Grande Futebol
A crença é fator predominante na qualificação de Cabo Verde para o Mundial
2017-10-06 17:35:00
Lúcio Antunes, Rui Águas e Sandro Mendes falaram com o Bancada sobre o sonho dos Tubarões Azuis.

Cabo Verde está na luta para ganhar uma viagem para a Rússia no verão de 2018 e nem o facto de Senegal, o adversário que se segue, ser uma potência do futebol africano abala a crença e fé de um país na sua seleção. “O caminho faz-se caminhando”, começou por dizer Lúcio Antunes, selecionador nacional de Cabo Verde, ao Bancada. “A nossa equipa tem vindo a fazer um percurso bastante razoável. Crescemos muito em termos de jogo. Temos progredindo, tranquilos. Esperamos dar mais um passo importante no próximo sábado”, continuou.

Empatada com Burquina Faso no primeiro lugar do grupo D da qualificação africana para o Mundial do próximo ano após quatro desafios, com seis pontos, a seleção de Cabo Verde está a dois jogos de conseguir um inédito apuramento para a maior prova de seleções do planeta. Os restantes lugares do grupo são ocupados por Senegal (cinco pontos) e África do Sul (um ponto). Na primeira volta, Cabo Verde foi a Dakar perder com o Senegal por 2-0, mas Lúcio Antunes acredita que a história que o encontro deste sábado, no Estádio Nacional (18h30 portuguesas), terá um desfecho diferente.

“De lá para cá a equipa evoluiu muito, assim como a de Senegal. A maioria dos jogadores que jogaram no jogo anterior também estão cá e temos alguns novos, assim como uma nova forma de abordar o jogo e sistemas de jogo evoluídos. A equipa está mais confiante, os jogadores têm outro andamento porque jogam sempre nos respetivos clubes, por isso quero crer que a nossa equipa está mais forte”, previu.

Lúcio Antunes (à esquerda) mostrou-se feliz com o desenvolvimento da equipa e crente num bom resultado contra Senegal (Eneias Rodrigues/EPA)

E o que vale a equipa de Senegal? Antunes considera que vale muito, principalmente pelo conjunto de jogadores que representam equipas de topo nas melhores ligas da Europa. O selecionador cabo-verdiano destacou ainda aquele que considera ser o senegalês mais perigoso para a defesa da sua equipa.

“O Senegal vale pelo conjunto. A maioria dos jogadores atua em França, Inglaterra, Alemanha… E jogam em clubes de topo a nível mundial como o Liverpool FC, SSC Napoli, AS Mónaco e são jogadores de craveira internacional. Neste momento, Senegal tem um dos melhores jogadores africanos, o Sadio Mané. É o perigo maior da equipa, que é possante, alta e alterna o jogo em posse com as transições. Vamos ter um jogo complicadíssimo mas os jogadores estão preparados e mentalmente fortes. No nosso estádio, é possível que consigamos a vitória”, garantiu Lúcio Antunes, pai de Tiago Antunes, avançado do Minas Argozelo, clube que milita no Campeonato de Portugal.

Rui Águas, antigo jogador de Benfica e FC Porto, foi selecionador de Cabo Verde entre 2014 e 2015. Ao Bancada, o técnico fez uma antevisão do que será a restante fase de qualificação, que terminará para os Tubarões Azuis com uma visita ao Burquina Faso, cuja seleção é orientada por Paulo Duarte (6 de novembro).

“Evidentemente que não será simples. Já se sabia, à partida, que os adversários seriam complicados, é um grupo bastante competitivo. Possibilidades há, claro. As coisas ainda estão muito abertas. O mau começo foi emendado, digamos assim, e agora são dois jogos em que pelo menos três equipas ainda lutam pela qualificação. Não sei se até as quatro não estarão a olhar para a tabela. É talvez o único grupo em que os quatro competidores ainda podem ser qualificados”, começou por dizer Rui Águas, que hoje está no comando dos egípcios do Pharco FC.

Rui Águas liderou as tropas de Cabo Verde entre 2014 e 2015 (José Sena Goulão/Lusa)

Cabo Verde chegou a esta fase de grupos, a última e decisiva para se decidirem os apurados para o Mundial, depois de eliminar o Quénia com o resultado agregado de 2-1 após duas mãos. Ainda com Rui Águas no comando da equipa, Cabo Verde perdeu o jogo fora de casa por 1-0 mas venceu por 2-0 em casa com dois golos de Héldon.

“Foi um passo que nós pretendíamos [dar] e que acabou por ser vitorioso. Começou no Quénia com uma derrota, num campo muito complicado ao qual não nos habituámos e não jogámos bem. Reagimos imediatamente [na segunda mão]. Fomos melhores e contámos com o apoio público em casa. Passámos com muita justiça e muita felicidade”, contou Rui Águas.

Quem não poupou os elogios à equipa foi Sandro Mendes, antigo internacional por Cabo Verde que jogou na Primeira Liga, em Portugal. “Cabo Verde tem uma excelente equipa, com jogadores experientes de muita qualidade. Às vezes falo com o Marco Soares e o grupo, pelas informações que tenho, é forte e está na iminência de conseguir algo que nunca foi atingido por nenhuma outra geração de Cabo Verde. Eles têm essa hipótese. Acho que se vão agarrar a isso e dar tudo o que têm, que é muito”, frisou, em declarações ao Bancada.

Contudo, as esperanças de Cabo Verde em chegar à Rússia podem sofrer um abalo devido à repetição do África do Sul-Senegal que tinha terminado com uma vitória para os sul-africanos. Tudo porque o árbitro, o ganês Joseph Lamptey, foi banido pela FIFA depois de ter sido acusado de "influenciar ilegalmente os resultados do jogo". Uma eventual vitória de Senegal no jogo que se vai realizar no próximo dia 12 pode ser preocupante para Cabo Verde, mas Sandro Mendes 

“As coisas aconteceram de uma maneira e agora podem acontecer de outra. Se Cabo Verde não conseguir os pontos pode ser ultrapassado, o que nunca será bom. É esperar e ver qual será o resultado final entre essas duas equipas. De qualquer forma, e seja qual for o resultado, Cabo Verde continua bem colocado para atingir o objetivo”, augurou Mendes, que dirige os juniores do Vitória de Setúbal, clube onde jogou durante grande parte da carreira.

O orgulho de um povo numa equipa que tem na união do grupo a maior arma

Apesar de existirem jogadores com maior preponderância nos resultados da seleção de Cabo Verde (como Héldon ou Garry Rodrigues), quem conhece a equipa garante que o maior valor é todo o conjunto. Sandro Mendes reconheceu que os goleadores são sempre os mais falados mas nem por isso os mais importantes dentro de um grupo diferente das gerações anteriores, das quais o antigo médio fez parte.

“Não gosto de invidualizar. A seleção vale pelo seu todo. Lógico que depois há jogadores que sobressaem e normalmente são aqueles que fazem os golos mas antes do golo acontecer há um processo coletivo e o forte desta seleção -  e não é que as outras não o tivessem – é a união e o grupo pelo seu todo. Depois, como é normal, vai sobressaindo uma ou outra individualidade e damos muito relevo a quem faz os golos mas há que dar mérito à restante equipa”, explicou o sadino.

Chegar ao Mundial 2018 é um sonho do povo cabo-verdiano (José Sena Goulão/Lusa)

Essa união não cabe dentro das quatro linhas dos relvados onde jogam os Tubarões Azuis. “O adepto é o nosso 12º jogador. Sempre nos apoio em momentos menos bons, quando a equipa não estava a atravessar uma boa fase. E agora eles também precisam de nós. Conjuntamente, vamos fazer uma onda muito forte”, assegurou Lúcio Antunes, que não negou o "sonho" de estar na Rússia daqui a menos de um ano.

“Qualquer jogador ou seleção que chega ao Mundial, chega ao topo do futebol. É um sonho para todos. Todos os que lá chegam, estão entre os melhores e nós queremos lá estar. Somos tão bons como os melhores mas temos de o mostrar em campo para estarmos na fase final. Por enquanto, focamo-nos no Senegal e depois logo veremos o que a sorte nos reserva”, disse.

Caso não entenda o significado que um eventual apuramento para o Campeonato do Mundo teria para a população de Cabo Verde, não se preocupe. De forma sentida, Lúcio Antunes explicou ao Bancada.

“Era muito importante para o nosso povo. É um povo que vive o desporto, que vive o futebol. Um povo que tem poucos recursos mas com coração grande, ambição grande, seriedade máxima e humildade total. Um povo que quer crescer a nível do futebol, porque já tem boa qualidade de saúde, ensino, paz social, terras maravilhosas, praias lindíssimas. Temos um povo espetacular que já deu provas também em outras modalidades, representando outros países, como Portugal, por exemplo. Nuno Delgado, no judo, Nelson Évora, no atletismo. Na seleção que ganhou o Europeu estavam cinco cabo-verdianos. É um país pequeno que tem produzido vários campeões. O que falta é estar representado numa grande montra a nível mundial com a camisola de Cabo Verde”, concluiu Lúcio Antunes, o líder da equipa que tem pela frente dois dos mais importantes jogos das vidas do panorama desportivo do seu país.