Prolongamento
Bruno, o “cabeças”: um campeão no Dragão que se veste às escuras
2018-02-26 19:00:00
Depois de te terminado a carreira, decidiu voltar aos relvados do futebol distrital.

Bruno Fernandes. Diz-lhe alguma coisa? Não é esse, é outro. Mais antigo e com uns pezinhos igualmente banhados a ouro. Talvez o conheça só por Bruno. O histórico médio português teve muitos anos de I Divisão, com uma passagem bem recheada pelo FC Porto: não de jogos, mas de títulos. Ele que quis jogar até aos 42. Ele que, segundo relatos feitos ao Bancada por um ex-treinador e um ex-colega, é um brincalhão e veste-se às escuras. Histórias para ler mais à frente.

Tente imaginar um jogador que seja idolatrado no Benfica, no Sporting e no FC Porto. Nada? Então tente chegar a um que seja apreciado no SC Braga, no Vitória de Guimarães e no Moreirense. Nada? Então, agora, pense num que seja um menino dos olhos do Marítimo, do Nacional e do União da Madeira. Apresentamos-lhe Bruno. O homem que jogou nos três rivais da ilha e que, nos três, espalhou classe. Que, nos três, foi líder. Que, nos três, deixou saudades.

Se o Mourinho o foi buscar...

Quisemos saber quem é o Bruno. O homem, não o jogador. Carlos Brito foi treinador do médio, no Nacional, e Fábio Ervões foi seu colega, no União. Digam-nos lá, então, quem é este madeirense nascido há 43 anos, no Funchal. “Como nós dizemos aqui no norte, ele é boa gente. Era um brincalhão. Era saudável tê-lo lá. Ele era muito extrovertido e, nos almoços de equipa ele, era muito engraçado e com muito humor”, diz-nos Carlos Brito, em algo não diferente do que diz Ervões. “É uma pessoa cinco estrelas. Impecável. Era uma pessoa muito bem disposta e gostava era de brincadeira”.

Bem disposto, brincalhão e... um líder silencioso. Não é assim? “Sem dúvida. Não falando muito, mas que respeitávamos através do passado”, diz o ex-colega. E o treinador, via nele um líder? “Ele pensava que tinha algo mais a acrescentar por ser um jogador da região. Ele incentivava os colegas e eles ouviam-no”, explica Carlos Brito.

Já sabemos quem é o homem, mas vamos lá falar de bola. “O Bruno era claramente acima da média. Tecnicamente muito evoluído. Aliás, se chegou ao FC Porto é porque tinha qualidade. Para o Mourinho o ir buscar...”, defende Carlos Brito, numa visão assinada e detalhada por Ervões: “Como jogador? Melhor ainda! Muita qualidade técnica e inteligentíssimo. Quando joguei com ele, ele já não tinha aquela velocidade e força física, mas compensava com qualidade de passe e nas bolas paradas. Ele era muito bom”.

Três tiros, três melros

Bruno começou a carreira no Marítimo e afirmou-se como um titular e, sobretudo, como uma das figuras da equipa, durante vários anos. José Mourinho viu e foi caçar aquele craque, para o seu já recheado meio campo, com Costinha, Maniche, Deco, Paulinho Santos ou Alenichev.

No FC Porto, vieram as trevas. As lesões não largaram o madeirense, que fez apenas três jogos pelos portistas. Mas o que estamos para aqui a dizer? Apenas três jogos? Três jogos podem valer o Mundo. Que o diga Bruno que, fez um jogo na Liga Portuguesa, um na Taça de Portugal e um na Liga Europa. Em nenhum deles fez 90 minutos, mas todos eles lhe valeram um título, que aquele FC Porto de Mourinho não brincava em serviço. É isto: fazer três jogos, ganhar três títulos diferentes e ir embora. Não terá sido o percurso sonhado pelo jogador, mas, pelo menos, de mãos a abanar é que ele não foi.

Bruno foi emprestado ao Marítimo até ao final da temporada e acabaria por lá ficar em definitivo. O bom filho a casa torna, já diz o povo. O que também se diz por aí é que o amor transforma o inimigo em amigo. E Bruno fez isso. Com amor, com talento e com dedicação. É que, supostamente, o Nacional e o União seriam inimigos daquele já histórico maritimista.

Nada disso. “Como é que isto se consegue? Consegue-se sendo profissional, trabalhador, dedicado, interessado e nunca se julgando acima dos outros, apesar da carreira que já tinha. E, acima disto, o que ele era como jogador”, explica Carlos Brito, que recebeu aquele craque no Nacional.

Acabou e depois voltou. Para o distrital

O “globetrotter” da Madeira fez três anos no Nacional – os tais em que se cruzou com Carlos Brito –, depois voltou ao Marítimo, para outros três anos, e, para mostrar que o Mundo não é para inimizades, ainda foi fazer uma perninha ao rival União, para terminar a carreira.

Pausa. Terminar a carreira? Achávamos nós (e ele também, já agora). Dois anos depois de terminar a carreira, Bruno andava a jogar nos veteranos do União, até receber uma chamada do presidente do ADCR Bairro da Argentina, dos distritais da Madeira. Como é que um tipo que fez a carreira que fez aceita terminar no futebol distrital? Carlos Brito explica: “Ele gostava muito de futebol. ‘Vou jogar até aos 50 anos’, dizia-me ele”.

Não foi até aos 50, mas foi até aos 42 anos. Coisa pouca. “O Bruno vem quase a custo zero. Sobre valores, foi a última coisa de que falámos. Ele é uma pessoa muito acessível. Vem porque gosta do futebol e gosta de novos projetos”, explicou o presidente do clube, José Luís Sousa, ao “Maisfutebol”, em 2015.

“Dizíamos que ele se vestia às escuras”

Divertido, brincalhão, boa gente, com uns pezinhos de ouro e profissional. Já sabemos que Bruno é tudo isto, mas queremos saber mais: o que é que o leitor do Bancada pode ficar a saber sobre o Bruno que pouca gente saiba? Fizemos esta pergunta a Fábio Ervões que, apesar de reconhecer e lamentar a parca memória, recorda alguns pormenores. 

“Ele era conhecido por “Bruno, o cabeças”, porque tinha uma cabeça enorme”, começa por dizer, entre risos, antes de acrescentar: “Brincávamos muito com a forma de vestir dele. Dizíamos que ele se vestia às escuras. E tinha uma camisola tropa, que um amigo nosso dizia que era para ele ir à caça”.