Prolongamento
Santamaria: do “Uau!”, no Sporting, ao “Nhec...”, nos distritais
2018-03-22 18:45:00
Ex-promessa do Sporting está a jogar nos distritais de Lisboa.

Definamos “Uau!” como interjeição que saúda uma coisa boa e “Nhec...” como a que demonstra desilusão. Em traços gerais, foi assim a carreira de Santamaria. O rapazola que apareceu no Sporting, com 16 aninhos – Uau! –, mas que cedo se perdeu para o futebol – Nhec... – e, por azar, más escolhas ou falta de oportunidades, acabou por não confirmar o que prometia. Este é o homem que está a jogar no Alta de Lisboa, dos distritais da capital (nada de que se deva envergonhar), e que, apesar de ser o Santamaria, não é o Santamaria. Confuso? Deixemos este pormenor para o final.

Falámos com quem bem conhece Santamaria. Lázaro treinou-o no Estrela da Amadora e João Coimbra é colega de equipa. Ao Bancada, Lázaro confirma tudo o que dissemos: o rapaz era mesmo promissor. “Daquilo que se viu dele, quando apareceu, ainda muito jovem, estava longe de pensar que iria fazer carreira em clubes menores e terminar nos distritais. Faz-me alguma confusão o não ter chegado mais longe, sobretudo depois de ter aparecido tão cedo no Sporting. Ficou um amargo de boca, sem dúvida”, reconhece.

Primeiro, quisemos saber quem é o rapaz nascido Ricardo Duarte. “É um rapaz muito tranquilo e muito profissional. Muito simples e de bom trato”, elogia Lázaro, numa visão semelhante à de João Coimbra: “É uma pessoa fantástica. Cinco estrelas. Tenta sempre ajudar ao máximo os mais novos e é um brincalhão. Pelo que sei, também é um pai maravilhoso”.

Ok, o Ricardo é um tipo simples, brincalhão e afável. E o Santamaria, quem é? Lázaro, explique-nos lá, com olho de treinador, quem é ele. “Um jovem com potencial. Muito bom central. Era, sobretudo, um central muito veloz e com bom jogo aéreo, apesar de não ser muito alto”, começa por dizer, antes de acrescentar: “Era muito agressivo e tinha muita qualidade com bola, sobretudo no passe longo, que era bastante bom”.

O passe longo era bastante bom? Não queremos enganos. Vamos confirmar isto. João Coimbra: tu, que és atacante do Alta, confirmas que o Santamaria te serve em condições? “Sem dúvida. Com a maior qualidade, sempre redonda!”, dispara, ao Bancada.

Foi pena... é que ele estava lá!

Santamaria leva 36 anos de vida e quase 20 anos como jogador de futebol. Mirko Jozic lançou-o em Alvalade com apenas 16 anos (!!!), o que fez do jogador o mais jovem de sempre a jogar pelo Sporting.

Numa carreira que já vai longa, houve duas temporadas agridoces. Por um lado, Santamaria fez parte dos plantéis do Sporting campeões nacionais em 1999/00, com Inácio, e 2001/02, com Boloni. Esta é a parte docinha da história. A parte amarga é que Santamaria... não chegou a jogar. O na altura jovem central estava tapado e atuou apenas pela equipa B e, pela equipa principal, apenas na Taça de Portugal. E conquistou-a, em 2001/02, depois de ter participado num jogo frente ao Vila Real, substituindo André Cruz.

Depois de três temporadas assim-assim em Alvalade, com um empréstimo ao FC Marco pelo meio, Santamaria, natural de Odivelas, atirou-se a um desafio ali pertinho de casa: Estádio José Gomes. Reboleira. Estrela da Amadora. No castiço Estrela que, entretanto, caiu em desgraça, Santamaria teve bastante sucesso. Começou na II Liga e foi um dos esteios da subida do clube à Liga Portuguesa. No ano seguinte, foi peça-chave no tranquilo 9.º lugar conseguido pela equipa lisboeta. Foi lá que se cruzou com Lázaro (na altura, era o adjunto de Toni Conceição), que garante que “no Estrela, ele foi muito importante”.

Ponto da situação: o homem promete muito, no Sporting, mas acaba por sair. Ajuda o Estrela a subir à I Liga e, no ano seguinte, é fundamental no ótimo 9.º lugar conquistado. Não tinha tudo para continuar este percurso?

Para Lázaro, sim, tinha. Mas, na altura, do que se lembra o treinador, as coisas acabaram por ficar confusas. “A saída dele do Estrela teve que ver com a procura de condições melhores. Julgo que, podendo estar a ser impreciso, ele chegou a ter uma proposta do CLUJ, da Roménia, mas acabou por não aceitar. Depois, julgo que ficou sem clube”, recorda, ao Bancada.

Lázaro contou quase tudo bem. Santamaria, apesar do nível que estava a apresentar, acabou por não conseguir um clube de primeira linha e voltou a ter de dar um passo atrás. Fez uma temporada no Olhanense, na Segunda Liga, e, a partir daqui, o abismo.

Parece pouco, parece...

Depois de uma passagem pelo Ponferradina – onde até há poucas semanas estava o português David Caiado – e de um “cheirinho” no Pinhalnovense, Santamaria foi para o Mediterrâneo. No Chipre, acabou por ser um dos muitos portugueses contratados por clubes cipriotas. Primeiro no AEP, na zona oeste da ilha, e depois no Alki Larnaca, no sul, Santamaria foi fazendo bastantes jogos, mas, três temporadas depois, bateu a saudade.

O jogador voltou a Portugal, mas a carreira que já se tinha entortado não mais se endireitou. Esteve novamente no Pinhalnovense, do Campeonato de Portugal, até sucumbir aos distritais. Nos relvados de Lisboa, Santamaria não passa despercebido aos mais conhecedores do futebol nacional, que se lembrarão do outrora jovem leão. Muito promissor.

Desengane-se, ainda assim, quem pensa que Santamaria se faz valer desse estatuto antigo. “Ele nem sequer fala disso. Não se gaba de nada, age como jogador do Alta, porque ele é jogador do Alta”, garante João Coimbra, que reconhece, ainda assim, que “ele vai contando mais em particular sim, quando eu tento saber mais qualquer coisa”.

Estás a falar para quem, pá?

Lembra-se da história do Santamaria que não é o Santamaria? Cá vai. Perguntámos a João Coimbra qualquer coisa que tenha vivido com Santamaria e que as pessoas não saibam. O relato fica a cargo do atacante do Alta. “Pouca gente sabe, mas o Santamaria chama-se Ricardo Jorge. É assim que eu o trato, porque sempre ganhei esse respeito e confiança. É engraçado porque, quando o chamo, ninguém sabe para quem estou a falar”.