Grande Futebol
O grande êxodo: Nunca os jovens ingleses saíram tanto da Ilha
2018-08-16 20:00:00
Patrick Roberts é o caso mais recente de uma tendência sem precedentes: Os ingleses já querem jogar no continente.

Estes são novos tempos por Inglaterra. Durante anos a serem acusados de comodismo, são cada vez mais os jovens jogadores ingleses que decidem deixar o país para rumar aos diferentes campeonatos europeus. Com a globalização crescente do futebol e a maior capacidade de observação da federação inglesa, poucos são aqueles que ainda acreditam que sair do país significa um ponto final na carreira internacional. Patrick Roberts é o caso mais recente de um fenómeno que não tem paralelo na história. O do êxodo de jovens ingleses rumo ao futebol continental.

Patrick Roberts não foi ainda apresentado como reforço do Girona FC, mas consta já da ficha de convocados do clube catalão para a estreia na liga espanhola perante o Valladolid. Girona será o segundo destino de Roberts desde que o jovem extremo inglês deixou o Fulham para ingressar no Manchester City em 2015 depois de ter passado as três últimas temporadas emprestado pelo City ao Celtic. Glasgow não é propriamente o destino mais exótico possível para um jovem inglês, mas não deixa de ser apenas mais um exemplo de um fenómeno muito particular.

Além de Patrick Roberts, só este verão, Jonathan Panzo, Keanan Bennetts, Noni Madueke ou Reo Griffiths trocaram Inglaterra por diferentes clubes espalhados pela Europa. Panzo assinou pelo AS Mónaco, Bennetts pelo Borussia Mönchengladbach, Madueke pelo PSV e Griffiths pelo Olympique Lyon. Só este verão foram pelo menos cinco os jovens promissores ingleses que deixaram o seu país para rumar ao futebol europeu e até Portugal não foi exceção. Depois de Chris Willock ter deixado o Arsenal no verão passado para se juntar ao Benfica, esta temporada foi a vez de Kelechi Nwakali jovem nigeriano com passagem pelo Arsenal ter chegado ao FC Porto.

Só na Alemanha, na temporada passada, foram seis os jovens ingleses que participaram na competição, algo que só por si superou o valor combinado das anteriores 37 temporadas. Isso mesmo, em 37 anos de Bundesliga não existiram seis jogadores ingleses a participar na competição, muito mesno na mesma temporada como sucedeu em 2017/18 devido a Mandela Egbo, Kaylen Hinds, Ademola Lookman, Osayamen Osawe, Reece Oxford e, claro, Jadon Sancho, o foco principal dos jovens ingleses atualmente fora do país.

Foi já ao serviço do Borussia Dortmund que Jadon Sancho se sagrou campeão do Mundo Sub-17 em 2017. Os três golos nos três jogos da fase de grupos foram suficientes para convencer o emblema alemão a chamar de volta Sancho ainda antes da competição terminar, com o jovem inglês a crescer de preponderância no histórico emblema alemão à medida que a temporada avançou. Mesmo com 18 anos, Sancho terminou a época como titular da equipa do Dortmund, tendo feito mesmo os noventa minutos dos últimos quatro jogos da temporada alemã, período para o qual o jovem inglês contribuiu com três assistências e um golo.

Tudo isto já depois de um período em janeiro em que Sancho se assumiu na equipa principal do Borussia ao ponto de ser eleito pela Bundesliga como um dos rookies da competição no mês de janeiro. Uma boa forma que apenas foi interrompida por uma lesão entre fevereiro e abril que impossibilitou que Sancho tomasse ainda outra dimensão na equipa do Borussia mesmo em temporada de estreia pela Bundesliga.

Sancho não foi o único inglês em destaque na temporada passada a jogar fora de Inglaterra. Mason Mount, por exemplo, emprestado pelo Chelsea ao Vitesse arrasou por completo a Liga Holandesa ao ponto de ser eleito o jogador do ano no clube holandês e ter sido eleito o jogador do mês de janeiro da competição. Uma temporada em que Mason Mount ajudou o Vitesse a vencer o play-off de qualificação para a Liga Europa com uns impressionantes 13 golos e 10 assistências num total de 40 jogos pelo clube holandês.

Mais do que nunca, sair de Inglaterra parece ser a decisão certa para os talentos ingleses que não encontram espaço nas principais equipas do seu país. Descer às divisões secundárias inglesas parece ser cada vez menos uma opção nesta cada vez maior necessidade de busca pelo desconhecido e por um lugar numa equipa primodivisionária seja de que país for. Se durante anos os jovens ingleses eram apelidados de comodistas e incapacidade de adaptação ao futebol europeu, a nova vaga de jogadores ingleses parece querer alterar a imagem deixada por gerações anteriores que só já como jogadores feitos deixaram o país para se aventurar no futebol europeu continental como foram os casos de, por exemplo, Kevin Keegan, David Platt, Gary Lineker ou David Beckham, entre outros, mas sempre de forma muito pontual e esporádica. Casos como o de Ian Rush, por exemplo, nem sequer correram bem com os britânicos a ficarem conhecidos pela sua incapacidade de adaptação a ambientes diferentes dos que estavam habituados.

“Temos recebido cada vez mais a indicação de que os jovens ingleses estão cada vez mais interessados em mudar-se para a Holanda. Estão cada vez mais convencidos de que as hipóteses de chegar à primeira equipa dos principais clubes é maior aqui do que em Inglaterra”, afirmou ao The Guardian o chefe do departamento de Scouting do PSV que, esta temporada, apresentou o jovem de 16 anos Noni Madueke, ex Tottenham, que rejeitou um contrato profissional com o Manchester United para se juntar ao campeão holandês.

O facto da grande maioria destes jogadores virem de ambientes de multiculturalidade, nascidos no seio de famílias de imigrantes em Inglaterra pode ajudar a compreender este novo fenómeno, tal como a globalização massificada da sociedade em geral, mas há algo que são factos e não teorias: na Holanda, em França e na Alemanha, países para os quais a generalidade dos jovens britânicos “tem fugido” a aposta no jogador jovem é mais evidente do que em Inglaterra. São, aliás, destes países os três clubes que mais jogadores sub-21 têm utilizado nos últimos anos em comparação com os restantes clubes das cinco principais ligas europeias: o Borussia Dortmund, o Schalke 04 e o AS Mónaco.

Na temporada 2017/18, aliás, em comparação, a Premier League foi a grande liga europeia que menos oportunidades concedeu a jovens Sub-21. Em toda a temporada apenas 13 jogadores nascidos a partir de 1997 tiveram oportunidades na primeira liga inglesa. Na Alemanha foram 22 os Sub-21 utilizados, em França foram 34 e na Holanda foram 37. Ou seja, não surpreende, por isso, que os melhores jovens ingleses ou jovens sediados em Inglaterra procurem outros destinos para se conseguirem afirmar no futebol europeu e o atual êxodo até possa ser o início de algo ainda mais efetivo.