Portugal
Hugo Viana, o homem do sotaque, do pé direito fraquinho e da roupa por lavar
2018-09-11 16:00:00
No meio deste percurso ainda entrou a Daniela Ruah, o Pedro Granger e uma música em Newcastle.

Hugo Viana é um dos nomes fortes da estrutura levada por Frederico Varandas para o Sporting. Terá funções nas relações internacionais e a verdade é que, pelo que soubemos, este rapaz, em tempos, parecia mesmo um estrangeiro em Lisboa. Do sotaque ao elogio da terra dele, passando pela roupa por lavar e pelas conferências com famosos. O Bancada foi falar com Alemão, João Paiva, Artur Marinho e Hugo Pina, ex-colegas de Hugo Viana e temos estas historinhas e outras relacionadas com um pé direito cego, mas do qual Viana se orgulhava. Tudo para ler mais à frente.

Se calhar, não. Vai já uma, para adoçar. Viana vai estar, como dissemos, nas relações internacionais. Chegou a Lisboa em 1998, com 16 anos, e, nessa altura, parecia mesmo alguém “internacional”. Não, não veio de Viana, mas veio lá de cima, do Minho.

“Lembro-me de o Viana ser um amigo divertido, que adorava discutir connosco que Barcelos era melhor do que as cidades/vilas de onde os outros jogadores vinham. Era risada total porque, na altura, ele tinha um sotaque muito acentuado e a argumentação deste tópico era incrível. Claro que ninguém acreditava nele”, conta-nos João Paiva, entre risos.

E Hugo Pina também não se esqueceu desses tempos… “Lembro-me de ele ter roupa para lavar e, como era de Barcelos e ia poucas vezes a casa, ser a minha mãe a lavar a roupa dele”.

Gostava de andar sempre na palhaçada

Hugo Viana terá funções institucionais, no Sporting, mas, diz-nos quem o conhece, é um tipo que não diz que não à palhaçada. Mas separa bem as coisas. Afinal, já diz o povo: trabalho é trabalho, conhaque é conhaque.

“Passámos férias juntos nesses tempos e ainda temos grandes amigos em comum, como o Hugo Valdir e o Miguel Garcia, e, nos últimos anos, já nos encontrámos várias vezes para almoçar ou jantar juntos. O Viana continua o mesmo tipo divertido de sempre, mas sempre sério quando se fala em trabalho”, diz João Paiva, que recordou os tempos em que Viana chegou aos miúdos do Sporting: “Demorou pouco tempo a ambientar-se à equipa, porque era um jovem que gostava de andar sempre na palhaçada. Tínhamos um grande grupo e o Viana, além de um grande jogador, também era dos que mais fazia pelo espírito de equipa. No entanto, no campo, sempre foi sério”.

Pelo visto, Viana é isto: palhaçada no dia-a-dia, mas seriedade no trabalho. Mas atenção: não precisa de falar muito. “O Hugo era uma pessoa reservada. Falava o qb. Uma pessoa que estava sempre pronta a ajudar o colega, mas não muito falador. Falava pouco, mas o que falava acrescentava sempre alguma coisa”, diz-nos Hugo Pina, outro ex-colega, em Alvalade, tal como Alemão: “É uma pessoa reservada. Brincava quando tinha de brincar, mas sempre muito sério e profissional”.

Como jogador, muitos dizem que a carreira de Hugo Viana parece saber a pouco. Talvez. Sim, houve Sporting. Sim, houve Liga Inglesa. Sim, houve Valência e Liga Espanhola. Sim, houve vários anos a bom nível em Braga. Mas para quem foi vendo a qualidade de Viana, ainda muito novo, talvez tenha sabido a pouco.

Mas – e talvez isto surpreenda os mais distraídos – Hugo Viana esteve em dois Mundiais (2002 e 2006), um Europeu (2012) e uns Jogos Olímpicos (2004). Para alguém que se diz ter ficado abaixo das expectativas, é obra. A história de 2002 é curiosa, porque Viana teve a sorte de substituir Kennedy, após o caso de doping.

Há quem diga que soube a pouco

Falar de Hugo Viana é, inevitavelmente, falar do pé esquerdo notável e a visão de jogo. “Um dos melhores pés esquerdos com quem joguei. O passe longo era espetacular”, diz João Paiva, completado por Artur Marinho: “Salientava-se fundamentalmente pela sua técnica e leitura de jogo (muito acima da média)”.

Alemão vai mais longe e recorda a primeira vez que o viu mexer na bola. “Lembro-me da primeira vez que vi o Viana jogar e pensar... que craque! Que grande jogador e ainda por cima canhoto! Este miúdo vai chegar longe…”.

E chegou mesmo. Depois destas histórias nas camadas jovens – e de um título nacional e um título europeu sub-17 –, Hugo Viana chegou aos seniores do Sporting em 2001, com 19 anos, e fez apenas uma temporada na equipa principal (campeão nacional), antes de ser “caçado” pelo Newcastle.

Lembra-se da história de Viana ser um tipo internacional? Depois de ter sido um “estrangeiro” minhoto, em Lisboa, tratou mesmo de ser um estrangeiro a sério, em Inglaterra. Fê-lo tão bem, tão bem, que teve direito a música. Infelizmente, a internet não ficou munida de um vídeo dos adeptos ingleses a cantar “Viana, o número 45”, mas a música existiu mesmo, que a nossa memória ainda guarda isso.

Apesar da música, Viana acabou por não se fixar na Liga Inglesa. O próprio chegou a apontar, à Newcastle TV, alguns motivos como a pressão de ser visto como um “Golden Boy”, o dinheiro investido pelo clube e o facto de, com Gary Speed, Jenas e Dyer na equipa Hugo Viana raramente ter podido jogar na sua posição, como médio centro. Ainda assim, houve tempo para estas duas coisinhas.

Voltou ao Sporting, por empréstimo – fez, talvez, a melhor época da carreira, com Peseiro –, antes de ir para Espanha. Sim, leu bem: vai reencontrar o treinador que terá, provavelmente, exponenciado melhor o futebol de Viana.

Com Daniela Ruah e Pedro Granger ao barulho…

Mas vamos lá parar com o perfil cronológico da carreira, que há coisas mais giras. Por exemplo, perceber o perfil de Hugo Viana num cargo superior, com a ajuda de Artur Marinho, que recordou a “liderança silenciosa“ do ex-colega.

“O Viana impunha a sua liderança no grupo pelo trabalho diário e, efetivamente, pelo cumprimento das regras definidas pelo grupo e pela instituição Sporting. Pessoalmente, definiria o Viana pela sua humildade e respeito. Era um exemplo para todos nós, pois, infelizmente, não é normal encontráramos um atleta com a qualidade técnico-táctica que o Viana apresentava a comportar-se de forma tão respeitosa e humilde, conseguindo sempre manter a sua posição de líder no grupo precisamente por esses comportamentos exemplares. O Viana era um exemplo para todos os atletas e, não sendo o capitão oficial do grupo (esse era o Carlos Marques), era um dos líderes do balneário, tal como o Miguel Garcia”. “O Viana foi sempre um colega preocupado com os mais novos e com a integração destes no seio do grupo”, acrescenta.

Uns meses depois, houve o tal título pelo Sporting e… famosos lá pelo meio. “Nunca me esquecerei do momento em que que estávamos no autocarro em direção ao Marquês, para celebrar o título de campeão. Eu, o Viana e o Quaresma. Bem como a minha primeira conferência de imprensa com eles, o Custódio, a Daniela Ruah e Pedro Granger”, recorda Alemão, ao Bancada.

“Hoje jogo só com o pé direito e vais ver se é fraquinho”

A terminar, duas coisas:

1-A tal história do pé esquerdo. Conta-nos João Paiva que, um dia, decidiu meter-se com Viana sobre a qualidade (ou falta dela) do pé direito do médio. “Lembro-me de haver um jogo em que eu lhe disse que o pé direito dele era fraquinho e ele disse ‘ok, então hoje jogo só com o pé direito e vais ver se é fraquinho’. Fez um grande jogo e calou-me durante uns dias”, recorda, ao Bancada.

2- João Paiva tem uma mensagem para Hugo Viana: “O pé direito dele é que deve ainda ser o mesmo…”, dispara, entre risos.