Grande Futebol
"Acabaram-se os tempos das negociações com 'armas na mesa'"
2021-04-22 18:50:00
Emanuel Medeiros aponta 'susto' da Superliga como "oportunidade única para redefinir o futebol europeu"

O projeto da Superliga europeia parece ter morrido à nascença, mas as consequências serão profundas e duradoras, de acordo com a previsão de Emanuel Macedo de Medeiros, fundador e antigo CEO da Ligas Europeias. O dirigente sustentou que os grandes clubes sempre tentaram reclamar para si a maior parte das receitas, mas nunca tão “descaradamente” como agora, quando o futebol e toda a sociedade enfrentam uma crise sem precedentes devido à pandemia de covid-19.

“A UEFA e o seu presidente têm estado a operar na crise mais dramática de sempre no futebol mundial. Os clubes nunca chegaram tão longe antes, agora fazem-no descaradamente e num momento de crise global e recessão financeira. Os clubes e os seus proprietários mostraram a sua verdadeira natureza”, afirma o dirigente português.

Numa entrevista ao Inside World Football, o atual presidente da Sport Integrity Global Alliance (SIGA) saudou o colapso do projeto da Superliga europeia, mas alertou que o mesmo abriu uma “oportunidade única para redefinir o futebol europeu”, agora sem a ‘chantagem’ dos clubes mais poderosos da Europa.

Um recado que chega de quem assistiu de perto às ‘facadas’ dos grandes clubes nas costas da UEFA, desde o tempo do G14. Por isso, de acordo com o dirigente português, não basta aos cluebs que desistiram da Superliga virem com pedidos de desculpa e explicações, enquanto esperam que o ‘susto’ provocado tenha sido o suficiente para levar a novas mudanças na Liga dos Campeões.

“Quando vejo motivos para justificar o injustificável, não posso aceitar. Os dias em que as negociações eram travadas com ‘armas na mesa’ e com a UEFA encostada à parede e todos se esfaqueando pelas costas enquanto a UEFA era forçada a fazer concessões a cada quatro anos, esses dias acabaram”, sustenta.

A Superliga tornou visível as reclamações dos grandes clubes, mas a grande reforma do futebol europeu terá de ser bem mais profunda. A única vantagem do projeto, insiste Emanuel Medeiros, é permitir recuperar a oportunidade de “abordar reformas atrasadas em todo um jogo que pertence a todos os adeptos, a todos os grupos, a todas as partes interessadas”.

O custo será elevado: UEFA, clubes (de todas as dimensões) e tudo em torno do futebol terão de abraçar conceitos como escrutínio independente e supervisão, os mesmos conceitos que entram nos ‘discursos oficiais’, mas que muito raramente chegam a ser colocados na prática.

Nesta entrevista ao Inside World Football, Emanuel Medeiros enalteceu ainda a forma como o presidente da UEFA, Aleksander Ceferin, saiu em defesa de todo o futebol europeu contra a ganância dos clubes mais poderosos, assumindo um discurso “agressivo” em defesa dos valores de solidariedade e meritocracia do desporto.