A discussão está cada vez mais presente em Inglaterra e até em Portugal já esteve na ordem do dia.
Em Inglaterra nada mais foi igual desde o dia 15 de abril de 1989. À história já nada há a acrescentar. Num dos dias mais negros da história do futebol, 96 adeptos do Liverpool faleceram nas bancadas de Hillsborough, estádio do Sheffield Wednesday, durante a meia final da Taça de Inglaterra desse ano perante o Nottingham Forest. Desde então, tudo mudou nos estádios ingleses, tendo passado a ser proibida a existência de estádios nas duas primeiras divisões com zonas de peão, o típico “terracing” britânico por via do muito propalado Taylor Report. Mesmo que perante a conclusão dos inquéritos policiais se tenha definido que a tragédia em nada tenha estado relacionada com a existência de zonas de peão.
A discussão relativa ao regresso do “safe standing” em Inglaterra está mais forte do que nunca e até em Portugal a questão chegou a estar na ordem do dia, algo que em caso de alterações no caso inglês pode acabar por se expandir até Portugal. Na Alemanha, por exemplo, praticamente todos os estádios têm já zonas de peão, evoluídas para os tempos atuais sob a forma de “safe standing”. Zonas do estádio que possibilitam aos adeptos ver o jogo em pé de forma não só mais confortável, como mais segura, já que evita que existam cadeiras pela zona dos tornozelos na fila da frente, algo que mais facilmente faz um adepto tropeçar e cair várias filas em caso de maior agitação.
A construção de zonas de “safe standing” permitem aos adeptos estar protegidos por corrimões que evitam que os mesmos caiam para as filas inferiores e são, por isso, consideradas mais seguras para os adeptos que pretendem ver os jogos em pé como é o caso de várias zonas dos estádios em Portugal, em particular, nas zonas afetas aos grupos de adeptos organizados ou claques legais. Defensor deste tipo de estrutura é Pedro Madeira Rodrigues que durante a candidatura à presidência do Sporting anunciou planos para incluir no Estádio de Alvalade uma zona de “safe standing” que permitira aumentar a lotação do recinto leonino, bem como melhorar o ambiente em estádio, duas das três razões – a outra é a segurança – que os defensores do “safe standing” apontam para a implementação da medida nos estádios de futebol.
Se Pedro Madeira Rodrigues confirmou oficialmente a intenção de implementar em Alvalade zonas de “safe standing”, nos últimos meses surgiram na imprensa também vários rumores acerca do interesse do Benfica em transformar o piso 0 do topo sul do Estádio da Luz em zona de “safe standing”, área habitualmente ocupada pelos grupos organizados de adeptos do Benfica que já vêem o encontro, maioritariamente, em pé, podendo por isso, segundo os estudos mais recentes, fazê-lo em maior segurança. Oficialmente não existe ainda qualquer posição do clube da Luz neste sentido apesar dos mesmos rumores terem chegado a anunciar que a intenção do Benfica era tê-lo feito já para esta temporada.
Presente em grande parte dos estádios alemães – razão principal pela qual a bancada do Westfalenstadion conhecida como “yellow wall” é tão imponente -, bem como no Celtic Park, por exemplo, são já vários os estádios europeus que adotaram a criação de zonas de “safe standing” e que servem de exemplo para a luta de vários grupos de adeptos ingleses que procuram sensibilizar governo, federação e Premier League para a alteração do regulamento que impede a criação destas áreas nos estádios ingleses. Regulamentação criada após o desastre de Hillsborough, mas que não se estendeu aos estádios escoceses, daí a possibilidade do Celtic ter destinado uma zona ao “safe standing” no Celtic Park.
A luta pela implementação destas zonas em Inglaterra ganhou um novo fôlego nos últimos meses, especialmente, depois do apoio dado à causa por parte das organizações de luta pela justiça das vítimas de Hillsborough. Nos últimos dias, o próprio presidente da EFL, organização que até à criação da Premier League organizava todos os escalões do futebol profissional em Inglaterra, anunciou estar do lado dos grupos de adeptos que pretendem implementar zonas de peão seguras nos estádios. Ou seja, a EFL até poderá aceitar estas zonas antes da Premier League, tendo os clubes de ter depois em consideração que, em caso de subida de divisão, irão ter de as “arrasar” de novo e voltando a torna-las zonas sentadas.
Algo que, com o “safe standing”, em teoria, nem sequer é um problema já que a própria estrutura incorpora uma cadeira retrátil que pode ser fixada, por fechadura, em posição nos jogos que obriguem a que toda a lotação do estádio seja sentada, como acontece nas competições europeias. Há, por isso, um desajuste regulamentar entre aquilo que acontece na Premier League e o que são as obrigações da UEFA. Estas zonas permitem, por isso, não só ver os jogos em pé de forma mais segura, como grande parte dos estudos refere que ajuda a melhorar o próprio ambiente dos estádios. Como são zonas, teoricamente, “low cost”, adeptos mais vocais acabam por preencher estas zonas, além de permitirem albergar mais adeptos por metro quadrado que as zonas totalmente sentadas. Ou seja, até financeiramente os clubes têm a ganhar com a implementação de zonas de peão seguras.
Quem continua sem estar convencido com a mudança é mesmo a principal organização do futebol em Inglaterra, já depois da Ministra do Desporto de Inglaterra ter rejeitado uma proposta do West Bromwich Albion para testar a implementação de “safe standing” no estádio do clube. Para a Premier League, são precisos mais estudos e provas que justifiquem a alteração do regulamento. “Os resultados dos estudos indicam que apesar das pessoas concordarem com a ideia de uma zona de peão por princípio, só 5% dos adeptos está disposto a passar um jogo inteiro em pé. Adicionalmente, a grande maioria dos adeptos prefere ter a opção de poder estar em pé e sentado em igual medida. Tendo isto em conta, concordamos com a Ministra do Desporto acerca da necessidade de mais estudos que justifiquem a alteração da atual política e regulamento”, publicou a Premier League em comentário.
Certo, é que ambas as decisões, governamentais e organizacionais, foram recebidas de forma muito negativa por parte dos adeptos ingleses e até responsáveis por segurança em recintos desportivos. Uma petição online recolheu mesmo 56 mil assinaturas para que a discussão de “safe standing” seja levada ao parlamento inglês. “Penso que a ministra tomou uma decisão de visão curta e está a impedir o clube de criar um ambiente de maior segurança para os seus adeptos. A política de estádios totalmente sentados foi implementada há 25 anos, mas o futebol é um lugar muito diferente atualmente”, revelou o West Bromwich Albion também em comunicado. “O sistema que propusemos foi mais do que testado em vários estádios ao longo da Europa e foi tem sido também utilizado de forma muito bem-sucedida em Glasgow”.
O futebol mudou muito nos últimos anos. Depois da política de estádios totalmente sentados implementada a partir dos anos 90, muitos são os clubes que adotaram já zonas de peão modernas que permitem aos adeptos ver jogos de futebol, em pé, mas de forma mais segura do que aquilo que acontecia anos atrás. Em Inglaterra a discussão está já muito presente. Estará o futuro do futebol num regresso ao passado?