Portugal
"Agora, falta saber se a estrutura vai estar preparada", alerta Inácio
2021-05-11 23:20:00
Treinador que levou o Sporting ao título em 1999/2000 expectante pela gestão do preço do sucesso

A gestão do sucesso do Sporting proporcionado pelo 19.º título de campeão nacional de futebol deixa expectante o treinador Augusto Inácio, que assume ter “dado o pior passo na carreira” ao continuar nos ‘leões’ depois de 1999/2000.

“A exigência vai ser grande na próxima época e é preciso ter algum cuidado na forma como se projeta as coisas. O que é que o Sporting vai querer? Os adeptos vão dizer que, se foram campeões agora, querem sê-lo outra vez. É normal. Isso é o que todos pensam. E a estrutura?”, referiu à agência Lusa o ex-jogador, treinador e dirigente dos lisboetas.

A vitória na receção ao Boavista, por 1-0, em jogo da 32.ª e antepenúltima jornada, confirmou hoje a reconquista ‘verde e branca’ da I Liga 19 anos depois, deixando Augusto Inácio sem o duradouro estatuto de último técnico português campeão nacional pelo Sporting.

“O que é que irão dar ao treinador? Será que o Sporting vai vender muitos jogadores? Será que vai reforçar-se e manter a estrutura, numa época em que entrará na Liga dos Campeões e é preciso ter não só uma equipa, mas um plantel forte, em que sai um, entra outro e o coletivo não pode oscilar em termos exibicionais e de consistência?”, insistiu.

O ex-treinador guiou os ‘leões’ ao 17.º e antepenúltimo cetro, em 1999/2000, mas acabou prejudicado pelos conflitos internos posteriores, com a saída de Luís Duque da SAD e a passagem de testemunho de José Roquette para Dias da Cunha na presidência.

“O Sporting vai ter grande responsabilidade na próxima época de, pelo menos, e é isso que eu e os adeptos vão esperar, passar a fase de grupos. Além do encaixe monetário que fará, dará pontos ao país para podermos ter mais equipas na ‘Champions’. Agora, falta saber se a estrutura vai estar preparada para responder a esses desafios”, vincou.

Inácio vivenciou períodos de grande instabilidade em Alvalade, culminados nas duas maiores ‘secas’ de campeonatos da história dos lisboetas, estendidas por 18 e 17 épocas seguidas, entre 2002/03 e 2019/20 e de 1982/83 a 1998/99, respetivamente.

“Há muita coisa que explica e tive a prova disso quando fomos campeões e, sendo evidente que ganhei muitos inimigos, dei o alerta para aquilo que se estava a passar e não se podia repetir”, relembrou o treinador, que rendeu o italiano Giuseppe Materazzi em setembro de 1999 e permaneceu no comando técnico ‘leonino’ até metade de 2000/01.

Ao assistir à “aquisição de jogadores às catrefadas”, desprovida de “retorno desportivo e financeiro”, o ex-dirigente lamenta que o clube “tenha passado a ser o Sporting-negócio”, contexto que “não fez os adeptos felizes nem possibilitou ganhar muitas mais vezes”.

“Isso é que me enojou na altura e fez com que o Sporting perdesse anos e anos. É verdade que foi campeão com o László Bölöni, até porque contratou à última hora o Jardel, que foi a figura número um, mas depois voltou à mesma. Tem havido muita gente que não olha o lado desportivo que faz as pessoas saltarem das bancadas”, justificou.

A falta de campeonatos desde a ‘dobradinha’ de 2001/02, sucedida por quatro Taças de Portugal (2006/07, 2007/08, 2014/15 e 2018/19), quatro Supertaças (2002, 2007, 2008 e 2016) e três Taças da Liga (2017/18, 2018/19 e 2020/21), veio agudizar a desconfiança.

“Quando um grande clube não ganha, é evidente que começa a haver fraturas e divisões, porque uns pensam uma coisa e outros pensam outra até arranjar aqui equilíbrio, que ainda não chegou. Por si só, os títulos não fazem com que as pessoas se unam, mas dão esperança para ver como é que esta gente lidará com quem tem estado de fora”, notou.

Aludindo a um eventual regresso do público aos estádios em 2021/22, Augusto Inácio espera que a direção de Frederico Varandas dê uma mensagem “de dentro para fora”, lembrando que a massa associativa “está revoltada porque não se sente respeitada”.

“Há coisas mais profundas que não estão saradas. Não digo que as pessoas caminhem todas para o mesmo lado, porque há sempre divergências, mas podem ficar mais unidas. Contudo, ficam sempre com um pé à frente e outro atrás devido aos sinais dados nestes anos por este presidente e pelo líder da Assembleia-Geral [Rogério Alves]”, observou.

O ex-diretor geral do futebol ‘leonino’ em duas fases distintas, ambas na presidência de Bruno de Carvalho, pede que sejam clarificadas “coisas importantíssimas” que os sócios “têm direito e querem saber”, lembrando uma promessa eleitoral de Frederico Varandas.

“Foi dito publicamente pelo presidente que o título de 2015/16 foi roubado ao Sporting e oferecido ao Benfica. Foi o que mais me custou perder. Disse que denunciaria como se tinha perdido, mas ainda não explicou. Eu sou sportinguista, o meu clube foi prejudicado, sei disso e não falo. Há qualquer coisa que não bate certo. Mais valia nada ter dito”, atirou.