Portugal
Início de época triunfante do Rio Ave é prometedor, mas já aconteceu no passado
2017-08-20 15:25:00
O Rio Ave começou a Liga com três vitórias em outras tantas jornadas, mas há casos iguais neste século

O Rio Ave é a principal sensação deste início de Liga portuguesa, com os nove pontos somados em três jornadas disputadas, sendo a única equipa, para além dos ‘três grandes’ que chega ao final desta ronda só com vitórias. Porém, engane-se quem pense que os vilacondenses são caso único: neste século, já foram dez as ocasiões em que um clube que não é candidato ao título consegue bater-se com a elite nacional nos compromissos iniciais do principal escalão do futebol português. Os próprios vilacondenses encontram-se presentes nessa lista e sem ser necessário recuar muito no tempo: aconteceu em 2014/15, com Pedro Martins no comando técnico.

Mas, antes de lá chegarmos, merecem um olhar os principais obreiros deste começo de Liga por parte do Rio Ave. Salta à vista a presença de um novo timoneiro no comando técnico da equipa: Miguel Cardoso. Aos 45 anos, faz a estreia enquanto treinador principal e logo com um início auspicioso como o que se tem verificado até ao momento. Curioso é o facto de que Miguel Cardoso estava presente na equipa técnica de um dos conjuntos que, desde o ano 2000, alcançou a façanha ‘gladiar’ com os ‘grandes’ do futebol português. Em 2009/10, o treinador do Rio Ave integrava a comitiva de Domingos Paciência no SC Braga que surpreendeu tudo e todos ao dar luta ao Benfica pelo título até ao final do campeonato, o que faz com que Cardoso não seja, de todo, um estranho no que diz respeito a princípios de temporadas prometedores.

Aliás, as similaridades e pontos de contacto entre o Rio Ave de 2017/18 e o SC Braga de 2009/10 são percetíveis. Quem o diz é Fernando Alexandre, médio da Académica que integrava o plantel dos bracarenses nessa época. “Percebe-se que há ali [Rio Ave] trabalho e qualidade no futebol desenvolvido. Nos princípios de jogo, há algumas parecenças com o SC Braga dessa temporada, na organização e também no princípio em jogar desde trás. Havia ideias do Miguel Cardoso nesse SC Braga que ele transportou para este Rio Ave”, considerou o centrocampista em declarações ao Bancada.

Salgueiros foi percursor dos inícios de época auspiciosos neste século

Tal como já foi referido, o Rio Ave não é caso único no que concerne a começos de Liga triunfantes para equipas de menor dimensão. Ao recuar até ao início deste século, encontra-se o Salgueiros como percursor deste tipo de trajeto. Em 2000/01, a equipa então comandada por Vítor Manuel também contava nove pontos com três rondas do campeonato realizadas e colocou de sobreaviso os restantes clubes da competição.

Na ótica de Vítor Manuel, as parecenças entre ambas as caminhadas são nítidas. “Este Rio Ave é uma equipa com qualidade, está bem trabalhada pelo Miguel Cardoso, está muito confiante naquilo que são as suas ideias de jogo. Era isso também que nós tínhamos no Salgueiros, éramos também uma equipa de transições rápidas, privilegiávamos muito a posse e a circulação, como o Rio Ave”, referiu ao Bancada.

Quem corrobora as similaridades entre os dois conjuntos é Carlos Ferreira, que integrava o plantel do Salgueiros em 2000/01. “Naquela altura, quando nos deparámos com um começo de época dessa forma, tivemos que ter os pés bem assentes na terra e o que está a acontecer com o Rio Ave é a mesma coisa. O Rio Ave é, provavelmente, um clube com os mesmos pergaminhos que o Salgueiros tinha”, apontou o antigo jogador em conversa com o Bancada.

Ainda assim, não só Salgueiros e SC Braga, já acima referido, protagonizaram inícios época marcantes. Tal como verificado na tabela abaixo, Vitória de Guimarães, Marítimo, Nacional e o próprio Rio Ave já o fizeram.

Equipas (sem contar com os 'três grandes') com 3 vitórias nas 3 primeiras jornadas da Liga desde 2000

Época | Equipas | Classificação final na Liga

Pré-época, trabalho e continuidade são fatores-chave

Ora, de onde surge então esta senda vitoriosa rioavista? Tendo em conta que estamos no começo do campeonato, todo o trabalho realizado durante a preparação da época ecoa no rendimento destes primeiros compromissos. Assim o considera Carlos Ferreira, que atribui à pré-temporada um dos principais fatores para o trajeto do Rio Ave. “Um bom início de época é um prenúncio de uma pré-temporada bem conseguida.  No nosso caso, foi um campeonato bem começado, mas fruto de uma grande pré-época, que é o que define por muitas vezes um campeonato. Assim acontece com o Rio Ave.” Porque é, então, tão fulcral começar bem? Carlos Ferreira responde: “É fundamental para amealhar pontos e dar motivação e confiança. É bom começar com esta garra e vontade de vencer, para depois quando chegarem resultados menos positivos se agarrar a isso para dar logo a volta.”

Na ótica de Vítor Manuel, a continuidade que se tem verificado nos vilacondenses, em termos estruturais, é fator fundamental. “Este Rio Ave é uma equipa que, em comparação com o Salgueiros, tem esta particularidade de começar bem, que é sempre importante. O Rio Ave já nos tem habituado a fazer bons campeonatos, é uma equipa que não sofre muitas alterações em termos estruturais, mantém sempre o núcleo duro”, referiu Vítor Manuel, considerando também a ligação entre a equipa e massa associativa como ponto de destaque para o trajeto levado a cabo pelo Rio Ave.

A junção de dois jogadores com o génio criativo é, para Fernando Alexandre, o principal trunfo da estrutura e equipa técnica vilacondense para a nova época. O centrocampista aponta Francisco Geraldes e Rúben Ribeiro como peças-chave neste Rio Ave de Miguel Cardoso. “Dois jogadores que permitem à equipa ter bola. Proporcionam à equipa conseguir sair a jogar desde trás e ligar todos os setores.”

Início perfeito nem sempre termina em festejos

A questão que se impõe é a seguinte: até onde pode chegar este Rio Ave? É equipa com estofo necessário para chegar às competições europeias? Nas palavras de Fernando Alexandre, tem calibre para tal. “Acredito que o Rio Ave é um sério candidato para ir às competições europeias”, vincou ao Bancada.

Porém, um olhar sobre a história mais recente dá conta de que uma caminhada que começa triunfante, nem sempre termina de acordo com as aspirações que se foram criando com o passar das vitórias. Quando recordados todos os casos de equipas, além dos ‘três grandes’ que à terceira jornada somavam nove pontos, desde o ano 2000, é percetível que nem todas chegaram à qualificação para as competições europeias. Mais precisamente, foram dois os casos: o próprio Rio Ave, em 2014/15, com Pedro Martins como treinador, terminou o campeonato em 10.º lugar, e o Salgueiros que se ficou também por essa posição em 2000/01.

Vítor Manuel vê essa quebra, do Salgueiros, ao longo da Liga com naturalidade, das vicissitudes que vão aparecendo ao longo do trajeto. “O que aconteceu foi natural. Algumas derrotas consecutivas levam o estado emocional a baixar. Abaixamentos de forma, os maus resultados… não conseguimos reagir à essa parte emocional desse momento negativo. Isto acontece com as equipas que não têm um núcleo habituado a jogar por grandes objetivos e o principal objetivo do Salgueiros era lutar pela permanência”. Ainda assim, Vítor Manuel já vê o Rio Ave noutros patamares. “O Rio Ave hoje já tem maiores possibilidades, já luta pela Europa e já se começam a criar hábitos de lutar pelas competições europeias.”

Carlos Ferreira, por seu turno, apontou as próprias vitórias iniciais como fatores que podem contribuir fortemente para uma quebra futura, numa fase mais avançada da competição. “O campeonato é longo e há quebras de rendimento. No fim da época, paga-se um pouco a fatura do crescimento de exigência que foi feito. O próprio Salgueiros, quando iniciava uma época, tinha como objetivo a permanência. Mas, quando se começa o campeonato com esses resultados positivos, os jogadores e o próprio treinador começam a pensar em algo mais [na Europa]. E depois acusa-se um pouco a pressão.”

A 26 de agosto surge o primeiro verdadeiro teste de fogo para o Rio Ave. A turma de Miguel Cardoso recebe o Benfica, em Vila do Conde, na quarta jornada da Liga, e o desfecho desse encontro fará observar se este conjunto vilacondense se mantém na senda triunfante que tem sido este início de época.