Grande Futebol
Drenthe: os pés para pisar uvas, o rap e o murro de Saviola
2018-07-22 18:00:00
Está desvendado o mistério! Há uma explicação para o falhanço de Drenthe.

É um dos grandes mistérios do século XXI do futebol internacional. Royston Drenthe apareceu como craque – um craque a sério –, mas fez uma carreira quase toda em sentido descendente. Pelo meio, muitas histórias. Muitas mesmo. Mais brincadeira do que juízo, mais desvios do que profissionalismo, mais forrobodó do que futebol. Aquele holandês de raízes surinamesas (antiga colónia dos Países Baixos) - é, quase sempre, um nome forte para qualquer lista de flops.

Edinho, internacional português e ex-colega de Drenthe, falou com o Bancada e contou-nos uma história que ilustra bem o que foi a carreira deste holandês, com direito a uvas. A ler mais à frente. Esta e a história do murro de Saviola.

Para já, vamos à explicação de Drenthe. O jogador, que assinou pelo Sparta de Roterdão, da II divisão holandesa, justificou o falhanço em quase todas as aventuras com… iliteracia financeira e de gestão de carreira. “Agora, sou eu quem trata dos acordos, mas, antes, não era assim. Assinava tudo o que me punham à frente e sempre fui enganado. Era jovem e não sabia nada de negócios”, explicou, à “Cadena Ser”.

Enganado ou não, o facto é que carreira de Drenthe pecou por mais do que maus acordos negociais. Que nos perdoe o talentoso holandês, mas o profissionalismo, ainda que possa estar conectado, pode e deve ser separado das questões financeiras. Por isso, vamos a factos.

Drenthe deu nas vistas no Europeu sub-21 de 2007. O João Vasco Nunes destacou-o, nesta lista de onze casos de insucesso pós Euro sub-21. Na verdade, é rara a lista de flops na qual não entra Drenthe. Mas o facto é que, naquele Europeu, o homem - ou devemos dizer "menino"? - era uma máquina. Era um jogador baixo, mas forte fisicamente. Dava muita profundidade e criatividade ao corredor esquerdo, quer a lateral quer a ala.

Foi campeão europeu e, com 20 aninhos, foi contratado pelo Real Madrid, por 14 milhões de euros. Merecido, dizemos nós, que vimos aquele talento aparecer. Ainda fez duas temporadas com bastantes jogos, mas, a partir da terceira, foi sempre a descer. Não mais mostrou magia. Aliás, mostrou outras coisas. Talento para a festa, por exemplo.

“Duas jovens pediram-me mil euros”

Drenthe, como bom flop que se tornou, foi sempre mais falado pelas noitadas do que pela bola. O próprio jogador chegou a contar alguns desses episódios. "Sair à noite? Sim. Não todas, como se dizia, mas muitas. Muitas vezes em segredo. Era jovem, jogador do Real Madrid. São muitas as tentações e, se não estás totalmente concentrado...", contou, detalhando um episódio.

"Fui com um amigo ao casino e, de repente, apareceram duas raparigas muito bonitas. Fomos para um hotel os quatro. A terminar, veio o problema. Pediram-nos mil euros a cada um. Nem tinha ideia de que era preciso pagar. Pensava que era apenas diversão. Não levava dinheiro, só cartões. E não ia pagar, tinha vergonha. Acabámos por dar todas as fichas que ganhámos no casino".

Apesar disto, Drenthe garante que não foi por estes episódios que saiu do Real Madrid. "Nunca cheguei tarde a um treino e trabalhava muito. Não saí do Real por causa disto. Tive bons momentos, mas o futebol é complicado, ainda mais no Real Madrid. Mas só tenho palavras boas para o clube. Sempre se portaram bem comigo", disse.

Agora, o holandês, com 31 anos, diz-se diferente. “Sou pai. Não posso fazer os disparates que fazia antes. Preciso que os meus filhos se sintam orgulhosos de mim”.

Um murro de Saviola

Outra faceta de Drenthe era o mau feitio. Uma vez, contou o próprio, levou Saviola, ex-jogador do Benfica, a… dar-lhe um murro.

“Estávamos num treino e pedi-lhe quatro vezes seguidas que passasse a bola. ‘Saviola, Saviola, Saviola, Saviola’. Típico num treino. Então, ele parou e deu-me um murro. No final da sessão, perguntei-lhe o que se passava. Disse-me que tinha sido muito duro a pedir a bola. O murro nem me doeu, o que me doeu é que ele só se atreveu a fazer isso comigo, aos outros não dizia nada. Comigo valia tudo”, contou, à “Marca”.

O certo é que Drenthe, apoiado ou não pelos colegas, acabou por sair do Real. Andou por Hércules, Everton, Alania, Reading, Sheffield Wednesday, Kayserispor e Baniyas, dos Emirados Árabes Unidos. Em nenhum deles houve Drenthe. Aquele Drenthe de 2007 e, a espaços, aquele Drenthe do início no Real. Foram mais clubes do que golos e assistências.

Em 2016, o holandês decidiu que era tempo de parar. Terminou a carreira e dedicou-se… à música. Tornou-se rapper – pode chamar-lhe “Roya2Faces” – e chegou a lançar uma música.

Que nos perdoe Drenthe, mas ele é bem melhor com os pés. Talvez por isso decidiu voltar. Assinou pelo Sparta de Roterdão, explicando: “É uma equipa que tem de estar na primeira divisão. Recuperei a paixão. Jogo no meu país, perto da minha família e dos meus filhos. Além disso, o treinador é o mesmo que tinha nos juvenis do Feyenoord”.

Agora, Drenthe diz que está forte. “Estou forte. Forte como um touro espanhol”.

“Sim senhor, grandes pezinhos que tu tens... para pisar uvas”

A terminar, a história prometida. Edinho falou connosco, há algumas semanas, e, pelo meio, recordou uma história com Drenthe. Vale a pena aproveitá-la agora, que vem mesmo a calhar.  

Imagine um craque a fazer truques num jogo e o treinador a querer objetividade e jogo coletivo. Imagine, agora, que esse treinador decide confrontar o tal craque brincalhão. Vai dar forrobodó, claro.

“Estava na Turquia e o meu clube contratou o Royston Drenthe, que tinha jogado no Real Madrid. Ele era um “brinca na areia”, só queria brincadeira nos jogos. Houve um em que ele estava a fazer coisas do arco da velha, a rebentar com aquilo, completamente. Só que não estava a ser objetivo. Ao intervalo, o mister diz:

-‘Epá, oh Drenthe, sim senhor: és um grande jogador. Tens um pés fantásticos.
-“Obrigado, mister, obrigado’.
-‘Tens um uns grandes pés para pisar uvas. Faz o simples, que o resto já tu sabes’. Começámos todos a rir e o Drenthe vira-se e diz:
-‘Oh mister, você já jogou onde? Quantas vezes deu um chuto na bola? Está a dizer-me que tenho belos pés para pisar uvas? E você? Para caminhar não tem de certeza, que mal andar sabe’.

Houve ali um bate-boca complicado, porque o Drenthe era um bom gajo, mas não aceitava muito bem quando criticavam”.