva para o treinador nascido em Matosinhos.
Desta feita, lembra, “haviam condições para acompanhar a equipa”. Afirma que quando sente “que há pedras no caminho” decide sair “para não ser atingido”. Sem obstáculos guiou o Belenenses a um 12º lugar e deixa o clube estável na 1ª liga.
Vídeo: Vitória do Belenenses de Vítor Oliveira no Estádio da Luz (3-2)
https://playbuffer.com/watch_video.php?v=6BO63SYDO5AH
Leixões – De regresso a casa
Pois bem, é para Matosinhos que o quase licenciado em Engenharia Electrotécnica – abandonou no quarto e último ano da faculdade – decide regressar em 2005 para treinar o clube da sua terra. O Leixões. Foi lá que iniciou a carreira de jogador profissional em 1972. Assume novamente o desafio de promoção com a temporada 2005/2006 em andamento e falha o objetivo por dois pontos. Determinado em não desapontar quem nele apostou, Vítor Oliveira decide ficar mais uma época, constrói um plantel à sua imagem e aponta novamente à subida de divisão. 2006/2007 viu um Leixões demolidor deixando para trás dois pesos pesados – Vit. Guimarães e Rio Ave –, é campeão e festeja com as suas gentes a subida ao escalão principal do futebol português.
Vídeo: último jogo da época do Leixões
https://playbuffer.com/watch_video.php?v=58OOU819S7XX
Arouca – Nova limpeza geral
A próxima subida seria em Arouca. Vítor Oliveira aceita o convite do presidente Carlos Pinho para orientar uma equipa que cumpria a segunda época no segundo escalão do futebol português depois de uma ascensão meteórica desde os campeonatos regionais. Abraça o desafio a meio da temporada 2011/2012 com o objetivo de avaliar e construir um plantel capaz de competir pela promoção na época seguinte. “No plantel ficaram 4 ou 5 jogadores”, lembra o mister que rejeita ser um especialista em subidas mas que acredita “em planteis talhados para a 2ª liga”. E assim foi, 2012/2013 foi o epílogo do conto de fadas dos arouquenses que viam pela primeira vez o clube da sua terra chegar à divisão maior do futebol nacional.
Moreirense – “Coisas estranhas”
Na temporada seguinte (2013/2014) muda-se para Moreira de Cónegos aceitando o convite do carismático Vítor Magalhães. O Moreirense vinha de uma despromoção e quem melhor que Vítor Oliveira para devolver a equipa às lides principais do nosso futebol. “Coisas estranhas se passaram, mas ninguém pode apagar o trabalho feito” afirma o treinador sem querer entrar em detalhes: sai à 33ª jornada com a equipa nos lugares de subida e pontualmente distante dos seus perseguidores.
Vídeo: apresentação de Vítor Oliveira como treinador do Moreirense
União da Madeira – A subida menos provável
Vítor Oliveira garante que nunca pegou no telefone para se “oferecer” a ninguém e assegura que é o próprio e unicamente ele a “conduzir os processos negociais com os clubes”. Nunca teve um empresário nos quase 50 anos de carreira, como jogador e treinador. Vai mais longe ao afirmar que é feliz com o que tem e não pensa no que podia ter alcançado caso tivesse um empresário que o colocasse noutros patamares. As propostas sempre foram muitas e pouco tempo depois de deixar Moreira de Cónegos aceita uma, vinda do Arquipélago da Madeira e assina pelo União local – época 2014/2015. Relembra que “foi das subidas menos previsíveis” e que “apesar de ter só um ano de contrato, por vontade própria, o projeto era de 2/3 anos, onde o primeiro ano passava por consolidar a equipa na 2ª liga e depois então, se ambas a partes quisessem continuar, tentar a subida”. A verdade é que Vítor Oliveira consegue promover o União da Madeira à 1ª liga logo na primeira temporada, 20 anos depois da última participação dos insulares no principal escalão do futebol luso.
Vídeo: Antevisão de Vítor Oliveira ao último jogo da Liga contra o Oriental
https://playbuffer.com/watch_video.php?v=O6Y64W97ROWA
Desportivo de Chaves – Uma grande estrutura
Que fique bem claro, Vítor Oliveira faz questão de afirmar “que não é líquido aceitar só projetos da 2ª liga” e caso a si cheguem propostas da 1ª liga sentar-se-á “para ouvir as pessoas”. Acontece que depois de subir o clube madeirense, Vítor Oliveira, decide permanecer no segundo escalão e aceita o convite do Desportivo de Chaves para liderar a equipa à subida. “As condições em Chaves eram muito boas. Bom plantel, boa estrutura e quando assim é meio caminho andado para a subida” assevera o treinador que em 2015/2016 faz regressar o clube flaviense à 1ª divisão depois de 17 anos de escalões secundários. Objetivo que o clube tinha falhado por muito pouco na época transata, perdeu o lugar de promoção na última jornada para o União da Madeira de…Vítor Oliveira.
Portimonense – O regresso ao ponto de partida
O número das subidas de Vítor Oliveira ao primeiro escalão do futebol português chegou à figura redonda em maio passado com a décima escalada triunfal numa época de duas faces, mas já la vamos. Primeiro é preciso relevar que esta subida tem um sabor especial ou não fosse no Portimonense onde Vítor Oliveira iniciou a carreira de treinador em 1985 (não posso considerar o jogo que fez ao comando do Famalicão em 1978 quando tinha apenas 25 anos como o início de carreira). A temporada não foi um mar de rosas, longe disso. “Fizemos uma primeira volta absolutamente fantástica, mas na segunda volta tivemos tantos problemas que a qualidade de jogo diminuiu substancialmente e o número de pontos também diminuiu. Valeu-nos que conseguimos uma margem de pontos muito confortável”, explica Vítor Oliveira que para além de ter carimbado o regresso do clube algarvio à Primeira Liga também se sagrou campeão da Segunda Liga pela quinta vez na carreira. Subiu o Portimonense, e sobe também Vítor Oliveira. O treinador de 63 anos decidiu aceitar o convite dos responsáveis do clube e vamos poder vê-lo no meio dos grandes na temporada que se avizinha.
Manuel Fernandes é o treinador que se aproxima mais da marca de Vítor Oliveira
Foram 9 subidas de Vítor Oliveira até ao momento. Números impressionantes que destacam o atual treinador do Portimonense de forma singular no panorama do futebol português. Atrás dele, com 5, está Manuel Fernandes. Conversámos com o atual diretor do departamento de scouting do Sporting que com toda a modéstia fez questão de lembrar que “uma das subidas foi conseguida a meias com Carlos Manuel”. E dessa temporada tem gravada na memória uma partida que o opôs ao amigo, fora das quatro linhas, adversário em muitas batalhas dentro delas, na época 2000/2001: treinava Manuel Fernandes o Santa Clara, e em visita a Vila do Conde para defrontar o Rio Ave de Vítor Oliveira, viu a sua equipa conseguir um importante empate (3-3) na caminhada que culminaria com a subida do clube açoriano à 1ª liga.
Garante Manuel Fernandes que apesar de estar muitas vezes com Vítor Oliveira o tema das subidas nunca calhou em conversa e embora admita que o amigo Vítor “esteja bem destacado” relembra que também é verdade o facto de ter consideravelmente menos jogos na 2ª liga que o atual treinador do Portimonense.
O primeiro clube a ser promovido pelo treinador natural de Sarilhos Pequenos foi o Campomaiorense que na época 1994/95 conseguia pela primeira vez na sua história garantir a presença no principal escalão do futebol português.
Quatro temporadas mais tarde – 1998/99 – repetiria o feito desta vez com os açorianos do Santa Clara, que garantiam na altura uma inédita presença na 1ª liga. A temporada de estreia no escalão maior não correu nada bem e neste caso a inexperiência valeu um último lugar e a respetiva despromoção. Nada que abalasse a confiança dos responsáveis do Santa Clara em Manuel Fernandes que iniciou a sua terceira época ao serviço dos açorianos com o objetivo de regressar à 1ª liga. Tudo parecia estar encaminhado nessa direção. A equipa praticava um bom futebol e paralelamente ia amealhando pontos que garantiam à 19ª jornada um lugar no topo da tabela. Garantiram também a Manuel Fernandes um lugar no banco do seu Sporting que acabava de rescindir com Augusto Inácio e via no seu antigo avançado o homem ideal para segurar as pontas até ao término da temporada.
Em 2004 chega ao Penafiel para substituir o brasileiro Guto Ferreira. Faltavam 12 jornadas para o fim do campeonato e equipa estava em 5º lugar. Manuel Fernandes sabia o que era preciso para no último terço do campeonato fazer a diferença e conseguir a promoção. E assim aconteceu, terminaria a época em 3º lugar e garantia o passaporte para a 1ª liga.
Conseguiria a sua quinta subida ao escalão principal do nosso futebol em Leiria na temporada 2008/09. Assume o comando da equipa à 7ª jornada sucedendo a Paulo Alves e termina a época em 2º lugar.
Confira o ranking de treinadores com mais subidas à 1ª liga
Vítor Oliveira 9
(Paços de Ferreira 90/91, Académica 96/97, U. Leiria 97/98, Belenenses 98/99, Leixões 2006/07, Arouca 2012/13, Moreirense 2013/14, U. Madeira 2014/15, D. Chaves 2015/16)
Manuel Fernandes 5
(Campomaiorense 94/95, Santa Clara 98/99 e 2000/01*, Penafiel 2003/04* e U. Leiria 2008/09*)
Prof. Neca 4
(Desp.Aves 84/85, 99/00 e 2005/06 e Tirsense 88/89)
Fernando Vaz 3
(Vit.Setúbal 51/52, Vit.Guimarães 57/58 e Académica 72/73)
Manuel de Oliveira 3
(Barreirense 68/69 e 77/78 e Marítimo 81/82*)
Pedro Gomes 3
(Marítimo 76/77, Académica 79/80 e U.Leiria 80/81)
Mourinho Félix 3
(U.Leiria 78/79, Amora 79/80 e Rio Ave 80/81*)
José Mota 3
(Paços Ferreira 99/2000* e 2004/05 e Feirense 2015/16*)
Manuel Cajuda 3
(U.Leiria 93/94*, Belenenses 98/99* e Vit.Guimarães 2006/2007*)
António Conceição 3
(Estrela da Amadora 2004/05, Trofense 2007/08 e Moreirense 2013/2014*)
João Alves 3
(Estrela da Amadora 92/93 e 2002/03* e Académica 2001/02)
Jorge Jesus 2
(Felgueiras 94/95 e Estrela da Amadora 2002/03*)
Joseph Szabo 2
(Oriental 49/50 e SC Braga 56/57)
Artur Santos 2
(Olhanense 72/73 e U.Tomar 73/74)
Oscar Tellechea 2
(Torreense 54/55 e U.Tomar 67/68)
António Teixeira 2
(Varzim 75/76 e 81/82)
António Sousa 2
(Beira-Mar 97/98 e 99/2000)
Rogério Gonçalves 2
(Varzim 2000/01 e Naval 2004/05*)
Fernando Cabrita 2
(Beira-Mar 77/78 e Rio Ave 80/81*)
Rodolfo Reis 2
(Gil Vicente 89/90 e Tirsense 91/92)
*Épocas não cumpridas na totalidade