Fora da Bancada
Poiares Maduro aponta “ironia de PS e CDS” na votação sobre Rui Pinto
2021-05-28 22:25:00
"É uma presunção de inocência a la carte", escreve o jurista e ex-dirigente da FIFA

O jurista Miguel Poiares Maduro, ex-dirigente da FIFA e antigo ministro (PSD), reagiu com ironia à votação da comissão parlamentar de inquérito (CPI) às perdas do Novo Banco, da qual resultou o chumbo da proposta do PAN para que fosse ouvido Rui Pinto, autor de uma denúncia sobre alegados desvios no BES Angola.

Em comentários nas redes sociais, Poiares Maduro não escondeu o desagrado com os argumentos invocados pelos deputados de PS e CDS, que votaram contra a audição do criador do Luanda Leaks. Oito votos contra que ditaram um empate nas duas rondas regimentares da votação (oito votos a favor de PAN, PCP, Bloco de Esquerda e PSD e uma abstenção da Iniciativa Liberal), impossibilitando que Rui Pinto prestasse explicações no Parlamento.

O jurista e professor universitário realçou que, para justificarem a decisão de que Rui Pinto não devia ir à CPI, os deputados do PS e CDS ‘atropelaram’ o “estado de direito” que alegavam defender, uma vez que não respeitaram o princípio da presunção da inonência e deram o informático por “uma ilegalidade” ainda não provada em tribunal.

Ao tomar a decisão de se abster, o deputado da Iniciativa Liberal acabou por validar essa “ironia” cometida por socialistas e centristas, acrescentou o antigo advogado-geral no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. “PS e CDS (e, na prática, a IL) invocam o estado de direito para excluir a audição de Rui Pinto, partindo do pressuposto de que este cometeu uma ilegalidade pela qual ainda não foi condenado... É uma presunção de inocência a la carte!”, escreveu Miguel Poiares Maduro.

O especialista em Direito Constitucional e em Direito da União Europeia realçou, em particular, a intervenção de Cecília Meireles, referindo que a deputada centrista deu como ‘provado’ que Rui Pinto obteve informações de forma ilícita ao mesmo tempo que afirmava não responsabilizar o informático por isso.

“A Cecília Meireles fez-me saber que presume a ilicitude da prova, mas não a culpa do RP (e que não pretende interferir no processo). É uma diferença relevante. Aqui fica essa informação, ainda que continuemos a discordar quanto ao fundo (a ilicitude do uso dessa prova)”, acrescentou Poiares Maduro.

"Não ignoro que o uso de provas obtidas ilegalmente é muito controverso. Mas, quando estas revelam questões de interesse público, são inúmeros os ordenamentos jurídicos que permitem o seu uso em certos casos", realçou: "O próprio Tribunal Europeu dos Direitos Humanos assim decidiu".

Para o ex-ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, o “critério adotado” pela CPI, que inviabilizou a chamada de Rui Pinto ao Parlamento (como tinha requerido o PAN), “tornaria impossível alguns dos inquéritos parlamentares mais famosos” do mundo, dando o exemplo do “recente ‘impeachment’ de Trump”, o ex-Presidente dos EUA.

“Portugal, sempre na linha da frente do Estado de Direito...”, ironizou Miguel Poiares Maduro, na conclusão desta reflexão.

Rui Pinto já tinha reagido à votação da CPI, responsabilizando diretamente o PS por ter “vetado” a sua chamada ao Parlamento, devido à “simbiose” do partido com “os principais escritórios de advogados” do país.

“A simbiose entre política e os principais escritórios de advogados é uma das marcas deste regime socialista. O sentido de voto dos deputados do PS e as suas justificações eram mais do que expectáveis para alguém como eu, que está convicto de que não será o PS a encetar reais esforços no sentido de travar a corrupção sistémica existente em Portugal”, escreveu Rui Pinto, nas redes sociais.

Rui Pinto, de 32 anos, encontra-se a responder em tribunal no âmbito do processo Football Leaks, estando acusado de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada.