Grande Futebol
Quintero, o craque de Pekerman que quase desistiu e trocou o futebol pela música
2018-06-26 21:50:00
Do drama familiar a quase desistir do futebol pela música, com uma crise existencial pelo meio. Eis Juan Quintero.

Aconteça o que acontecer, até final, no Campeonato do Mundo que vai sendo disputado na Rússia, Juan Quintero já fez história. Com o golo apontado ao Japão na derrota da Colômbia perante os nipónicos, Quintero tornou-se no primeiro jogador da história do futebol colombiano a marcar golos em dois Mundiais distintos. Aconteça o que acontecer até final no Campeonato do Mundo, para Juan Quintero, a competição será para recordar. Reabilitou a imagem, jogou a competição ao lado do grande amigo James e para trás ficou a ideia de abandonar o futebol para se dedicar ao Reggaeton.

“Ainda não consigo acreditar. Às vezes custa a entender o presente, mas estou com uma grande confiança. Estou muito feliz com as minhas exibições e que continuar a dar o meu melhor pela equipa. Tudo é mais fácil quando estás rodeado pelos melhores”. Juan Quintero era um homem feliz depois da vitória da Colômbia sobre a Polónia por 3-0, jogo em que finalmente Pekerman juntou Quintero a James no onze inicial colombiano. “Todos sabem que James é que é a referência e o jogador que marca a diferença. Jogar com James é um privilégio, mas o que é importante é o melhor para a equipa. Jogarmos juntos... quem ganha é a Colômbia”.

Ambos produtos da escola do Envigado da Liga Colombiana, a amizade que liga Quintero e James Rodríguez é forte e na Rússia, em campo, oferece outro brilho ao já de si entusiasmante futebol colombiano. Para Quintero muito mudou nos últimos meses. Do falhanço no FC Porto e Rennes, ao próprio redescobrimento, em casa, ao serviço do Independiente Medellín e de certa forma no River Plate na Argentina, por pouco, Quintero não desistiu do futebol. Desiludido pelo rumo que a carreira tomou e com uma estreia bem sucedida no Mundo artístico, por pouco Juan Quintero não trocou o futebol pelo reggaeton. Em boa hora não o fez. De estar fora das contas de Pekerman para o Mundial até ser figura chave da equipa cafetera na Rússia foi um saltinho. Sinais para o futuro, ou síndrome Podolski?

“Juan! Juan! Crack! Crack! Crack! Sos un crack!”, Pekerman não foi de meias medidas e não era para menos. Mais uma vez Juan Quintero agraciou o futebol colombiano com uma exibição de alto calibre, fulcral para o triunfo por 3-0 sobre a Polónia que manteve vivo o sonho da Colômbia em seguir em frente no Campeonato do Mundo que vai sendo disputado na Rússia. Uma exibição que pode ter definido muito do que será a carreira futura de Quintero, com rumores a surgirem de Espanha relacionados com o interesse do Real Madrid nos serviços do médio colombiano que é ainda pertence do FC Porto, mas do qual Rodolfo D’Onofrio, presidente do River Plate, disse já não querer prescindir.

Tempos houve em que Juan Quintero pareceu mais importado em conviver com Maluma, conhecido cantor colombiano, do que em viver o futebol. Decepcionado, perdido num futebol que não é o seu, incompreendido. Não só por isso, mas também. Não só por isso, mas por muito mais do que isso. Algo do qual não quer falar ainda hoje. “Vivi coisas complicadas. Situação de vida, quem convive mais de perto comigo sabe tudo sobre isso. Não quero falar sobre isso. A culpa minha, mas está ultrapassado”, afirmou em Abril, poucos dias depois do encontro entre a França e a Colômbia que marcou um ponto de viragem no futuro de Quintero com a seleção colombiana e em muito ajudou o médio do FC Porto a estar presente no Campeonato do Mundo Rússia 2018. A Colômbia venceu 3-2 depois de ter estado a perder por 2-0 e Quintero, aos 85 minutos, selou o resultado final.

A vida nunca foi fácil para Juan Quintero. Nascido em 1993 em Medellín durante o período mais sangrento da luta aos cartéis de droga no país, Quintero tinha apenas dois anos quando o pai desapareceu/foi raptado para nunca mais voltar. Segundo a organização Vidas Silenciadas, Jaime Quintero foi visto a entrar numa carrinha logo após ter iniciado o serviço militar e nunca mais reapareceu. “Há duas décadas que Jaime Quintero é procurado e há 20 anos que o governo não nos diz nada. São 20 anos de impunidade”, desabafou Silvia, irmã de Jaime e tia de Juan Quintero em 2015, data “comemorativa” do desaparecimento do pai de Quintero. 2015, ano em que Quintero desilude, não encontra espaço no FC Porto, é emprestado ao Rennes e não vai além de 14 jogos e um golo em todo 2015/16.

Não é, por isso, surpresa, que a carreira de Quintero se tenha perdido um pouco por essa altura. Rumores de transferências falhadas para clubes de maior reputação a nível europeu também poderão ter contribuído para a entrada num período catártico por parte de Quintero e, como muitos definem, um período de crise existencial do jovem médio colombiano. A música apareceu então na vida de Quintero e, ao contrário do que muitas vezes sucede, mesmo tendo em conta a maior importância que Quintero deu à vida social em detrimento da vida desportiva, Quintero floresceu. Ao serviço do Independiente, em 2017, redescobriu-se, reencontrou-se com o seu melhor futebol e apontou uns impressionantes 15 golos em 36 jogos ao serviço da equipa colombiana que lhe valeram uma transferência para um dos maiores clubes da América do Sul, o River Plate, bem como uma presença no Campeonato do Mundo do ano seguinte. Em Medellín, onde tanto perdeu, Quintero reencontrou o amor ao futebol.

“O futebol está a dar-me uma nova oportunidade, devolveu-me o sentimento de ter voltado a ser útil”, afirmou Quintero em maio ao diário Olé. Assim foi em França. Assim está a ser na Rússia. Quintero é um jogador fora de tempo. Começou a perder ainda antes da iniciar a carreira. Pekerman, porém, tem outra ideia. Ainda há espaço para jogadores como Juan Quintero. Em boa hora lhe deu nova oportunidade. Qual Fénix renascido das cinzas. “Juan! Juan! Crack! Crack! Crack! Sos un crack!”.