Grande Futebol
O dérbi de Belgrado que faz parar um país e está manchado pela violência
2018-09-21 19:30:00
O Partizan recebe o Estrela Vermelha no domingo, para o campeonato, num dérbi de Belgrado que divide a Sérvia.

A Sérvia prepara-se para parar completamente devido a um jogo de futebol. É que no domingo vai haver um dérbi de Belgrado protagonizado entre Partizan e Estrela Vermelha, uma das maiores rivalidades do futebol europeu, que muitas vezes termina com violência e manchetes nos jornais pelos piores motivos. Este confronto futebolístico assume, inclusive, contornos de divisão no país dos balcãs, pois para além dos estádios de ambos os clubes ficarem a pouco mais de dez minutos um do outro, a maioria da população sérvia ou é fã de uma equipa, ou da outra. “Não é nada estranho que o primeiro presente a um bebé seja algo com o emblema do Estrela Vermelha ou do Partizan”, palavras de Darko Nikolic (jornalista sérvio), ilustram bem a mentalidade que absorve o duelo.

A violência tem sido um dos focos principais daquilo que sucede na Sérvia aquando de embates entre Partizan e Estrela Vermelha, com a situação mais chocante a ter acontecido em 1999, quando um jovem adepto do Estrela Vermelha foi morto por um ‘very light’ atirado por aficionados do rival. Outro dos momentos mais marcantes desta história de rivalidade eterna teve lugar em 2013, ano em que foram feitas 104 detenções pelas autoridades na sequência de confrontos entre adeptos antes, durante e depois do jogo. Nesse mesmo ano, adeptos do Partizan pegaram fogo a cadeiras do estádio do Estrela Vermelha no decorrer da partida. No ano de 2015, o dérbi começou com 45 minutos de atraso, devido a problemas nas bancadas, com adeptos a atirarem cadeiras e petardos às autoridades. Mal o encontro iniciou, os adeptos atiraram granadas de atordoamento para as imediações do relvado.

“No que diz respeito à rivalidade de Belgrado, a Sérvia tem duas mentalidades. És adepto do Estrela Vermelha, ou do Partizan. Talvez 50 por cento dos nossos cidadãos apoiem o Estrela Vermelha, com cerca de 45 por cento pelo Partizan. Adeptos de outros clubes e pessoas que não apoiam nenhum chegam a cerca de cinco por cento”, referiu Slavisa Jokanovic em declarações à ‘BBC Sport’. O treinador sérvio do Fulham já jogou e também treinou o Partizan e conhece como poucos o ambiente que o dérbi de Belgrado gera. “Não é apenas na cidade, mas em todo o país que se fala deste jogo. É o dérbi entre as duas equipas com mais fama na Sérvia e as duas equipas mais reconhecidas da Jugoslávia no passado. É um dia especial para os adeptos de ambos os clubes. As pessoas começam a falar deste encontro com vários dias de antecedência.”

Agora, novamente a questão da violência. O dérbi de Belgrado corre muitas vezes o mundo das notícias pelos piores motivos e essa é uma situação que Jokanovic gostava de ver terminar. “É difícil. Por vezes, este tipo de jogo acaba por correr mal. Pode ser interessante para as pessoas que estão fora do país, mas nós cansamo-nos um pouco da situação. Ainda é um dos maiores dérbis ao redor do mundo. O que queremos é mais qualidade e melhor futebol, e um pouco mais calma nas bancadas, sem violência”, pediu o técnico. No entanto, há quem dê conta de que os tumultos são bem menos do que há uns anos atrás.

“Já não há violência com a magnitude que havia nos anos 90, ou no início do século XXI - maioritariamente porque a polícia está mais preparada do que nunca, e temos novas e duras leis contra aqueles que cometerem violência em eventos desportivos”, revelou o jornalista sérvio Darko Nikolic à ‘BBC’. No entanto, não está colocada totalmente de parte a possibilidade de existirem atos de violência como já ocorreram tantas outras vezes… mas não apenas por culpa dos sérvios. “Mas, ainda existe um elevado risco de acontecerem confrontos, pois vêm pessoas de vários sítios, não apenas da Sérvia, mas dos balcãs e da Europa - os adeptos do Estrela Vermelha têm uma ligação muito forte com ‘irmãos’ do Spartak Moscovo e do Olympiacos.” Ainda assim, nem só nos dias de jogo existe violência. “A rivalidade entre os adeptos mais ultras é tão grande que não é necessário ser dia de dérbi para eles entrarem em confrontos. Muitos dos adeptos mais casuais, que normalmente vão ao estádio para os jogos, recusam ir ver um Estrela Vermelha-Partizan por causa de temerem a violência”, contou Nikolic.

É necessário recuar até 1945 para a data em que ambos os clubes nasceram, após a Segunda Guerra Mundial. O Partizan foi fundado pelo exército, enquanto o Estrela Vermelha surgiu da ideia de alguns membros das forças policiais. Quando a Jugoslávia ‘caiu’, as pessoas identificaram-se com o clube representante da sua república. Todos estes anos depois, agora em 2018, não são muitos os contornos políticos do dérbi de Belgrado, algo que pode surpreender tendo em conta aquilo que acontece em vários outros países dos balcãs. Domingo, 23 de setembro, é dia de mais um embate entre os dois rivais, com o Partizan a receber o Estrela Vermelha, mas nem tem havido assim tanta conversa em torno do encontro. Tudo porque o Estrela Vermelha está de regresso à fase de grupos da Liga dos Campeões, 26 anos depois, e jogou a meio da semana para a competição europeia. Mas, nas palavras de Jokanovic, “é um dérbi escaldante” e é isso mesmo que todos esperam.