Técnico, que venceu a Taça pelo Vitória de Setúbal, esteve 12 anos fora, mas as saudades trouxeram-no de volta ao futebo
Fevereiro de 2005. Já lá vão quase 13 anos. Tal como atualmente, o Vitória de Setúbal atravessava uma grave crise financeira. Ainda assim, perante todos os problemas, José Couceiro conseguiu fazer um arranque de temporada surpreendente, que o levou até ao comando do FC Porto. No dia 2 desse mês de fevereiro o Vitória anunciou José Rachão como substituto de Couceiro. Um técnico aparentemente “desconhecido” e com alguma experiência de Segunda Liga e Segunda Divisão B. Mas as coisas correram bem e Rachão conduziu os sadinos ao triunfo na Taça de Portugal, depois de uma vitória na final frente ao campeão Benfica.
Apesar de ter ajudado o clube a conquistar a terceira Taça do historial, colocando um ponto final numa “seca” de quase 40 anos, Rachão acabou por não continuar no Bonfim. Uma saída que lhe custou. Viu-se mesmo obrigado a treinar na Segunda Divisão B na época seguinte e, depois, deixou Portugal e a “ostracização” para refugiar-se no estrangeiro. Andou pelas Arábias durante 12 anos. “Estive quatro no Kuwait, três na Arábia Saudita, tive na Líbia, Síria… foi uma vida lá fora. Com a experiência que tenho no futebol a minha vida já dava para fazer, não um, mas quatro livros”, assegura-nos. Conquistou títulos, e, em fevereiro último – curiosamente, também no dia 2 – regressou ao futebol português para orientar o RD Águeda pela terceira vez na carreira, depois de já o ter feito na década de 80.
Após salvar o clube da descida no Campeonato Portugal na última época, Rachão encetou uma subida até ao topo e só não foi para o Natal como líder da Série C, porque na última jornada deixou-se empatar em casa frente ao AD Fornos de Algodres, que é último classificado. “São coisas que acontecem no futebol”, lamenta o técnico ao Bancada. Apesar dos 65 anos, José Rachão vê-se com ambição para regressar aos grandes palcos do futebol português, diz que está “vivo e no mercado” e que vai ficar no futebol “até morrer”, classificando-se ainda como um treinador “muito genuíno”.
Segundo o próprio, foram as saudades que o trouxeram de volta ao país de origem. “Foram muitos anos lá fora e já estava com saudades da família, gosto de estar perto deles. Surgiu esta oportunidade e eu gosto é de trabalhar no futebol, não olho muito a projetos. A minha vida sempre foi futebol. Nasci, fui criado e vou morrer no futebol”, assegura o técnico do Águeda, que encontrou a equipa numa situação delicada na reta final da última época. “O ano passado o clube estava numa situação difícil, mas felizmente fizemos um bom final de época. Este ano tentámos fazer uma equipa um pouco melhor e a verdade é que penso que estamos a fazer um trabalho excecional”, salienta Rachão.
“Há muitas limitações e carências de várias ordens, mas estamos bem posicionados, a um ponto do primeiro lugar. Está tudo em aberto. No entanto, o primeiro objetivo está cumprido, que era lutar pela permanência e assegurá-la o mais rapidamente possível. Estamos a fazer um campeonato bastante bom, mas se queremos lutar por mais qualquer coisa precisamos de reforçar esse desejo, porque sem isso as coisas tornam-se mais difíceis. Vamos ver o que a direção vai resolver. Contudo, independentemente do empate com o último classificado, todos estão de parabéns pelo que está a ser feito”, assume o técnico português, natural de Peniche.
Apesar de as coisas estarem a correr bem em Águeda, José Rachão não fecha as portas a novas aventuras. “Puxando um pouco a brasa à minha sardinha, sou um homem do futebol e, por isso, estou no mercado. Estou no mercado desde que voltei ao futebol português. Até mesmo no estrangeiro. Se me aparecer uma hipótese neste momento, até porque lá fora angariei títulos e algum prestígio, tem de ser uma oportunidade que valha a pena, porque para abandonar a minha família já não vou para qualquer lado. Mas em Portugal estou no mercado. Em qualquer altura estou suscetível a qualquer proposta e não ponho de lado a hipótese de poder saltar de nível se me aparecer uma oportunidade melhor e mais gratificante”, revela-nos.
“Sinto-me bem psicologicamente e fisicamente, sei que ainda estou atualizado, sei do meu valor, por isso se aparecer uma oportunidade não vou desaproveitá-la. A minha concentração está no campeonato, como é lógico. Mas regressei ao futebol português com todo o gosto. Estamos por cá, estamos felizes, estamos vivos e a fazer o que gostamos. Quando assim é, estamos recetivos ao que vier bater à porta. Mas não sou muito de futurologia”, garante o experiente treinador.
À parte do trajeto de sucesso no CNS, José Rachão mostra-se contente pela homenagem recente feita pelo Vitória. “É bom as pessoas reconhecerem o nosso trabalho, pelo menos enquanto somos vivos”, frisa o homem que levou os sadinos pela última vez a festejar no Jamor. Agora, mais de uma década depois, as feridas parecem já estar saradas. Mas o técnico ainda lamenta a oportunidade… que não teve. “Foi uma experiência muito dura. Ganhámos a Taça de Portugal, apurámos a equipa para a Taça UEFA, para a Supertaça… conquistaram-se muitas coisas. Na altura esperava por uma segunda oportunidade e era bom que me tivessem dado essa nova oportunidade de continuar o meu trabalho”, aponta.
“Aí penso que se fecharam muitas portas. E eu, magoado, optei por fugir para o estrangeiro, refugiando-me a trabalhar lá fora. Talvez por isso, tenha perdido muitas oportunidades. Mas isso já está ultrapassado, o que vale a pena dizer é que estou vivo e estou novamente no futebol português. Sei que tenho valor e muita competência. Quem sabe se não terei uma nova oportunidade para mostrá-lo. A maior prova está no trabalho que estou a fazer aqui no Águeda”, remata José Rachão, já sem o bigode que o marcou naquela temporada de 2004/05, onde terminou a época a dar um verdadeiro “bigode” ao Benfica de Trapattoni, mas ainda com muita ambição.